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Comportamento

Brasília é terreno fértil para crimes afetivos; veja como se prevenir

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Eles são bem-sucedidos, bons ouvintes e com um repertório de promessas mirabolantes para mulheres economicamente estáveis mas vulneráveis emocionalmente. Entre 2022 e 2023, foram 71 denúncias contra os “golpistas do amor” na capital

Bem-sucedidos, charmosos e sempre prontos a ouvir. O que as vítimas não sabem é que muitos desses homens são estelionatários ávidos em retirar delas tudo o que têm. A Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) tem a radiografia desses indivíduos, que costumam procurar seus alvos nas redes sociais: mulheres com situação financeira estável, mas vulneráveis afetivamente. Como é o caso de Nilbert Meira de Oliveira, 35 anos, que se apresentava como investidor da bolsa de valores e convencia mulheres a fazerem o mesmo, prometendo lucros elevados.

A PCDF quer descobrir outros casos semelhantes a esse, mas esbarra na vergonha e na rejeição de as mulheres denunciarem. Elas ficam constrangidas por se deixarem trapacear por amor ou convencidas de que ali estava o homem da sua vida. Entre 2022 e 2023, foram 71 ocorrências como a de Nilbert, mas os investigadores acreditam que sejam muito mais. Há, por exemplo, a história de um falso bombeiro que deu o golpe em 18 pessoas ao mesmo tempo.

“Com essa história fantasiosa, passam a pedir dinheiro para as vítimas, que, acreditando que estão se relacionando com uma pessoa bem-sucedida, acabam repassando esses valores”, afirma o delegado João Guilherme M. Carvalho, da Delegacia Especial de Repressão aos Crimes Cibernéticos (DRCC). O policial conta que o enredo dos estelionatários não muda e é preciso estar alerta às imagens postadas por esses homens — sempre perfeitas, cercadas de luxo e excessos. “Por exemplo, identificamos a não autenticidade das fotos e atrás desses criminosos há uma constatação de organizações criminosas que incentivam esse tipo de golpe”, acrescentou.

Correio entrou em contato com várias vítimas, mas apenas uma se dispôs a falar, sob a promessa de sigilo. Outras disseram ter medo de usar a internet; uma chegou a pedir o envio da imagem do crachá profissional. Ao final, muito educadas, elas se desculparam, afirmando que ficam constrangidas só de lembrar que foram ingênuas em acreditar em falsos amores.

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 Mil histórias

Com uma conversa sedutora e muito elegante, Nilbert chegou a lesar uma única mulher em mais de R$ 60 mil. Ele contava várias versões sobre si: investidor da bolsa, espião da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), médico e empresário — quase um 007 brasileiro. O golpista foi preso pela polícia, que descobriu, inclusive, que ele teria planejado a morte do pai para ficar com o seguro de vida, no valor de R$ 400 mil.

Em dezembro de 2023, o cantor sertanejo Wagner Santos de Oliveira, conhecido como Wagner Luno, 42, foi preso por crime de estelionato sentimental. As vítimas tinham entre 30 e 45 anos e boa parte era de mães solo com estabilidade financeira, vindas de outros estados do país e que tivessem chegado ao DF há poucos meses. Para aplicar o golpe, o criminoso criava vários perfis nas redes sociais e em aplicativos de paquera ou encontros. Em seguida, identificava os alvos e, após uma conversa, pedia o número de celular das vítimas. Ao todo, 26 mulheres sofreram o golpe.

Especialista em direito penal, a advogada Jéssica Marques alerta que as mulheres em Brasília são vítimas potenciais desse tipo de estelionatário por causa do elevado poder aquisitivo e da forma como buscam relacionamentos — utilizando a internet. “Como se sabe, é a capital dos concursos públicos, onde há uma concentração maior de mulheres que têm estabilidade financeira, que é o principal foco dos estelionatários”, aponta.

O advogado Tiago Oliveira, também especialista em direito penal, alerta sobre os riscos iminentes para as mulheres, em geral. “A alta renda, o elevado grau de escolaridade e a facilidade de acesso ao crédito de muitas mulheres na capital federal as tornam alvos atrativos para golpistas que exploram a confiança estabelecida em relacionamentos amorosos”, afirma.

