Sociedade
Como experimento com bonecas negras contribuiu para fim de segregação nas escolas dos EUA
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Entre os argumentos que influenciaram a histórica decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos no caso Brown versus Board of Education, que declarou a inconstitucionalidade da segregação racial nas escolas públicas e completou 70 anos em maio, um experimento psicológico chama a atenção.
No início dos anos 1940, mais de uma década antes da decisão dos juízes, o casal de psicólogos americanos Kenneth e Mamie Clark elaborou um teste para analisar as atitudes de crianças negras em relação à raça e como desenvolviam seu senso de identidade e autoestima.
O experimento envolvia bonecas de plástico idênticas a não ser pela cor, e mostrava que a maioria das crianças negras rejeitava as bonecas pretas.
Reproduzido ao longo dos anos em diversas partes do país, o estudo ficou conhecido como “o teste das bonecas”, e seus resultados chamaram a atenção para os danos psicológicos, emocionais e intelectuais causados pela segregação em crianças negras.
Quando a equipe legal que lutava para derrubar as leis de segregação nas escolas americanas defendeu seus argumentos diante dos juízes da Suprema Corte, o teste das bonecas e as pesquisas dos Clark tiveram papel importante, assim como seu testemunho.
Seus estudos também serviriam de base para pesquisas futuras sobre como crianças constroem e compreendem sua identidade racial e como absorve preconceitos.
Quem eram os pesquisadores
Kenneth Bancroft Clark (1914-2005) e Mamie Phipps Clark (1917-1983) construíram carreiras destacadas na psicologia e quebraram várias barreiras raciais.
Ele foi o primeiro estudante negro a receber um doutorado em psicologia pela prestigiosa Universidade Columbia, em Nova York, em 1940.
Três anos depois, Mamie Clark se tornou a segunda pessoa negra a receber o mesmo título pela universidade.
Kenneth Clark também foi o primeiro professor negro a ocupar uma cátedra permanente no City College de Nova York e o primeiro presidente negro da Associação Americana de Psicologia, entre outros títulos importantes.
Ambos se conheceram quando frequentavam a Universidade Howard, em Washington, na década de 1930.
Foi nessa época que Mamie Clark iniciou suas pesquisas acadêmicas explorando o processo de construção de identidade em crianças negras.
Seus estudos buscavam determinar em que momento essas crianças começavam a ter consciência sobre sua identidade racial.
Essa linha de pesquisa foi aprofundada durante o Doutorado em Nova York e serviu de base para o casal desenvolver o experimento das bonecas.
Em 1946, o casal fundou o Centro Northside para o Desenvolvimento Infantil, que oferecia terapia e serviços educacionais e sociais para crianças no bairro nova-iorquino do Harlem.
Ao longo de suas carreiras, os Clark ganharam respeito como autoridades no tema da integração em diferentes setores da sociedade americana e como figuras influentes no movimento de luta por direitos civis.
“Ambos fizeram contribuições significativas para o campo da psicologia e para o movimento social de sua época”, diz a Associação Americana de Psicologia.
Como era o teste
O experimento com as bonecas foi projetado e conduzido inicialmente na década de 1940, para testar a percepção racial de crianças negras e medir os efeitos psicológicos da segregação em sua autoestima.
Os testes foram repetidos nos anos seguintes com alunos de escolas segregadas em diferentes partes do país, com resultados semelhantes.
Durante os testes, quatro bonecas de plástico eram mostradas a crianças negras de três a sete anos.
As bonecas estavam vestidas com fraldas, e a única diferença entre elas era sua cor: duas eram brancas com cabelo loiro, e duas eram pintadas de marrom e tinham cabelo preto.
As crianças tinham de identificar a raça das bonecas, dizer a de que cor preferiam e qual se parecia mais com elas.
“O teste das bonecas era uma tentativa minha e de minha esposa de tentar entender como crianças negras viam a si mesmas, se elas se viam como iguais aos outros”, disse Kenneth Clark em uma entrevista à emissora americana PBS em 1985.
“Tínhamos cerca de três ou quatro perguntas relacionadas ao conhecimento (sobre a diferença na cor das bonecas) e outras relacionadas à preferência”, lembrou o psicólogo.
-Me dê a boneca com a qual você quer brincar
-Me dê a boneca que é uma boneca agradável
-Me dê a boneca que é feia
-Me dê a boneca que tem uma cor bonita
-Me dê a boneca que se parece com uma criança de cor
-Me dê a boneca que se parece com uma criança negra
-Me dê a boneca que se parece com você
Quase todas as crianças conseguiam identificar a raça das bonecas.
A maioria queria brincar com a boneca branca e também atribuía a ela características positivas, como ser “agradável” e ter “cor bonita”. Ao mesmo tempo, a maioria atribuía à boneca preta características negativas. Para Kenneth Clark, a parte mais “perturbadora” era a pergunta final.
