Ciência
Entenda como os xenotransplantes podem ser solução para a escassez de órgãos
Publicado
3 meses atrásno
Por
Fato novo
Somente no Brasil, quase 34 mil pessoas esperam por um rim e cerca de sete pessoas inscritas na fila morrem por dia; país avança no xenotransplante com a inauguração de laboratório na USP
Será que os suínos resolverão a crise da falta de órgãos para os transplantes em humanos? A pergunta, que foi o título de um artigo científico publicado em novembro de 2022 na revista Nature, está cada dia mais perto de se tornar realidade por meio do xenotransplante, que nada mais é do que a realização de transplantes de órgãos entre espécies diferentes – no caso, entre suínos e humanos.
A importância desse progresso tecnológico é inegável: somente no Brasil, quase 34 mil pessoas esperam por um rim, segundo o relatório mais recente da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO), divulgado no início de maio. O documento informa ainda que, nos três primeiros meses deste ano, 3.982 adultos entraram na fila de espera por um rim e, ao mesmo tempo, outras 668 pessoas morreram sem conseguir receber um órgão – cerca de sete inscritos por dia.
“Há mais de 30 anos, a ciência tenta encontrar uma alternativa à escassez de órgãos para transplantes. E há algum tempo, descobriu-se que os suínos seriam os melhores doadores, tanto pela anatomia dos órgãos, mais próxima da dos seres humanos, quanto porque eles são criados e abatidos em grande número para consumo. Dessa forma, o uso dos seus órgãos para transplantes é mais bem aceito pela sociedade”, explica o nefrologista Álvaro Pacheco e Silva Filho, membro da equipe de transplantes renais do Hospital Israelita Albert Einstein.
O médico explicou, por exemplo, que no início das pesquisas os cientistas até cogitaram usar órgãos de primatas para o transplante em humanos (por causa de uma possível maior compatibilidade), mas a ideia logo foi descartada. “Provavelmente macacos e chimpanzés seriam mais compatíveis, mas nunca foram vistos como uma fonte animal possível para lidar com a escassez de órgãos. Imagine você criar milhares de primatas para serem sacrificados e doarem seus órgãos. Isso, além de ser muito mais difícil, teria um impacto muito negativo na sociedade”, avalia Silva Filho.
Outra vantagem dos suínos como doadores, ressalta o nefrologista, é que, por existirem espécies de diferentes tamanhos, eles podem ser doadores de órgãos para crianças, adolescentes e adultos, com uma compatibilidade melhor quando se pensa no tamanho dos órgãos.
A principal dificuldade relacionada ao transplante de órgãos de porcos para seres humanos é o fenômeno da rejeição. Ela acontece por causa de determinados antígenos presentes no organismo dos suínos que o corpo humano não suportaria, levando à rejeição imediata. Diante disso, percebeu-se que seria preciso modificar geneticamente os suínos candidatos à doação para “silenciar” os genes identificados como incompatíveis com os humanos.
Por muitos anos, essa foi uma barreira intransponível, pois não havia conhecimento nem tecnologia para isso. O silenciamento dos genes se tornou possível por causa dos avanços da bioengenharia e da genética, começando pela clonagem da ovelha Dolly no final dos anos 1990, passando pelo sequenciamento genômico humano completo, no início dos anos 2000, até chegar à avançada técnica de edição de genes, conhecida como CRISPR, que permite “desligar” os genes que causam a rejeição hiperaguda nos seres humanos.
“Essas três descobertas foram fundamentais para o avanço das pesquisas em torno do xenotransplante. O sequenciamento do genoma humano e do genoma dos suínos, por exemplo, mostrou a semelhança de 98% entre as duas espécies e nos permitiu identificar os genes dos suínos que são responsáveis por causar a rejeição hiperaguda”, relata Mayana Zatz, coordenadora do Centro de Pesquisa e Genoma Humano e Células-Tronco, do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (IB-USP). Ao lado de Silvano Raia, professor emérito da Faculdade de Medicina da USP, Zatz coordena o projeto Produção Nacional de Suínos Voltados para o Xenotransplante e o projeto Xeno BR, que tem como objetivo trabalhar na edição genética de embriões de suínos modificados para produzir doadores de órgãos para transplantes de rim, coração, pele e córnea.