“As mulheres devem ficar desconfiadas ao conhecerem homens muito educados, bem-vestidos, cavalheiros em demasia e que ostentam acima do normal. Eles costumam se mostrar como profissionais liberais, empresários ou investidores, ostentando um estilo de vida luxuoso nas redes sociais para atrair suas vítimas”, destacou.

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Vítima isolada

Especialista em saúde mental da mulher, a psicóloga Cleidiane de Souza diz que a tática usual dos estelionatários sentimentais é isolar a vítima da família e de pessoas próximas. “Eles buscam atingir o emocional. No primeiro momento, demonstram preocupação com os familiares da vítima, com os filhos, mas depois, querem isolar essa vítima porque, fazendo isso, as tornam mais dependentes emocionalmente. Com o tempo, começam a falar que essas pessoas (família) não a amam o suficiente”, detalha a especialista.

Segundo Cleidiane, o isolamento deixa as pessoas mais suscetíveis. “Esse é um fator significativo para esse tipo de situação, porque faz com que as pessoas tenham a necessidade de conexão e companhia, e acabam ignorando sinais de alerta”, conta. “Ela pode experimentar uma série de sentimentos negativos, como vergonha, culpa e raiva. A confiança tanto nela mesma quanto nas outras pessoas fica abalada, e ela passa também a duvidar das outras pessoas. A sensação é de traição e desamparo”, conclui.

A advogada Jéssica Marques alerta que, ao perceber que caiu em um golpe, a vítima deve buscar preservar seus bens. “Alterar senhas de cartões, e-mails, contas bancárias, cancelar procurações, cartões ou qualquer outro documento que tenha sido repassado, bem como alterar tudo o que foi compartilhado com o golpista”, alerta.

Jéssica recomenda que todos os documentos sejam reunidos como prova, fotos, mensagens, ligações telefônicas, recibos, procurações, transações bancárias. “Essas informações são importantes para demonstrar que a relação afetiva existiu e que houve abuso de confiança por parte do golpista. Em seguida, ela deverá registrar um boletim de ocorrência com solicitação expressa de representação contra o golpista e, se necessário, poderá solicitar medidas protetivas”, explica a advogada.

Vergonha e desabafo

Mãe de três filhos, aos 54 anos, uma mulher madura, divorciada e de classe média alta não consegue acreditar que foi vítima de um estelionatário sentimental. A aposentada pediu sigilo sobre a identidade dela, mas a história é o enredo conhecido da polícia: ela reencontrou um homem, dos tempos de juventude, que lhe fez promessas e contou histórias mirabolantes.

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Em 28 dias, o homem disse que tinha comprado um imóvel para cada filho da mulher, afirmou que iria pagar as contas dela e passou a se apresentar para todos como marido. Só que as histórias não fechavam. Desconfiada, a mulher resolveu investigar, foi à delegacia e soube que se tratava de um homem com vários processos por estelionato e furto.

“A gente conversou uns dois a três meses por mensagem. Ele me mandava fotos antigas dele, mas nunca me ligava por vídeo”, contou a mulher. “Ele disse ‘quero te ver’ e me pediu para buscá-lo no aeroporto”, acrescentou ela, lembrando que, dias depois, começaram as atitudes excessivas do homem. Os filhos dela desconfiaram da situação.

“Eu me senti muito culpada de ter acreditado em um cara que eu não via há 20 anos. Eu me senti de mãos atadas. Ele levou meu notebook, onde havia mais de 100 fotos de ipês, que eu tirava e colecionava, fotos com a minha falecida mãe e de viagens que não vou ter mais, além de um livro de crônicas que estava escrevendo e um de poesias que eu estava terminando”, relata.

A história agora virou processo judicial. Há uma ação movida pela mulher contra o homem, em que ela pede R$ 5 mil. Mas nem a polícia consegue localizar o golpista que encantou a aposentada e, por pouco, não causou danos ainda maiores. (MS)

Para curar as feridas

Psicólogas consultadas pelo Correio disseram ser possível superar as sequelas causadas pelas frustrações, decepções e, sobretudo, golpes amorosos. Mas é preciso procurar ajuda profissional; do contrário, vencer a dor fica bastante difícil. A psicóloga Cleidiane de Souza ressalta que esses impactos geram diminuição da autoestima e autoconfiança, ansiedade e, até mesmo, depressão e transtorno de estresse pós-traumático.