“Muitas crianças ficavam emocionalmente perturbadas por terem que se identificar com a boneca que haviam rejeitado. Algumas saíam da sala ou se recusavam a responder àquela pergunta”, observou o psicólogo em 1985.
“Interpretamos isso como indicação de que a cor, em uma sociedade racista, era um componente muito perturbador e traumático do senso de autoestima e valor de um indivíduo.”
Em artigo científico publicado nos anos 1950 apresentando os resultados, os Clark concluíram que “preconceito, discriminação e segregação” prejudicavam a autoestima das crianças negras, gerando um sentimento de inferioridade e desprezo por si mesmas.
Décadas depois, na entrevista à PBS, o psicólogo reforçou que os resultados dos estudos indicavam “o impacto desumanizante e cruel do racismo na nossa sociedade supostamente democrática”.
As origens do caso Brown versus Board of Education
Na mesma entrevista, Kenneth Clark salientou que os testes das bonecas foram iniciados 14 anos antes da decisão da Suprema Corte, e que, na época, ele e Mamie não tinham ideia de que seus resultados teriam um papel tão importante.
Mas as pesquisas do casal com crianças negras e seu testemunho como especialistas acabariam se tornando uma peça crucial na decisão da Suprema Corte.
Durante décadas, muitos Estados, principalmente no Sul do país, seguiam rígidas leis de segregação racial, várias delas adotadas depois da Guerra Civil (1861-1865) e da abolição da escravidão.
A legitimidade dessas leis havia sido confirmada pela Suprema Corte, a mais alta instância da Justiça do país, em 1896, no caso Plessy versus Ferguson.
Aquela decisão estabeleceu a doutrina legal “separate but equal“, segundo a qual a segregação racial era constitucional, desde que fossem oferecidos serviços “separados, mas iguais” a pessoas brancas e negras.
No entanto, assim como em outros setores, também na educação era comum que as escolas para estudantes negros não tivessem a mesma qualidade que as instituições reservadas a alunos brancos.
Levaria mais de meio século até que a decisão em Plessy versus Ferguson e aquela doutrina legal fossem rejeitadas.
Isso só aconteceu em 1954, na decisão do caso Brown versus Board of Education, quando a Suprema Corte decidiu por unanimidade que a segregação racial em escolas públicas era inconstitucional.
A nova decisão ocorreu após anos de esforços de ativistas e acadêmicos, envolvendo o Legal Defense Fund (Fundo de Defesa Jurídica, ou LDF, na sigla em inglês), organização de direitos civis que tem sua origem na National Association for the Advancement of Colored People (Associação Nacional para o Progresso de Pessoas de Cor, ou NAACP, na sigla em inglês).
O impacto das pesquisas dos Clark
Quando chegou à Suprema Corte, o caso Brown versus Board of Education combinava cinco ações judiciais contra distritos escolares no Kansas, Carolina do Sul, Delaware, Virgínia e no Distrito de Columbia.
O argumento para a anulação da doutrina “separate but equal” era o de que a segregação racial violava a garantia de igualdade de proteção perante à lei, presente na 14ª Emenda à Constituição.
Esse argumento foi reforçado com exemplos de estudos de historiadores, cientistas sociais e outros especialistas, alguns deles chamados como testemunhas para ressaltar os impactos negativos da segregação nas crianças e famílias negras.
Os Clark, que já haviam testemunhado em outros casos envolvendo segregação, estavam entre esses especialistas, apresentando não apenas os resultados do teste das bonecas, mas também analisando outros estudos sobre o tema.
Em artigo de 1950, os Clark afirmavam que “está claro que a criança negra, aos cinco anos, (já) está ciente do fato de que ser negra na sociedade americana contemporânea é um sinal de status inferior”.
Segundo eles, o sentimento de inferioridade vivido por crianças negras em escolas segregadas as impedia de receber uma educação igual.
Essa conclusão fortalecia o argumento que questionava a constitucionalidade de escolas “separadas, mas iguais”.
Ao anunciar a decisão unânime, o então presidente da Suprema Corte, juiz Earl Warren, citou um artigo dos Clark e suas conclusões.
“Separar (crianças negras) de outras de idade e qualificações semelhantes somente por causa de sua raça gera um sentimento de inferioridade quanto ao seu status na comunidade, que pode afetar seus corações e mentes de maneira que provavelmente jamais será desfeita”, disse Warren.
A integração nas escolas não foi imediata após a decisão de 1954, e ainda foram necessários vários anos e novos processos judiciais para conquistar esse objetivo.
“Ainda hoje, o trabalho de Brown (versus Board of Education) está longe de terminar. Mais de 200 casos envolvendo dessegregação em escolas permanecem abertos em processos judiciais federais”, diz o LDF em seus arquivos relacionados ao caso.