Projeto Xeno BR
O Brasil está avançando nesse sentido. Em abril, o grupo de Zatz inaugurou o primeiro biotério com nível de biossegurança 2 (NB2) dedicado à criação de suínos geneticamente modificados, cujos órgãos possam ser transplantados em humanos. A proposta de criar um laboratório especial para o xenotransplante surgiu há sete anos, idealizada pelo professor Raia, que dedicou toda a sua carreira aos transplantes de órgãos – em 1985, ele realizou o primeiro transplante de fígado com doador falecido da América Latina e, três anos depois, o primeiro com doador vivo da literatura. Ele viajou ao Alabama, nos Estados Unidos, para avaliar os projetos experimentais de xenotransplante e voltou convencido de que essa era a linha de pesquisa mais promissora para obter órgãos adicionais.
“A gente já sabia há muito tempo que os suínos têm órgãos anatômica e fisiologicamente muito semelhantes aos dos seres humanos. Além disso, têm uma gestação de quatro meses, com muitos filhotes, e já existe uma tecnologia estabelecida para sua criação comercial”, observa Mayana Zatz. “Por outro lado, o uso dos suínos como doadores de órgãos não traria problemas éticos em relação à proteção dos animais, porque milhares de porcos são sacrificados todos os dias para consumo. Como dominávamos a tecnologia de edição genômica, resolvemos aceitar esse desafio.”
Silenciar os genes suínos
Como isso funciona? O primeiro passo, explica a geneticista, é silenciar os genes dos suínos que causam a rejeição hiperaguda em humanos. Segundo ela, até agora não existe um consenso de quantos genes devem ser silenciados – alguns grupos falam em três, outros acreditam que silenciar um gene só é suficiente, e outros ainda acham que, além de silenciar os genes dos porcos, é preciso inserir genes humanos. “Nós resolvemos usar a tecnologia de silenciar os três genes produtores de açúcares que são responsáveis pela rejeição”, conta a pesquisadora da USP.
Para silenciar os genes problemáticos, é necessário fazer a edição genética, desligando alguns genes em células de embriões de suínos para depois realizar sua clonagem – a mesma técnica que deu origem à ovelha Dolly. “Depois de editadas, as células dos suínos modificadas são transferidas para óvulos de matrizes. Por esse processo, obtêm-se os embriões sem os genes causadores da rejeição”, explica a geneticista, frisando que esses embriões são inseridos em porcas que seriam “barrigas de aluguel” para gestar os leitões que vão nascer geneticamente modificados.
“Nós já conseguimos fazer o silenciamento dos genes. O grande desafio para o Brasil era ter um biotério de máxima segurança – as ‘Pig Facility’ – porque precisamos criar os porcos num ambiente absolutamente estéril. Inauguramos a primeira unidade no campus da USP e teremos em breve uma unidade maior, no Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT). Ainda não obtivemos os suínos criados, mas já estamos inserindo os embriões nas matrizes que vão gerar esses embriões clonados”, relata a pesquisadora.
Ao mesmo tempo que a equipe da geneticista trabalha na produção dos embriões, o professor Silvano Raia coordena outra frente de trabalho no Instituto do Coração (Incor) para montar um sistema de perfusão isolada normotérmica prolongada, para testar a imunogenicidade dos órgãos. A imunogenicidade é a capacidade de uma substância estranha, como um antígeno, provocar uma resposta imune de um ser humano ou de outro animal.
“Vamos usar o rim do suíno geneticamente modificado e perfundi-lo, durante oito dias, com o próprio sangue suíno. Nesse caso, obviamente não teremos rejeição. Depois, vamos perfundir com sangue humano do tipo O. Temos duas situações possíveis: ou haverá rejeição, ou não haverá rejeição, e estaremos eticamente autorizados a iniciar o uso clínico. Isso é necessário porque devemos comprovar que o rim produzido em nosso laboratório é compatível para o transplante em humanos”, pontua o professor.
A expectativa dos pesquisadores brasileiros é ter um suíno adequado para ser doador de órgãos dentro de dois anos. A princípio, o grupo vai focar seus esforços no xenotransplante de rim porque, se houver a rejeição, o paciente pode voltar a fazer hemodiálise e aguardar um alotransplante com uma prioridade que não tinha antes. No caso de coração ou fígado, por exemplo, isso não é possível porque não existem sistemas que substituam a função desses órgãos.
Xenotransplantes já aconteceram
Nos últimos dois anos, aconteceram alguns transplantes com órgãos de porcos modificados em humanos. O transplante de rim, inicialmente, foi um procedimento experimental – os órgãos foram colocados em pessoas que estavam com morte cerebral para estudar como o procedimento transcorreria e quais as possíveis complicações. Os órgãos transplantados não foram rejeitados e produziram urina, o que mostrou que o procedimento era viável.