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Especialista em saúde mental feminina, a profissional diz que, normalmente, após uma experiência negativa como a que envolve estelionatários sentimentais, a vítima se torna excessivamente desconfiada e pouco aberta a novos relacionamentos. “É muito importante que essas vítimas recebam ajuda de profissionais, amigos e familiares para se reconstruir emocionalmente.”

A  psicóloga Mariana Del Monte, doutora em psicologia clínica pela Universidade de Brasília (UnB) e especialista em relacionamentos, diz que a tendência é de que mulheres que passam por esse tipo de experiência se tornarem radicais “indo de 8 a 80”.

“Elas passam de um lugar emocional de muita alegria, acreditando que encontraram o amor da vida, são tomadas por essa alegria inicialmente, mas depois é como se despencasse, e elas passam a desacreditar por completo no amor e entram em um mecanismos de defesa para se proteger de possíveis futuros golpes, além de ficarem muito machucadas e envergonhadas”, detalha.

O advogado Tiago Oliveira explica que estelionato sentimental, embora se aproveite de um contexto emocional, configura um crime patrimonial tipificado no artigo 171 do Código Penal. A pena prevista para esse crime varia de um a cinco anos de reclusão, além do pagamento de multa.

 Indicativos

Especialistas ouvidos pelo Correio fizeram a seguinte lista de recomendações para buscar maior preservação contra os estelionatários sentimentais:

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  • Atenção à foto de perfil para identificar se é autêntica ou não;

  • Em caso de contradição ou suspeita, desconfie;

  • Pedidos de dinheiro também devem ser um sinal de alerta;

  • Histórias mirabolantes e repletas de sinais de riqueza;

  • Aparência excessivamente bem-cuidada;

  • Ausência de informações completas sobre si e da família;

  • Endereço e telefone não localizados;

  • Relatos tristes e com muitos detalhes de tragédias familiares;

  • Promessas fantásticas para problemas concretos, como a dívida do condomínio ser quitada em segundos.

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Fato Novo com informações e imagens: Correio Braziliense

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Comportamento

Padrões alimentares pouco saudáveis geram US$ 8 trilhões em custos ocultos

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Relatório da FAO revela que 70% desses custos são causados por impactos de saúde associados a doenças crônicas, especialmente nos sistemas agroalimentares mais sofisticados; baixa ingestão de cereais, frutas e vegetais e alto consumo de carnes processadas e sódios estão entre maiores riscos

A Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, FAO, lançou na semana passada um relatório sobre os custos ocultos para sistemas agroalimentares em todo o mundo.

As perdas são de US$ 12 trilhões por ano. E 70% desses gastos são gerados por padrões pouco saudáveis de dieta.

Desigualdades sociais e degradação ambiental

A pesquisa da FAO ouviu pessoas de 156 países. No caso das dietas ruins, o maior problema é a associação com doenças crônicas, em níveis alarmantes, incluindo doenças coronárias, diabetes e derrames, o que excede os gastos relacionados às desigualdades sociais e à degradação ambiental.

O Estado da Alimentação e Agricultura 2024, Sofa na sigla em inglês, aproveita os dados da edição de 2023 com mais análises de pano de fundo e o custo real que expõe a escala completa de custo e benefício associada à produção de alimentos, distribuição e consumo incluindo os que não aparecem nos preços de mercado.

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Comunidade em Madagáscar quer proteger-se da degradação

UN News/Daniel Dickinson

Mudanças transformadoras

O relatório atualiza as estimativas de custo com uma divisão entre tipos de sistemas agroalimentares e propõe uma via para mudança transformadora nos sistemas agroalimentares como um todo.

O estudo também detalha como os custos ocultos globais são grandemente puxados pelos custos não declarados de saúde, seguidos por gastos ambientais em sistemas agroalimentares mais industrializados em países de renda média alta e de renda alta.

A FAO examinou os impactos para a saúde e identificou 13 fatores de risco em dietas que incluem insuficiência de frutas, cereais e vegetais. Dietas com excesso de sódio e de carnes processadas com diferenças notáveis entre vários sistemas agroalimentares.

Políticas sob medida, desafios e oportunidades

A pesquisa também introduz uma tipologia que caracteriza os sistemas em seis grupos: crises prolongadas, tradicional, expansão, diversificada, formal e industrial. Esse quadro permite um conhecimento mais específico dos desafios e oportunidades próprios de cada sistema e que permite políticas de desenvolvimento mais sob medida.