“A vitória legal em Brown não transformou o país da noite para o dia, e ainda há muito trabalho a fazer. Mas (a decisão de) acabar com a segregação nas escolas públicas do país forneceu um grande catalisador para o movimento pelos direitos civis, possibilitando avanços na desagregação de moradias, acomodações públicas e instituições de ensino superior.”
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Brasil
Governo Federal afasta cerca de 4.500 crianças do trabalho infantil em dois anos
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4 dias agoon
8 de dezembro de 2024By
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Sessão na Câmara reforça gravidade do problema, ressalta longevidade políticas e enfatiza a importância da fiscalização para afastar crianças e adolescentes de atividades insalubres
“Somente nos últimos dois anos, conseguimos afastar aproximadamente 4.500 crianças do trabalho infantil”. A frase é de Luiz Felipe Brandão, secretário de Inspeção do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), durante sessão especial na Câmara dos Deputados que comemorou os 30 anos de combate ao trabalho infantil no Brasil. O evento em homenagem à luta contra a exploração laboral das crianças e celebração pelo direito à infância ocorreu nesta quinta-feira, 5 de dezembro, no Plenário 9 da Câmara.
O MTE, cofundador do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI), destacou a importância da iniciativa. O FNPETI coordena a Rede Nacional de Combate ao Trabalho Infantil, que reúne 27 fóruns estaduais e 48 entidades de trabalhadores, empregadores e sociedade civil.
Brandão destacou o papel crucial do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI) na implementação de políticas para eliminar o trabalho infantil e ressaltou os resultados significativos da fiscalização trabalhista, que retirou cerca de 140 mil crianças e adolescentes do trabalho nos últimos 20 anos.
ALERTA — Apesar dos avanços, o secretário alertou sobre a gravidade do problema, mencionando que ainda há cerca de 1,6 milhão de crianças trabalhando no Brasil, muitas delas em condições extremamente precárias. A sessão foi presidida pela deputada federal Erika Kokay e contou com a presença de Katerina Volcov, secretária-executiva do Fórum; Maria Cláudia Falcão, da Organização Internacional do Trabalho (OIT); Antônio Lacerda, da Contag; e Eliana dos Santos, subprocuradora-geral do Trabalho.
PARADOXO — Katerina Volcov destacou o paradoxo de celebrar a longevidade de uma instituição cujo objetivo maior é a própria extinção, simbolizando um Brasil onde nenhuma criança ou adolescente precise trabalhar. Apesar de uma legislação robusta, como o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Constituição Federal, ela apontou que a proteção integral ainda é limitada pela baixa priorização da infância nos orçamentos públicos.
O auditor-fiscal do Trabalho Roberto Padilha, coordenador da Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil, explicou que a Secretaria de Inspeção do Trabalho tem uma Coordenação Nacional de Fiscalização do Trabalho Infantil, que articula 27 coordenações regionais e o Grupo Móvel de Combate ao Trabalho Infantil.
FISCALIZAÇÃO — Segundo Padilha, as fiscalizações garantem o afastamento imediato de crianças e adolescentes do trabalho infantil, além de assegurar a quitação de direitos trabalhistas e aplicar penalidades administrativas aos responsáveis. Após as ações, as vítimas são encaminhadas à rede de proteção para inclusão em políticas públicas de assistência social, educação e formação profissional.
“Outra ação importante é a inclusão de adolescentes com idade a partir de 14 anos, egressos do trabalho infantil, na aprendizagem profissional, assegurando oportunidades de qualificação em ambientes de trabalho seguros e protegidos, além de direitos trabalhistas, previdenciários e acesso ao ensino regular”, pontuou.
HOMENAGEM — Durante a sessão, o Fórum homenageou pessoas e instituições que se destacaram no combate ao trabalho infantil nos últimos 30 anos. Entre os homenageados, a Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) e três auditoras-fiscais do Trabalho foram agraciadas com placas de reconhecimento pelo impacto de suas contribuições: Marinalva Dantas, Denise Brambilla Gonzalez e Virna Damasceno.
INSTRUMENTO ESTRATÉGICO — A Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil, coordenada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), é um instrumento estratégico para implementar a política nacional de prevenção e erradicação do trabalho infantil no Brasil. Com a publicação do Decreto nº 11.496, de 19 de abril de 2023, a Comissão retomou a composição original, incluindo representantes do Governo Federal, trabalhadores, empregadores, o Sistema de Justiça e a sociedade civil, esta última representada pelo CONANDA e pelo FNPETI.
Na atual gestão, o FNPETI recuperou seu assento e direito a voto nas deliberações da CONAETI, revertendo uma mudança realizada no governo anterior. Atualmente, a Comissão está desenvolvendo iniciativas importantes, como:
Elaboração do IV Plano Nacional para Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente Trabalhador; e
Definição de fluxos nacionais de atendimento a crianças e adolescentes vítimas de trabalho infantil.
