Especialista afirma que ex-presidente precisa de combinação improvável de fatores jurídicos e políticos para disputar eleições, entre eles anistia e mudança na Lei da Ficha Limpa.
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) enfrenta um cenário cada vez mais desfavorável para disputar as eleições de 2026, segundo o cientista político Lucas Fernandes, coordenador de Análise Política da consultoria BMJ. Para concorrer, Bolsonaro precisaria superar uma combinação complexa de obstáculos jurídicos e políticos.
Pressa pela anistia
Aliados no Congresso Nacional aceleram a tramitação de projeto de lei que prevê anistia ampla aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro. O projeto, que requer apenas maioria simples, poderia ser votado rapidamente se for aprovado requerimento de urgência com mais de 260 assinaturas.
“No entanto, por se tratar de tema polêmico, a votação deverá ocorrer de forma nominal, para que os votos fiquem registrados e sejam cobrados tanto pela base bolsonarista quanto por apoiadores do governo”, explica Fernandes.
Impacto do tarifaço de Trump
A decisão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de impor tarifas de até 50% sobre produtos brasileiros em apoio a Bolsonaro pode ter efeito contrário ao pretendido.
“Essa pressão externa dos EUA gera um dilema para a base bolsonarista. O discurso de patriotismo começa a ser colocado em xeque. E, em geral, países que sofrem sanções externas reagem com sentimento de repulsa”, afirma o especialista.
Segundo Fernandes, se o tarifaço for interpretado como consequência da recusa de Lula em negociar com Trump, a aprovação da anistia perde força política.
Limitações jurídicas
O cientista político destaca que a anistia só teria efeito após condenação, e a expectativa é que Bolsonaro seja condenado pelo STF ainda neste ano. No entanto, o projeto atual pode enfrentar questionamentos de inconstitucionalidade.
“A anistia abrange pessoas que atentaram contra o voto popular. Existe chance real de que ela seja considerada inconstitucional pelo STF”, avalia.
Diferença entre anistia e elegibilidade
Mesmo que a anistia seja aprovada, Bolsonaro continuaria inelegível devido a condenação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação.
“A anistia, como está hoje, não cobre essa condenação”, explica Fernandes. Para reverter a inelegibilidade, seria necessário alterar a Lei da Ficha Limpa, o que o especialista considera “manobra difícil e impopular”.
“A Ficha Limpa nasceu como iniciativa popular. A própria direita sempre foi defensora da lei. Mudar isso agora, e de forma ampla, abriria espaço para retorno de vários políticos condenados. É um desgaste enorme”, diz.
Cenário político
Fernandes conclui que Bolsonaro precisa de uma combinação improvável de fatores: “ser anistiado, mudar a Ficha Limpa e ainda garantir maioria no Congresso para isso. Só assim ele poderia concorrer em 2026.”
Mesmo que essas etapas sejam superadas, o especialista ressalta que a questão simbólica permaneceria. “A anistia marca Bolsonaro, mesmo que venha de forma impessoal. Ela tem custo político. E o desgaste com o tarifaço, mais as dificuldades para avançar no Congresso, mostram que o bolsonarismo enfrenta um cenário cada vez mais adverso.”
Fonte: Revista Fórum