As dietas baixas em grãos são um dos maiores fatores de risco entre os sistemas agroalimentares em crises prolongadas como em conflitos associados à insegurança alimentar. Também em sistemas tradicionais que são típicos de baixa produtividade, tecnologia limitada e cadeias de valor mais curtas. E a principal preocupação é a baixa ingestão de frutas e vegetais.

Já a dieta rica em sódio está mais presente em sistemas tradicionais e formais assim como padrões alimentares que incluem alto consumo de carnes processadas que tendem a passar de sistemas tradicionais para industrializados.

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Consumo de alimentos processados é um fator de risco

© UNICEF/Zhanara Karimova

Emissões de CO2 e poluição da água

Além dos riscos de padrões de dieta pouco saudáveis, a FAO analisou o impacto ambiental de práticas agrícolas insustentáveis.

Custos associados a emissões de CO2 e poluição de águas entre outros fatores são mais altos em países com sistemas diversificados de agricultura chegando a US$ 720 bilhões.

Em países com conflitos prolongados, as perdas ambientais podem chegar a 20% do Produto Interno Bruto, PIB.

Brasil, Austrália e Índia

Os custos sociais incluindo pobreza e subnutrição são mais prevalentes em sistemas agroalimentares tradicionais e representam de 8% a 18% do PIB, respectivamente.
O relatório da FAO recomenda adaptar os contextos locais e focalizar nas prioridades das partes em jogo.

O documento analisa casos em países como Austrália, Brasil, Colômbia, Etiópia, Índia e Reino Unido.

Custo de dietas saudáveis tem aumentado no mundo

© Unsplash/Mariana Medvedeva

Dietas mais saudáveis, inovações e sustentabilidade

Dentre as recomendações estão: incentivos financeiros e regulatórios para práticas sustentáveis de produção, promoção de dietas mais saudáveis, redução de emissões de CO2 e nitrogênio, dar autonomia aos consumidores sobre impactos em suas escolhas alimentares.

Outras propostas são assegurar a transformação rural e inclusiva, fortalecimento  da governança e da sociedade civil, acelerar inovações e criar sistemas mais sustentáveis.

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Fonte: ONU

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Comportamento

Proibição de celular: escolas focam na formação e no apoio familiar

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Do exercício da autonomia ao desenvolvimento de habilidades para o uso consciente da tecnologia digital, instituições de ensino em SP compartilham como têm atuado diante do dilema do uso de celular

A proibição de celular na escola foi defendida por 83% dos brasileiros (de um total de 10 mil pessoas) que participaram de uma consulta pública realizada pela Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro. Já 6% foram contra e 11% parcialmente favoráveis.

Essa consulta destaca que há uma crescente preocupação com o impacto das telas no aprendizado e na saúde mental de crianças e adolescentes. Tanto que diferentes escolas têm adotado abordagens que vão além de regras rígidas, investindo na construção de uma cultura de uso consciente e na formação de estudantes mais autônomos e saudáveis.

Uso consciente

No Colégio Nossa Senhora das Graças (Gracinha), na cidade de SP, a restrição ao uso de celulares entre os estudantes do fundamental 2 foi acompanhada pelo lançamento do movimento Gracinha Offline, em agosto, promovido pela Organização das Famílias do Gracinha (OFAG).

“Queremos resgatar atividades que envolvam as crianças e afastem a atenção das telas”, explica Claudia Taddei, mãe e integrante da OFAG.

Segundo Claudia, a parceria entre escola e famílias tem sido essencial, com a realização de uma pesquisa comunitária e a organização de vivências práticas voltadas ao desenvolvimento da consciência sobre o uso equilibrado de dispositivos.

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Sandra Cirillo, orientadora educacional da escola, destaca que a dependência dos dispositivos aumentou significativamente após a pandemia, exigindo mudanças profundas. “Identificamos situações em que alunos apresentavam sofrimento emocional quando seus celulares eram retirados, o que evidenciou a gravidade do problema e a necessidade de intervenções estratégicas.”

A escola proibiu o uso dos aparelhos durante as aulas e uniu forças com as famílias para promover diálogos e encontros com especialistas, buscando fomentar um uso mais consciente da tecnologia. “Nosso objetivo é que as soluções sejam construídas em conjunto, respeitando a realidade de cada família”, enfatiza Sandra.