Em março, a equipe do médico brasileiro Leonardo Riella realizou o primeiro xenotransplante clínico de rim de suíno em um ser humano vivo (sem morte cerebral), em Boston, nos Estados Unidos. O receptor era um paciente com insuficiência renal crônica, submetido anteriormente a alotransplante, cujo órgão foi rejeitado, determinando que ele permanecesse sete anos em hemodiálise. O homem viveu por dois meses, sem hemodiálise, com a função renal normal, mas acabou morrendo em casa, provavelmente por complicações cardíacas.
“A escolha desse receptor obedeceu ao princípio ético que determina empregar novos métodos apenas em pacientes com indicação por compaixão, ou seja, sem outra alternativa disponível para evitar a sua morte em curto período de tempo”, avaliou Raia.
Além do caso de Boston, uma mulher de Nova Iorque, com insuficiência renal grave e cardiopatia crônica, também recebeu um rim de suíno modificado. “Era uma paciente muito grave, que não seria aceita para o transplante devido a condições de saúde muito debilitadas. Além do rim, ela também recebeu um coração artificial”, conta Silva Filho, ao ressaltar que são dois casos de pacientes extremamente críticos, que não teriam outra opção.
Na avaliação do nefrologista do Einstein, o xenotransplante poderá ser um grande aliado dos pacientes diante da escassez de órgãos no Brasil e no mundo. “Eu estou maravilhado. Realmente feliz e entusiasmado em ver esses primeiros xenotransplantes em seres humanos. Por todas as dificuldades descritas, achei que seria muito mais difícil avançarmos. E o Brasil avança com o resto do mundo. Isso abre uma perspectiva muito boa e é lógico que terá de ser aperfeiçoado com o passar dos anos. Esse é um aprendizado, mas milhares de pessoas estão aguardando um órgão e a lista só aumenta”, comenta.
Também para o professor Raia, o xenotransplante é o futuro dos transplantes no Brasil. E ele defende que os órgãos suínos sejam distribuídos obedecendo ao critério da lista única atualmente em vigor. “Não prevalecerá o lema ‘leva antes quem paga mais’. Haverá uma comissão responsável por indicar qual o receptor em lista de espera será o mais adequado para receber um órgão suíno. Ele poderá autorizar ou não o xenotransplante”, afirma.
Raia ressalta ainda que, a partir do momento que existirem órgãos suínos disponíveis para os inscritos, ocorrerá uma antecipação na indicação do transplante, incluindo pacientes menos graves. Para ele, os resultados dos primeiros xenotransplantes fazem parte do progresso das cirurgias, pois elas “ocorrem pelo sucesso baseado na correção dos erros que determinaram os insucessos anteriores. É assim que aconteceu com a história de todos os transplantes.”
Ciência
Gama promove etapa regional do 13º Circuito de Ciências
Publicado
4 dias atrásno
10 de setembro de 2024Por
Fato novo
Os melhores projetos apresentados participarão da mostra distrital, que será realizada em novembro
Com o tema “Biomas do Brasil: diversidade, saberes e tecnologias sociais”, a 13ª edição do Circuito de Ciências busca incentivar nos estudantes da rede pública do Distrito Federal o interesse pelas ciências. Na última quinta-feira (5), foi a vez de o Gama realizar a sua etapa regional. O evento ocorreu na sede da Coordenação Regional de Ensino (CRE) e contou com a apresentação de 33 projetos criativos e inovadores de autoria dos alunos, com a orientação de seus professores.
Durante a etapa regional, foram recebidos cerca de 1.200 visitantes de todas as escolas públicas do Gama, entre alunos e comunidade local. Os melhores projetos apresentados participarão da etapa distrital. Um dos objetivos do Circuito de Ciências é transformar as escolas em ambientes que promovam a exploração científica e a aprendizagem ativa, com atividades práticas que aplicam os conceitos científicos em situações reais.
A coordenadora da Regional do Gama, Cássia Maria Marques, explicou que a etapa regional do circuito foi organizada ao longo de três meses, mas o tema foi trabalhado o ano todo, com a realização das feiras de ciências nas escolas.
“Daqui podem sair cientistas, pois esse projeto leva aos estudantes uma noção do que significa ser protagonista, ser agente social, participar de projetos que serão válidos para o futuro, para a qualidade de vida das pessoas”, disse.