Esses esforços reforçam o compromisso do Governo Federal, por meio do Ministério do Trabalho e Emprego, e de seus parceiros em avançar na luta contra o trabalho infantil, garantindo a proteção integral das crianças e adolescentes brasileiros.
*Fonte: Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República
Religiosidade
A Bíblia manda a mulher ser submissa ao homem?
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5 dias agoon
7 de dezembro de 2024By
Fato novo
Teólogos e especialistas contemporâneos dizem que, para ler os textos sagrados, é preciso compreender o contexto em que tais materiais foram escritos — ao contrário, segundo eles, o fundamentalismo carrega as contaminações de um anacronismo
“Mulheres, sede submissas aos vossos maridos, como ao Senhor. Pois o marido é a cabeça da mulher, assim como Cristo é a cabeça da Igreja.”
“Esposas, sede submissas a vossos maridos, como convém ao Senhor.”
“[…] ensinem as jovens a amar seus maridos e filhos, a serem modestas, castas, dedicadas aos afazeres domésticos, boas, submissas a seus maridos, a fim de não ser blasfemada a palavra de Deus”.
Estas três frases, que podem soar absurdas aos ouvidos da sociedade atual, são de trechos de cartas escritas por Paulo Apóstolo às primeiras comunidades cristãs e fazem parte da Bíblia.
Teólogos e especialistas contemporâneos, contudo, explicam que são estes claros exemplos de que, para ler os textos sagrados, é preciso compreender o contexto em que tais materiais foram escritos — do contrário, o fundamentalismo carrega as contaminações de um anacronismo.
Submissão, segundo um dicionário de língua portuguesa, é a “condição em que se é obrigado a obedecer”, “sujeição”, “subordinação”. Também pode ser entendida como “disposição para obedecer, para aceitar uma situação de subordinação”.
“A ideia de que a mulher deve ser submissa ao homem deve ser entendida em seu contexto social e também literal do texto bíblico”, diz à BBC News Brasil a teóloga e pedagoga Andreia Cristina de Morais, freira da Congregação das Pequenas Missionárias de Maria Imaculada e professora na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG).
“A maioria das sociedades no mundo antigo era patriarcal. Seus registros geralmente refletem uma perspectiva masculina, ou seja, enfatizam os interesses e as preocupações dos homens que os escreveram”, acrescenta ela.
“O mundo bíblico não era diferente. Assim, os textos da Bíblia geralmente revelam uma forma masculina e patriarcal de enxergar as situações.”
Contexto histórico
Morais aponta que as interpretações contemporâneas buscam “compreender as representações das mulheres como uma imagem bíblica que simplesmente reflete as suposições e expectativas culturais de uma antiga sociedade patriarcal”.
Por isso, ela defende que essa ideia de mulher submissa ao homem seja sempre interpretada dentro do contexto original.
A ideia de que as mulheres precisam ser submissas aos maridos, embora citada três vezes nas epístolas de Paulo e uma na de Pedro, não aparece nenhuma vez nos evangelhos — os quatro textos que narram a vida e os ensinamentos de Jesus.
Com isso em mente, a religiosa sugere um olhar mais atento para as motivações de quem escreveu o texto.
Ela recorda que Paulo não necessariamente estava criando uma norma de submissão, mas sim que poderia estar refletindo o que já era praxe para criar uma analogia com a relação entre Jesus Cristo e a Igreja que começava a se formar.
Esta interpretação pode ser tomada, por exemplo, do trecho aos Efésios, que continua com o apóstolo dizendo que, se Jesus é “a cabeça” e a Igreja “é o corpo”, os maridos devem amar suas mulheres assim como Cristo amou a Igreja.
“Observando esse contexto mais amplo, Paulo não deseja explicar como a mulher deve se comportar em relação ao marido, mas usa essa analogia para explicar a relação entre Cristo e a Igreja, uma relação de submissão, obediência e amor.”
A teóloga Morais argumenta ainda que, buscando a referência do texto original em grego, é possível entender que Paulo pretendia “destacar que a submissão é de uns aos outros no temor do Senhor” e que, para passar essa mensagem, ele “exemplifica com a mulher em relação ao marido”. Ou seja: essa relação de submissão aparece como uma verdade dada, algo já próprio daquele contexto.
“A ideia básica é sempre uma analogia com o marido, com a casa, com o ambiente doméstico. O ideal de submissão vem desse modelo familiar”, contextualiza à BBC News Brasil o teólogo e historiador Gerson Leite de Moraes, professor na Universidade Presbiteriana Mackenzie.
“O apóstolo Paulo faz uma analogia entre o papel da mulher dentro de casa, sendo submissa à vontade do marido, e o papel da Igreja, sendo submissa à vontade de Jesus”.
Ele ressalta que é preciso compreender aquele contexto histórico. “A Bíblia nasce num ambiente machista. Ou seja, ela reflete um tipo de comportamento que era comum em toda a antiguidade, não só entre os judeus, mas entre outros povos da antiguidade”, diz. “Na construção de sociedades patriarcais, as mulheres acabam tendo papéis definidos no espaço do oikos, que em grego significa casa.”