Desafios e medidas para enfrentá-los

No Colégio Magno, também localizado na cidade de São Paulo, a diretora Claudia Tricate relata os desafios em encontrar um equilíbrio entre tecnologia digital e ambiente escolar.

“Acreditávamos que permitir o uso consciente dos celulares para fins pedagógicos seria o caminho ideal, mas percebemos que os adolescentes ainda enfrentam dificuldades em se autorregular. O apoio das famílias foi fundamental para estabelecer um controle mais eficaz, sem recorrer a medidas drásticas, como o confisco”, conta a diretora Claudia Tricate.

A escola limitou o acesso ao Wi-Fi para redes sociais durante as aulas, preservando espaços para que os estudantes desenvolvam autonomia no gerenciamento do próprio tempo, preparando-os para a vida adulta.

Já a paulistana Escola Tarsila do Amaral adota uma abordagem focada nas interações offline, especialmente com as crianças mais novas. De acordo com Patrícia Bignardi, coordenadora pedagógica, a proposta da escola valoriza as experiências lúdicas e as conexões sociais sem o uso de dispositivos.

“Procuramos estimular brincadeiras e atividades sem tecnologia desde cedo, promovendo uma introdução gradual ao mundo digital.” Patrícia alerta para os riscos de iniciar o uso excessivo de telas na infância, quando vídeos são frequentemente utilizados para entreter as crianças em situações como refeições fora de casa ou viagens, substituindo interações mais ricas, como conversas ou brincadeiras.

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Ela também reconhece que, com adolescentes, o desafio de regular o uso dos dispositivos se intensifica conforme aumentam sua autonomia e acesso à tecnologia.

A Escola Vera Cruz, em SP, por sua vez, decidiu implementar uma medida experimental: dias inteiros sem celulares e smartwatches, tanto para alunos quanto para profissionais. Daniel Helene, coordenador pedagógico do fundamental 2, explica que a proposta foi desenvolvida em conjunto com os estudantes, envolvendo-os ativamente nas decisões.


“Com essa iniciativa, queremos que os alunos percebam os benefícios de um tempo desconectado e aprimorem habilidades sociais e emocionais que vão além do universo digital.” Daniel ressalta que a participação das famílias tem sido essencial para que essa experiência se consolide, abrindo espaço para discussões sobre como equilibrar o uso da tecnologia na rotina escolar e familiar.  


Essas experiências mostram que, como indicado no início desta matéria, a questão do celular vai muito além de proibições e regras rígidas. Como observa Sandra, do Gracinha, o desafio envolve também a saúde mental e o desenvolvimento socioemocional dos alunos: “a formação de vínculos sociais e a capacidade de lidar com frustrações e conflitos são essenciais para o crescimento. A escola precisa ir além do ensino de conteúdos, ajudando os alunos a desenvolverem habilidades para interagir com o mundo, o que inclui a adoção de um uso responsável da tecnologia.”


Fonte: Revista Educação

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Comportamento

Oito em cada 10 brasileiros de nove a 17 anos que usam internet têm celular próprio

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Número é da pesquisa TIC Kids Online Brasil 2024, que mapeia hábitos e riscos da presença de crianças e adolescentes no ambiente virtual; dados também mostram que, em geral, quanto maior a faixa etária, maior assiduidade no uso de redes sociais

O uso frequente de celular por crianças e adolescentes tem levantado uma série de debates — incluindo a discussão sobre a proibição da utilização dos dispositivos em sala de aula. Números da pesquisa TIC Kids Online Brasil 2024, que mapeia hábitos e riscos dessa população no ambiente virtual, demonstram que essa presença digital tem sido, de fato, ampla: hoje, 93% das crianças e jovens de nove a 17 anos são usuários de internet no país, e 81% deles possuem celular próprio.

A desigualdade entre classes socioeconômicas, porém, continua: enquanto nas classes AB quase a totalidade da população dessa faixa etária possui aparelho celular (97%), o número cai para 80% na classe C e 77% nas D e E. A pesquisa TIC Kids Online foi divulgada ontem, 23, no 9º Simpósio Crianças e Adolescentes na Internet, realizado em São Paulo. O levantamento é realizado desde 2012.