“Eles têm orgulho de apresentar a sua escola, a sua ideia, o seu grupo. Quando eles apresentam o trabalho, vemos que é fruto de uma construção”, afirma Thaiane Valessa, chefe da Unidade de Educação Básica da Regional do Gama
A etapa regional da 13ª edição do Circuito de Ciências ocorre em todas as regionais de ensino, e é seguida pela etapa distrital, com a competição do melhor projeto do DF. A banca examinadora, composta por mestres e doutores que não têm vínculo com as escolas, indicam os projetos que mais se destacaram em dez categorias, divididas entre as etapas e as modalidades de ensino ofertadas pela Secretaria de Educação (SEEDF).
Educação infantil
Neste ano, a regional do Gama expandiu de 23 para 33 os projetos participantes, de forma a abranger todas as etapas de ensino, desde a educação infantil até o ensino médio. Thaiane Valessa, chefe da Unidade de Educação Básica (Unieb) da regional e uma das organizadoras da etapa, avalia que as feiras de ciências criam uma cultura de empoderamento e pertencimento aos alunos.
“Eles têm orgulho de apresentar a sua escola, a sua ideia, o seu grupo. Quando eles apresentam o trabalho, vemos que é fruto de uma construção. Esse ano temos a educação infantil aqui, anos iniciais, com a representatividade de todas as etapas de ensino. Os pequenininhos estão aí, o que é ótimo, pois já inicia uma educação precoce, e eles entendem que ciências não é coisa só para adultos”, celebra Thaiane.
Engajamento
O evento é um espaço de aprendizado dinâmico, que celebra a curiosidade e o potencial transformador da educação científica nas escolas públicas do Distrito Federal. Ao final da etapa regional, de 23 de agosto a 15 de setembro, cada CRE deve encaminhar os três melhores trabalhos por modalidade para participar da mostra distrital, a ser realizada em novembro.
A estudante Mariana Alves Silva, 16 anos, do Centro Educacional (CED) 8 do Gama, falou sobre os trabalhos da escola. “Nossos projetos foram iniciados na química. Um é sobre o etanol. Mostramos como é sua extração e síntese, a partir do caldo de cana. O outro é sobre a extração e o uso de essências de citronela no combate à dengue. Fomos visitar casas na vizinhança e vimos onde estavam os focos de dengue, e a citronela foi usada para espantar o Aedes aegypti, vetor da doença”, explicou.
Mariana conta que o circuito foi importante para promover o contato com a ciência, além de divulgar projetos que visam melhorar a qualidade de vida da comunidade. “É muito importante porque a gente tem um contato com a ciência na prática, nas nossas próprias vidas. Vimos que a gente pode fazer alguma coisa para ajudar a combater a dengue, por exemplo”, ressaltou.
Outra participante do Circuito de Ciências foi Daniele Alves, 16 anos, que estuda no Centro de Ensino Médio Integrado do Gama (Cemi). “De certa forma, antes eu via a ciência como algo desinteressante. Mas fazendo esse trabalho, mesmo ele sendo meio cansativo, vi que pode ser algo bem interessante, porque ele prepara a gente para o futuro”, contou.
A estudante apresentou um projeto sobre prevenção ao câncer de mama e disse que as propostas interventivas são muito úteis, pois visam trazer soluções para a sociedade. “Acredito que as grandes revoluções ocorreram realmente quando foi feito algo novo, que é a proposta desses trabalhos científicos, inovar ou então aprimorar algo. Nós vamos fazer pesquisas que podem impactar a sociedade positivamente, pesquisando em áreas de alta relevância social”, concluiu Daniele.
Siga nossas redes sociais: Facebook e Instagram.
Fato Novo com informações e imagens: Agência Brasília
Ciência
Jovens para sempre: será mesmo possível evitar o envelhecimento?
Publicado
3 semanas atrásno
24 de agosto de 2024Por
Fato novo
Enquanto a ciência estuda o rejuvenescimento de células, milionários entram em competições para ficar mais novos. Mas estamos mesmo próximos de evitar o envelhecimento?
“Eu sou aquele maluco que está tentando não morrer”, diz Bryan Johnson, com uma dose de orgulho e outra de humor, na bio do seu Instagram. Nas redes sociais, o empresário americano de 46 anos detalha seus esforços para voltar a ter o organismo de alguém com 18. A lista inclui fazer exercícios de “um atleta profissional de rejuvenescimento” (como ele mesmo se define), seguir uma dieta ultrarregrada (com direito a uma “mistura da longevidade” que contém alguns dos seus 111 suplementos diários) e ter uma noite de sono perfeita (o que exige, entre outras condições, encontrar o travesseiro da espessura certa para não bloquear a circulação das veias do pescoço).