Em paralelo, diz o professor, o homem fica com o “espaço da ágora”, ou seja, da praça, do público.
“De maneira geral, o mundo antigo era um mundo patriarcal. As mulheres ficavam relegadas ao ambiente doméstico e, portanto, quando grupos religiosos falam sobre o papel da mulher, eles acabam refletindo essa realidade”, diz.
Ele vê um Paulo muito enfático sobre a divisão de papéis entre homem e mulher na carta a Timóteo. Ali, o apóstolo faz um paralelo: enquanto homens são incitados a orarem “em toda parte, erguendo para o céu mãos santas”, as mulheres precisam se resignar a “guardar silêncio, com toda submissão”.
“Não permito à mulher que ensine, nem que domine o homem”, prossegue o texto bíblico. “Mantenha-se, portanto, em silêncio.”
Autor do livro Igrejas que Calam Mulheres, o pastor batista e teólogo Yago Martins tem uma visão mais conservadora sobre esses trechos bíblicos. “Não há como fugir, o Novo Testamento fala em submissão”, diz, em conversa com a BBC News Brasil.
“Algumas pessoas querem evitar o termo porque acham que é muito pesado. Mas é um termo bíblico. A escritura estabelece que o papel da mulher no casamento é de submissão”, afirma.
“Mas a escritura diz que a submissão da mulher é a seu próprio marido e não a todo e qualquer homem. O que se diz é a submissão da esposa ao seu próprio marido.”
Ele adverte, contudo, que essa submissão não deve ser entendida “como apagamento, como se fosse para impedir as mulheres de terem vozes, dignidade”.
“Todo mundo é submisso a patrão, a autoridade pública. Dentro do contexto de famílias cristãs, a gente entende que há uma ordem complementar em que dois iguais possuem papéis diferentes”, diz Martins.
“[A Bíblia] fala de homens tendo um papel de pastoreiro sobre o seu lar e mulheres que seguem esse pastoreiro. Estabelece que é essa a ordem.”
Gênesis
Professora aposentada na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), a teóloga Tereza Maria Pompeia Cavalcanti afirma à BBC News Brasil que a origem dessa visão de sociedade presente nas cartas de Paulo remete ao Antigo Testamento, mais especificamente na narrativa da criação do mundo presente no livro do Gênesis.
Pela história, Deus teria feito o homem e, depois, retirado uma de suas costelas para, com este material, fazer a mulher. “Em outro texto [na primeira carta enviada aos Coríntios], Paulo chega a dizer que ‘o homem não foi tirado da mulher, mas a mulher foi tirada do homem. E o homem não foi criado para a mulher, mas a mulher foi criada para o homem’”, conta a teóloga.
Na justificativa de Paulo, isto é porque “Adão é que foi formado primeiro. Depois Eva”. E enquanto o primeiro “não foi seduzido”, a mulher foi e “caiu na transgressão”, conforme explica o teólogo Moraes.
“Nesta passagem, Paulo revela de onde ele tirou essa ideia de submissão da mulher. Para ele, a culpa de toda essa visão de uma sociedade machista e patriarcal foi de Eva. Eva errou. Eva foi enganada. Eva caiu em transgressão e, consequentemente, levou seu marido ao erro e trouxe o pecado para toda a humanidade”, analisa ele.
“Por isso, caberia à mulher não exercer a autoridade dentro de casa e o seu papel, a sua missão, seria a maternidade”, complementa.
Para Moraes, o problema é “quando esse tipo de passagem acaba sendo lida sem a devida contextualização”. “Isso gera a perpetuação dessa visão machista na sociedade”, adverte o professor.
Autora de, entre outros livros, As Incômodas Filhas de Eva na Igreja da América Latina, a filósofa e teóloga feminista Ivone Gebara, freira agostiniana, lembra ainda que o machismo foi erguido a partir de camadas de interpretação dos textos bíblicos.
“Uma observação geral importante é que não necessariamente o que está escrito na Bíblia segue as interpretações misóginas que foram feitas ao longo dos tempos”, afirma.
“Isto nos permite uma abordagem diferente da Bíblia como um livro que foi considerado sagrado, mas, originalmente, todos os livros que o compõem não eram considerados sagrados, e sim crônicas, textos de sabedorias diversas.”
Do Antigo Testamento, ela também busca no Gênesis um dos “vários textos que dão essa interpretação de submissão”. Quando se dá a queda e expulsão do paraíso, o trecho narra que Deus disse o seguinte à Eva: “Teu desejo te impelirá para o teu homem, e este te dominará”.
“Usa-se este e muitos outros textos para afirmar a natural submissão da mulher”, acrescenta Gebara
Auxiliadora?