A edição deste ano também mostrou que, entre os usuários de internet de nove a 17 anos, 86% utilizam a rede para fazer trabalhos escolares e 76% usam redes sociais. Os números aumentam de acordo com a faixa etária: entre adolescentes de 15 a 17 anos, 90% declaram usar redes sociais; já no caso de crianças de nove e 10 anos, esse número cai para 47%.

Uso excessivo e desafios da mediação

A pesquisa indica uma tendência dos adultos responsáveis em dar mais autonomia na utilização do dispositivo de acordo com o avançar da idade. Ainda assim, a posse do aparelho celular alerta para um maior desafio de mediação. Foi o que afirmou a professora Inês Vitorino, que integra o Grupo de Pesquisa da Relação Infância, Adolescência e Mídia (Grim) da Universidade Federal do Ceará (UFC), durante o painel de exposição dos dados no simpósio em São Paulo.

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“Isso significa que essa criança pode estar sozinha no contato também com estranhos; que pode acessar conteúdos inadequados. Claro que podem estar com restrições técnicas feitas pelos pais, mas a gente sabe que essas restrições não são, muitas vezes, nem do conhecimento hegemônico e nem do uso da maioria”, afirmou.

 

<em>Painel apresentou resultados da TIC Kids Online no 9º Simpósio Crianças e Adolescentes na Internet (Foto: Juliana Fontoura/revista Educação); posse de celular traz desafio de mediação</em>

Painel apresentou resultados da TIC Kids Online Brasil no 9º Simpósio Crianças e Adolescentes na Internet (Foto: Juliana Fontoura/revista Educação); posse de celular traz desafio de mediação

Segundo o estudo, 34% dos responsáveis relatam usar recursos para bloquear ou filtrar alguns tipos de sites. Nesse caso, também há diferenças significativas de acordo com a idade: para crianças de nove e 10 anos, o número é de 45%; 11 e 12 anos, 48%; já para os mais velhos, o número cai, sendo 24% para aqueles de 15 a 17 anos e 26% para aqueles que têm 13 e 14 anos.

Ao longo do painel, a professora Inês Vitorino também alertou para o desafio da curadoria de conteúdos. Isso porque, de acordo com o estudo, além da utilização da internet para fazer trabalhos escolares, crianças e adolescentes também usam a rede amplamente para ouvir música (86%) e assistir a vídeos, programas, filmes ou séries (84%), além de jogar online (78%).

Segundo a professora, em muitos casos, o conteúdo que chega para a criança ou adolescente não é adequado à idade, não tem filtros etários e nem uma política de recomendação colaborativa.

“A política de recomendação que essas crianças recebem é uma curadoria feita de forma empresarial, conforme os interesses que prevalecem em cada uma dessas companhias e dessas plataformas”, afirmou Inês Vitorino.

Sobre o uso excessivo, o estudo mostrou que 24% dos usuários de internet entre 11 e 17 anos declararam ter tentado passar menos tempo na rede, mas que não conseguiram. Além disso, 22% afirmaram que se pegaram navegando sem estar realmente interessados no que viam, e 15% relataram que deixaram de comer ou dormir por causa da internet.

Situações ofensivas

A pesquisa também mapeou a experiência de situações desagradáveis por crianças e adolescentes no ambiente virtual. Segundo o estudo, 29% relataram ter vivenciado situações do tipo (ofensivas, que não gostaram ou chatearam). Em contrapartida, apenas 8% dos responsáveis relataram que acreditam que a criança ou adolescente viveu uma situação incômoda na internet.

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Entre os usuários de 11 e 17 anos que relataram ter vivido alguma situação ofensiva, 31% afirmaram que contaram o ocorrido para o pai ou responsável; 29% disseram que o fizeram para amigo ou amiga da mesma idade; já 13% não contaram para ninguém.

Sobre a pesquisa

A TIC Kids Online Brasil 2024 ouviu 2.424 crianças e adolescentes de nove a 17 anos e o mesmo número de responsáveis. Os dados foram coletados entre março e agosto de 2024.

Os resultados foram expostos no 9º Simpósio Crianças e Adolescentes na Internet no dia 23 de outubro, em São Paulo. O evento foi promovido pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) e o Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), e correalizado pelo Instituto Alana, pelo Centro de Ensino e Pesquisa em Inovação da FGV Direito SP (CEPI FGV Direito SP) e pela SaferNet Brasil.


Fonte: Revista Educação

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