Não para por aí. Johnson, que diz investir cerca de US$ 2 milhões por ano na tentativa de rejuvenescer, também teria editado seu DNA “em uma ilha secreta para viver para sempre” e recebido “300 milhões de células-tronco” para ter “articulações super-humanas”, segundo anuncia aos seus mais de 1 milhão de inscritos no YouTube. Todo o esforço é acompanhado por uma equipe que o empresário contratou em 2021 para analisar pesquisas sobre longevidade e monitorar dados sobre os órgãos dele.
Na descrição do seu canal, o americano declara que, graças ao seu “protocolo”, já “alcançou uma saúde metabólica equivalente ao top 1,5% dos jovens de 18 anos, 66% menos inflamação do que a média para uma criança de 10 anos e reduziu sua velocidade de envelhecimento em 31 anos”. Sim, segundo o próprio, foi possível estimar tudo isso com rigor científico. Tanto que, hoje, comemora seu aniversário a cada 19 meses.
O milionário não está sozinho nesse empenho, e chegou a criar o ranking Rejuvenation Olympics (“Olimpíadas do rejuvenescimento”, em tradução livre), para competir com outras pessoas pela menor taxa de envelhecimento. Quem lidera a disputa atualmente é Brooke Paulin — biohacker que vive em Chicago e que, no Instagram, ostenta orgulhosa a ideia de que envelhece só “0,64 ano” a cada 12 meses.
Dados do tipo são calculados por empresas como a TruDiagnostic, sediada nos Estados Unidos, que vende kits de até US$ 957 para os competidores coletarem amostras de sangue e fazerem testes de epigenética — focados em flagrar as marcas que seu estilo de vida deixam no DNA. Os exames prometem determinar quão rapidamente o corpo dos clientes está envelhecendo a nível celular. Mas, afinal, estamos realmente próximos de atingir a juventude eterna?
Busca antiga
Milênios antes de milionários embarcarem em competições contra o envelhecimento, humanos já se preocupavam com os cabelos brancos. “Esse sempre é um tópico que algumas pessoas abraçam e outras simplesmente veem como algo ruim. Voltando ao pensamento na Grécia e na Roma antigas, alguns diziam que, quando você fi ca mais velho, você se torna sábio e deve ser ouvido, enquanto outros diziam que as pessoas mais velhas são um problema”, afirma Nancy A. Pachana, geropsicóloga clínica, neuropsicóloga e professora da Universidade de Queensland, na Austrália.
O primeiro imperador da China, Qin Shi Huang (259 – 210 a.C), por exemplo, passou anos procurando medicamentos mágicos para curar o envelhecimento. Chegou, inclusive, a organizar expedições para o Mar da China Oriental em busca das lendárias “Ilhas dos Imortais”, onde acreditava existirem plantas que garantiriam a vida eterna. No entanto, essa obsessão pode justamente ter causado a morte do líder aos 49 anos, já que alguns dos elixires que ele tomou provavelmente continham um ingrediente tóxico: mercúrio.
No Ocidente, também ficaram famosas as histórias de Nicolas Flamel, um escrivão da França medieval, e Elizabeth Báthory, condessa húngara que viveu entre os séculos 16 e 17. Há o mito de que o primeiro fabricou o “elixir da longa vida”; já Báthory virou lenda por supostamente ter assassinado mulheres jovens em seu castelo e se banhado no sangue delas para tentar manter sua própria juventude — ainda que, hoje, historiadores levantem dúvidas sobre se esse hábito mórbido existiu mesmo.
O interessante é que, mais de 400 anos após a morte da condessa, o sangue continua sendo visto como uma possível chave da longevidade. Entre 2016 e 2017, a Ambrosia, uma startup baseada nos Estados Unidos, chamou atenção ao começar a oferecer transfusões de plasma retirado de jovens adultos. Seu fundador, Jesse Karmazin, declarava que, segundo testes clínicos feitos por sua equipe, o líquido poderia reduzir o colesterol e até prevenir o Alzheimer. O preço de uma transfusão de 1,5L foi fixado em US$ 8 mil (R$ 45 mil).