É ainda do livro do Gênesis que vem outra questão muito presente quando se recorre à Bíblia para a definição do que seriam os papéis de gênero.
Mais precisamente, o segundo capítulo do livro, no trecho em que há a narração de como teriam sido criados Adão e Eva. É quando a mulher é apresentada como uma “auxiliadora”.
Este é o termo que aparece na versão Almeida Revista e Atualizada (ARA), por exemplo: “Disse mais o Senhor Deus: Não é bom que o homem esteja só; far-lhe-ei uma auxiliadora que lhe seja idônea”.
Mas há uma questão de tradução, esclarecem os especialistas.
Na tradução Almeida Corrigida Fiel (ACF), o termo é “ajudadora idônea”. Na Tradução Ecumênica da Bíblia (TEB), o mesmo trecho diz “uma ajuda que lhe seja adequada”.
Muitos fundamentalistas se apegam a essa passagem para reduzir o papel da mulher, como se ela tivesse nascido para nunca protagonizar, para sempre ser uma auxiliar.
O pastor Martins diz que “essa tradução não tem sido tão reproduzida mais”. Ele cita uma atualização da Nova Versão Internacional (NVI). “Traduziu agora como ‘aliada semelhante’. ‘Auxiliadora’ virou ‘aliada’”, comenta.
Segundo Martins, o verbo hebraico utilizado originalmente, ozer, “não possui sentido de autoridade sobre”. “É um termo genérico que fala sobre aliado, que pode ser superior, inferior ou igual”, explica.
“Entendeu-se que auxiliadora, no contexto brasileiro, poderia ter um sentido de inferioridade. Então o termo foi alterado para aliada. Uma outra tradução possível seria aliada complementar”, diz.
“Depende da interpretação”, afirma à BBC News Brasil a teóloga, filósofa e biblista Zuleica Aparecida Silvano, freira da Congregação das Filhas de São Paulo, professora na Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia e membro da Associação Brasileira de Pesquisa Bíblica.
“Na criação, em Gênesis, Deus cria a mulher do lado do homem, a palavra hebraica é tsela, para indicar que são iguais. O texto não diz uma auxiliar, mas sim uma ajudante, no sentido de alguém que socorre”, explica ela. “Esse termo geralmente ocorre para expressar uma ação divina”.
Ela acrescenta que em outras passagens bíblicas, o mesmo termo é utilizado no significado de “salvar”. “Nesse caso, é para salvar Adão de permanecer em si mesmo”, interpreta.
Silvano vai além. A frase seguinte diz que Deus “colocou a mulher diante do homem”. Este “diante de”, em hebraico, é neged.
“Na literatura rabínica, neged é interpretado nos dois sentidos, ou seja, a mulher será uma ajuda para o homem, se ele a merecer. Ou será contra o homem, se ele não a merecer. Deste modo, a mulher é vista como aquela que estabelece um limite para o homem. Ou seja: ele não é o todo-poderoso. Existe um ser que também pode mandar”, argumenta a biblista.
Mulher na sociedade
Interpretações religiosas à parte, pensadoras feministas entendem que essa questão de fundo bíblico acabou consolidando, ao longo dos séculos, uma sociedade desigual — em que as mulheres ficaram relegadas a papéis inferiores, na maior parte das vezes. E, em alguns meios religiosos fundamentalistas, o princípio segue sendo perpetuado.
“Quando a visão religiosa é muito conservadora com relação aos papéis de gênero, inevitavelmente existe o impacto negativo para a equidade entre homens e mulheres nos âmbitos familiar, profissional e, consequentemente, político-social”, diz à BBC News Brasil a economista Regina Madalozzo, autora do livro Iguais e Diferentes – Uma Jornada Pela Economia Feminista.
“Ao fomentar a diferença de importância no poder decisório, dentro de uma ideia da necessidade de submissão das mulheres a seus maridos, por exemplo, acaba-se por implicar em uma menor possibilidade de autonomia das mulheres sem quebrar os preceitos religiosos que seguem”, acrescenta ela.
A economista argumenta ainda que o desincentivo a que mulheres estudem ou participem ativamente de questões políticas e profissionais, faz do “mecanismo que fundamenta a diferença entre homens e mulheres” também o que “sustenta e permite a discriminação entre os gêneros”.
Pesquisadora na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a historiadora Giovanna Trevelin avalia que a religião “a partir de uma perspectiva histórica” afeta, com suas ideias, “diretamente as relações sociais”.
“Quando olhamos para isso por uma perspectiva não só histórica, mas também feminista, encontramos aspectos que supõem uma hierarquia bem definida, principalmente a partir da ideia fundante de um deus que é homem e todo-poderoso, e de uma mulher pecadora”, comenta ela, à BBC News Brasil.
“É comum, na nossa história, encontrarmos uma perspectiva de sociedade que está fundada nestes princípios de diferenças hierárquicas atribuídas aos papéis sexuais. Temos, então, uma estrutura patriarcal determinante que é consequência dos ideais cristãos”, explica a historiadora.