Bryan Johnson tentou o mesmo tratamento no ano passado: recebeu uma transfusão de plasma do seu filho de 18 anos em uma clínica no Texas, Estados Unidos, cujo site promete “opções de tratamento antienvelhecimento, regenerativo e integrado”. Em um vídeo no YouTube, o empresário resume a inspiração científica por trás da tentativa: “Isso começou com um experimento muito louco em que dois camundongos foram costurados um ao outro para compartilharem o mesmo sistema circulatório. Era um velho e um jovem, e os resultados mostraram que o mais velho rejuvenesceu”.
“A principal compreensão desse tipo de experimento é que o microambiente vai influenciar a capacidade da célula de se proliferar ou a maneira como ela se comporta”, explica Rodrigo Calado, especialista em hematologia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP).
Membro do Centro de Terapia Celular da USP, o professor aponta que há, sim, diferenças entre o plasma de pessoas com idades distintas. “A mesma coisa acontece quando você transfunde uma bolsa de sangue de glóbulos vermelhos: uma bolsa mais jovem vai ter um comportamento diferente, vai durar mais tempo, vai ter uma infusão mais demorada do que uma bolsa que está mais velha”, aponta. Contudo, ainda não há como afirmar que a transfusão de plasma entre humanos seja como tomar o “elixir da vida”. “Primeiro que nem é permitido, do ponto de vista ético, você transfundir um plasma de alguém sem indicação médica. E o efeito que uma bolsa de plasma com 200 e poucos mL terá a curto ou a longo prazo é algo pouco compreendido”, diz.
Chamada parabiose, a técnica descrita acima é antiga: já no século 19 o zoólogo, fisiologista e político francês Paul Bert estudava esse tipo de cirurgia em animais. Segundo o Instituto Nacional de Envelhecimento dos Estados Unidos, algumas pesquisas de fato já mostraram que o sangue de camundongos jovens poderia reduzir ou reverter os efeitos do envelhecimento nos cérebros de cobaias mais velhas. Porém, em estudos mais recentes, o foco é trocar outras células além do plasma, e, a partir disso, analisar como atua o meio para onde esses componentes migraram.
Em fevereiro de 2019, a startup Ambrosia anunciou que parou de realizar transfusões de plasma. A declaração veio após a Food and Drug Administration, agência do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos comparada à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no Brasil, emitir um comunicado desaconselhando pessoas a fazer esse tipo de terapia para tratar o envelhecimento ou doenças como demência, Parkinson, esclerose múltipla ou Alzheimer. O órgão justificou: “Não há benefício clínico comprovado na infusão de plasma de doadores jovens para curar, mitigar, tratar ou prevenir essas condições, e existem riscos associados ao uso de qualquer produto de plasma”.
Depois, Johnson admitiu no X, antigo Twitter, que a transfusão que recebeu do filho não lhe trouxe nenhum benefício detectável, mas disse que “métodos alternativos” com o plasma ainda poderiam ser “promissores”. Não foi a primeira vez que deu o braço a torcer: no site em que vende suplementos vitamínicos inspirados em sua dieta “de rejuvenescimento”, ele adicionou um asterisco à afirmação de que seu pó de cacau (US$ 64 por 340g) é “comprovado clinicamente” como capaz de “promover a saúde cardíaca a longo prazo”. “Essas declarações não foram avaliadas pela FDA. Este produto não se destina a diagnosticar, tratar, curar ou prevenir qualquer doença”, diz o aviso, no rodapé da página.
A fonte (interna) da juventude
Para entender o que a ciência realmente já sabe sobre o envelhecimento e o rejuvenescimento, é necessário compreender dois pontos. Um deles é o processo de senescência das células, que é quando elas atingem uma condição metabólica distinta das outras, que as faz perder suas funções comuns. O outro ponto é o envelhecimento do organismo como um todo.
Neste caso, é um processo fundamentalmente regulado por hormônios, e pode ser percebido inclusive na nossa aparência (pense na puberdade, quando perdemos o aspecto infantil devido ao crescimento de pelos e outras mudanças). Além disso, quando falamos do envelhecimento do nosso organismo, inflamações nos órgãos também entram em jogo, como a exposição excessiva ao Sol, que danifica a pele, ou o abuso do álcool, que afeta o fígado.
A ciência tem avançado no estudo da senescência de células específicas. Em uma pesquisa publicada na revista científica eLife em 2022, cientistas da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, afirmaram ter rejuvenescido células de pele humana em 30 anos. Isso foi possível graças à Reprogramação Transitória da Fase de Maturação, um método inspirado nas descobertas de Shinya Yamanaka em 2007. O pesquisador japonês ganhou o Nobel de Medicina junto com o cientista inglês John Gurdon após demonstrar que células humanas maduras — e, portanto, especializadas em uma única função — podem ser reprogramadas para se tornar pluripotentes.
Em outras palavras, podemos fazer uma estrutura retroceder até o estágio no qual ela é capaz de dar origem a qualquer tipo de tecido do corpo. Porém, no estudo de dois anos atrás, os pesquisadores contaram uma vantagem: eles conseguiram reprogramar as células de pele humana para deixá-las biologicamente mais jovens, mas ainda capazes de recuperar sua função celular especializada. Eles as fizeram “voltar no tempo” só o sufi ciente para reduzir a expressão de proteínas tóxicas; é como passar uma “borracha” nos remendos que se acumulam no DNA conforme as células envelhecem.
Há outras linhas de pesquisa além da reprogramação celular. A Aptah Bio, empresa baseada no Vale do Silício, nos Estados Unidos, afirma ter desenvolvido uma tecnologia capaz de “rejuvenescer células pela correção de múltiplos RNAs defeituosos e proteínas tóxicas simultaneamente, em um estado de diferenciação completo”, segundo o site da companhia. Inicialmente, a ideia da empresa era buscar uma solução para doenças como o Alzheimer e o glioblastoma, um tumor maligno cerebral. ”Na realidade, a gente está resolvendo o Alzheimer rejuvenescendo as células, e isso poderia ser aplicado para todas as células do corpo, para um cenário muito maior do que a gente imaginava”, conta o cofundador e CEO Rafael Bottos.
Segundo o engenheiro e empreendedor brasileiro, uma pesquisa recente da Aptah Bio conseguiu rejuvenescer neurônios humanos. O estudo foi feito no Canadá com dois pacientes de 75 anos, um com Alzheimer e outro sem a doença. “Existem dados públicos que mostram a faixa de degradação dos RNAs, dos 15 anos de idade até quase os 100. Então, quando tratamos nossas células, vimos que as rejuvenescemos em, no mínimo, 30 anos em sete dias”, diz Bottos.
“Recuperamos a comunicação dos neurônios que estavam sem conversar.” O artigo que descreve a técnica foi submetido à revista científica Nature, e atualmente está sendo revisado por um grupo de cientistas independente. A esperança é que, se aprovado no futuro, o medicamento possa ser produzido em larga escala.
“Talvez daqui a 10 anos, 15 anos, todo mundo poderá usar a nossa droga de forma preventiva”, aposta o cofundador da empresa. Bottos trabalha na Aptah Bio com um conselho de cientistas de diversas especializações. Entre eles, está o geneticista George Church, professor na Universidade Harvard e no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), que é referência no ramo da longevidade. Além disso, o empresário diz estar em contato com o também brasileiro Alysson Muotri, professor e pesquisador da Universidade da Califórnia em San Diego (UCSD) que ganhou notoriedade por pesquisas com mini-cérebros e estuda o impacto da microgravidade na saúde neurológica de astronautas.
“A gente pode tentar modificar o que é influência externa do ambiente, mas o que é intrínseco da célula e do organismo é mais difícil ser modificado” — Rodrigo Calado, especialista em hematologia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP
Em 2019, uma pesquisa de Muotri em colaboração com a Nasa mostrou que células cerebrais envelhecem muito mais rapidamente no espaço. “Hoje, o maior desafio da exploração espacial não é tecnológico, mas biológico”, destaca Bottos.
Essas pesquisas com neurônios e células da pele humana nos aproximam das “Ilhas dos Imortais” ou do elixir da vida que o imperador Qin Shi Huang tanto procurou? Não exatamente. Na visão de Rodrigo Calado, apesar dos avanços nos últimos anos, ainda parece muito improvável que algum ser humano viva por séculos; que dirá para sempre. Afinal, os mecanismos de envelhecimento do corpo que são regulados por hormônios não dependem apenas de como cuidamos da saúde.
Há condições favoráveis à longevidade que já vêm marcadas no DNA; é por isso que uma tartaruga-gigante-de-aldabra (Aldabrachelys gigantea) da ilha de Santa Helena, no Caribe, chegou aos 191 anos e conquistou o recorde de animal terrestre vivo mais velho do planeta. “A gente pode tentar modificar o que é infl uência externa do ambiente, mas o que é intrínseco da célula e do organismo é mais difícil ser modificado. E tentativas de alterar isso podem levar a complicações, como o câncer”, explica Rodrigo Calado.