“Neste tipo de sociedade, o homem é o centro: ele toma as decisões, conquista o espaço público e tem seus desejos atendidos pelas mulheres à sua volta.”
Por outro lado, compara Trevelin, “as mulheres ficam associadas a um papel subalterno”.
“E a gente precisa compreender que essa história nos acompanha estruturalmente, de diferentes maneiras, até os dias atuais”, analisa.
“Os valores sociais que nos são dados desde o nosso nascimento têm bases cristãs, então nós, mulheres, somos guiadas por uma ideia de restrição de existência que pretende nos excluir das interações ativas da sociedade, afinal os ideais religiosos determinam nossa passividade como um valor positivo, principalmente para perpetuar a existência dos homens enquanto agentes públicos, ativos na sociedade e donos da narrativa histórica.”
Trevelin considera importante que a leitura da Bíblia seja feita de forma crítica, porque isso “pode propor outros caminhos”, que não apenas o de aceitação.
“Relacionar a religião à histórica aspiração de poder e manutenção de privilégios aos homens é um primeiro passo nessa direção de análise crítica e questionamentos fundamentais”, diz ela.
*BBC
Sociedade
Por que mulheres suecas estão parando de trabalhar
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5 dias agoon
7 de dezembro de 2024By
Fato novo
A Suécia tem uma reputação forte de igualdade de gênero, mas algumas jovens do país estão deixando seus empregos
A Suécia tem uma reputação a nível global por defender a igualdade de gênero. Então, por que será que jovens suecas estão abraçando uma tendência nas redes sociais que celebra deixar de trabalhar?
Vilma Larsson, de 25 anos, já trabalhou em uma mercearia, em uma casa de repouso e em uma fábrica. Mas ela parou de trabalhar há um ano para se tornar uma “namorada que fica em casa” — e diz que nunca foi tão feliz.
“Minha vida é mais tranquila. Eu não estou sofrendo. Não estou muito estressada.”
O namorado dela trabalha remotamente na área de finanças e, enquanto ele passa o dia no laptop, ela está na academia, tomando café em algum lugar ou cozinhando. O casal cresceu em pequenas cidades no centro da Suécia, mas agora viaja muito — e está passando o inverno no Chipre.
“Todo mês ele me dá um ‘salário’ com o dinheiro que ganha. Mas se eu precisar de mais, peço a ele. Ou, se precisar de menos, não peço — apenas guardo o resto”, explica Larsson.
Ela compartilha seu estilo de vida no Instagram, YouTube e TikTok, onde acumulou 11 mil seguidores. Algumas de suas publicações tiveram quase 400 mil curtidas, embora ela diga que não está ganhando dinheiro com seu conteúdo.
Ela usa as hashtags hemmaflickvän e hemmafru (que significam “namorada que fica em casa” e “dona de casa”, em sueco) e se descreve como uma soft girl — identidade feminina que adota um estilo de vida mais meigo e delicado, em vez de se concentrar em uma carreira profissional.
O estilo soft girl tem sido uma microtendência nas redes sociais em diferentes partes do mundo desde o fim da década de 2010. Mas na Suécia — com cinco décadas de políticas destinadas a promover famílias com dupla renda —, a recente popularidade do conceito provocou surpresa e divisão.
O Ungdomsbarometern, o maior levantamento anual de jovens da Suécia, destacou pela primeira vez as suecas que adotaram a tendência soft girl há um ano, depois que esta se tornou uma escolha popular quando jovens de 15 a 24 anos foram convidadas a prever as tendências para 2024.
Outro estudo divulgado pelo Ungdomsbaromatern, em agosto deste ano, sugeriu que estava se tornando uma aspiração até mesmo entre as estudantes mais jovens, com 14% das meninas de sete a 14 anos se identificando como soft girls.
“Trata-se de se afastar deste ideal de ‘girl boss‘ que temos visto há muitos anos, em que há exigências muito, muito altas de sucesso em todos os aspectos da vida”, explica Johanna Göransson, pesquisadora do Ungdomsbarometern.
Não há dados oficiais sobre o número de soft girls que param totalmente de trabalhar e dependem financeiramente de seus parceiros, como Larsson — e Göransson diz que é provável que essa proporção seja pequena.
No entanto, o assunto se tornou um dos principais temas de discussão na Suécia, desde em artigos de opinião em jornais de grande circulação até em painéis de debate no Almedalen — um grande evento político anual — e na emissora pública de televisão sueca.
Gudrun Schyman — cofundadora e ex-líder do partido feminista sueco Feministiskt initiativ — afirma que participou de debates recentes sobre o assunto. Ela acredita que as mulheres dependerem da prosperidade de seus parceiros é “muito perigoso” — e “um passo atrás” para a igualdade de gênero.
Schyman argumenta que as jovens suecas foram influenciadas pelo governo de coalizão de direita do país, que colabora com o partido nacionalista Democratas da Suécia, assim como pelo “desenvolvimento mais amplo” do populismo na Europa e nos Estados Unidos.
Ela também acha que há uma falta de conhecimento sobre a vida na Suécia antes da adoção de políticas destinadas a promover a igualdade de gênero, como creches altamente subsidiadas e licença parental compartilhada.
“As jovens de hoje não carregam a história de como as mulheres tiveram que lutar pelos seus direitos — o direito de trabalhar, o direito de ter um salário e o direito à independência econômica.”
No outro extremo do espectro político, o partido Democratas da Suécia tem se mostrado otimista em relação à tendência das soft girls.
“Acho que as pessoas devem decidir sobre sua própria vida”, diz Denice Westerberg, porta-voz nacional da ala jovem do partido.
“E se você tem a possibilidade econômica de fazer isso [depender de um parceiro], bom para você.”
“Ainda vivemos em um país com todas as oportunidades para ter uma carreira. Ainda temos todos os direitos, mas temos o direito de escolher viver de forma mais tradicional.”
Além dos debates ideológicos, as discussões se concentram nos fatores sociais e culturais que poderiam estar influenciando as jovens suecas a deixar o trabalho ou, pelo menos, a almejar um estilo de vida mais soft.
A Suécia tem uma reputação de equilíbrio entre a vida profissional e pessoal — a maioria dos funcionários tem seis semanas de férias por ano, e menos de 1% trabalha mais de 50 horas por semana.
Ainda assim, a pesquisa do Ungdomsbaromatern sugere um aumento nos níveis de estresse entre os jovens, e Göransson acredita que a tendência das soft girls pode ser uma extensão das recentes tendências globais no mercado de trabalho, como a “demissão silenciosa“, que incentiva os funcionários a simplesmente fazer o mínimo que é esperado da sua função.
Enquanto isso, a faixa etária da Geração Z (coorte nascida entre 1997 e 2012) está criando e sendo influenciada por conteúdo de rede social que celebra o tempo de lazer, em vez de metas de carreira.
“O trabalho não aparece tanto se você olhar o conteúdo sobre estilo de vida nas redes sociais hoje em dia, é muito mais sobre exercícios e bem-estar”, explica Göransson.
“E se essa é a imagem que os jovens têm de como é uma vida normal, então, é claro, talvez você não esteja tão animado em passar oito horas por dia em um escritório.”
Mas talvez o principal ponto de discussão seja se a tendência é uma resposta às limitações das políticas pioneiras de igualdade de gênero da Suécia.
Lado a lado com a Eslovênia, a Suécia tem a maior proporção de mães que trabalham na Europa, mas as estatísticas do governo sugerem que as mulheres de casais heterossexuais ainda fazem uma parte maior do que os homens no que se refere ao trabalho doméstico e à criação dos filhos.
Elas também tiram 70% da licença parental financiada pelo Estado — e são mais propensas a tirar licença médica por estresse. Enquanto isso, embora a diferença de renda entre homens e mulheres permaneça menor do que a média da União Europeia de 12,7%, ela estagnou em cerca de 10% desde 2019.
Larsson — que deseja ter filhos no futuro — afirma que sua decisão de se tornar uma namorada que fica em casa se deve, em parte, ao fato de observar mulheres mais velhas lutando para conciliar a carreira e a vida doméstica.
“Acho que muitas mulheres se sentem esgotadas com o trabalho”, diz ela.
“Penso na minha mãe e na mãe dela, minha avó, e na minha irmã, em todo mundo. Elas estão sempre muito estressadas.”
Na Agência de Igualdade de Gênero da Suécia, financiada pelo Estado, Peter Wickström, chefe do departamento de análise e monitoramento de políticas, também acredita que a tendência das soft girls pode ser vista como uma “reação racional” às “exigências” percebidas pelas mulheres mais jovens.
Shoka Åhrman, economista de um dos maiores fundos de pensão da Suécia, o SPP, diz que não acredita que um número suficiente de namoradas ou esposas suecas deixem de trabalhar para que isso tenha um impacto na economia do país.
No entanto, ela está trabalhando para conscientizar as mulheres suecas de que a saída do mercado de trabalho (assim como trabalhar meio período) pode afetar suas finanças pessoais, desde poupança e aposentadoria até os níveis salariais, caso voltem a trabalhar.
Åhrman espera que os atuais debates sobre as soft girls sirvam como um alerta, tanto para os políticos quanto para as empresas, de que ainda há trabalho a ser feito para resolver as desigualdades estruturais existentes na Suécia.
“Acho que a origem disso, que são questões de saúde mental, burnout (esgotamento) e tudo mais, é o mais preocupante, porque isso afeta não apenas as poucas meninas mais jovens de hoje que querem ficar em casa como soft girls“, adverte.
*BBC
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