Bottos também não acredita na imortalidade. “Acho que por mais que você tome cuidado com a parte biológica e a alimentação, você não vai evitar [todo e] qualquer tipo de dano na sua célula. Seria impossível”, diz. O foco da Aptah Bio não é transformar humanos em seres imortais, reforça. “A ideia é que todo mundo no mundo possa usar a nossa droga para viver melhor enquanto estiver aqui na Terra.” A professora e geropsicóloga Nancy A. Pachana tem um ponto de vista similar: “Prefiro usar a tecnologia para ajudar as pessoas a viverem a melhor vida possível. Ajudá-las a lembrar de tomar seus remédios, fazer escolhas saudáveis no supermercado, ou oferecer ajuda a quem vive com demência [por exemplo]. Prefiro isso do que confiar em uma tecnologia que é quase uma fantasia”.
Medo do inevitável
Bryan Johnson afi rma ainda não ter perdido a esperança de se tornar imortal. O americano até criou uma comunidade chamada “Don’t Die” (“não morra”), na qual convida membros a participarem de fóruns online e eventos. A intenção é derrotar “todas as causas de morte humana” e “construir tudo o que promova a prosperidade”. “Queremos ter a escolha entre vida contínua ou morte, explorar corajosamente o futuro, fazer da Terra um planeta sustentável para aqueles que escolhem a vida e garantir o futuro da existência humana com o avanço da inteligência artificial”, diz o site da iniciativa.
Talvez muitos humanos queiram vidas mais longas porque pertencemos a uma espécie insatisfeita por natureza. Existir por mais tempo significa, no papel, a ilusão de poder viver uma vida mais completa. De consumir e viajar mais, ver a tecnologia avançar e assistir de camarote ao fim de outros ciclos da vida na Terra. E também de ser lembrado por mais tempo — quem sabe, como a pessoa que conseguiu driblar a morte por alguns anos.
No entanto, o interesse em evitar a morte ou o envelhecimento nem sempre toma contornos dignos de uma ficção científica otimista. Na verdade, para muitos, esse é um desejo ligado a preocupações mais profundas. Uma pesquisa feita em 2015 pelo Instituto Qualibest e encomendada pelo laboratório Pfizer aponta que 90% da população brasileira têm medo de ficar mais velha. O maior temor de quem respondeu (989 pessoas ao todo) foram as complicações de saúde, sendo que a incidência mais alta desse sentimento apareceu nos grupos entre 18 e 35 anos.
Já um levantamento de 2024 conduzido pela agência de pesquisa de mercado OnePoll e encomendado pela Forbes Health descobriu que 47% dos americanos temem ficar mais velhos. Como no estudo mais antigo com brasileiros, esse pavor se mostrou mais forte entre os jovens, sendo relatado por 56% dos participantes de 18 a 25 anos. Entre os maiores receios dos 2 mil voluntários estão o declínio da saúde (63%), a perda de pessoas queridas (52%) e problemas financeiros (38%).
Um questionário divulgado em abril pela Luvly, plataforma americana de beleza e bem-estar, investigou o medo do envelhecimento com foco em mulheres com mais de 30 anos. Das 2 mil entrevistadas, 56% temem ficar mais velhas. O motivo mais citado foi a mudança da aparência (36% do total), seguido do medo de ser negligenciada pela sociedade (12%).
Essas pesquisas, aliás, demonstram uma diferença entre o pavor de ficar mais velho e a obsessão em permanecer jovem: embora os dois possam andar juntos, o primeiro está muito associado ao temor de doenças ou da própria mortalidade, enquanto o segundo geralmente está ligado às pressões estéticas do etarismo. “Uma amiga minha, que é apresentadora, diz: ‘Se eu não aplicasse Botox, não teria um emprego’. Então, não se trata apenas de ‘ah, quero me sentir bonita’”, reflete Nancy A. Pachana.
Esse também parece ser o caso da empresária e influencer norte-americana Kim Kardashian. Ela, que chegou a participar de um jantar com Johnson para discutir a mortalidade e já con-fessou se preocupar com o envelhecimento “todos os dias”, causou polêmica ao afirmar que, aos 43 anos, só tem mais uma década para “ser bonita” e investir na carreira de atriz. “Isso é tudo o que tenho em mim; daí vou tirar uma folga”, lamentou, em um episódio do reality show The Kardashians lançado em junho.
Em 2022, a famosa causou controvérsia ao dizer ao The New York Times que chegaria ao ponto de comer um “pote de cocô todos os dias” se isso a fizesse parecer mais jovem. E, em julho, revelou ter injetado no rosto substâncias derivadas de sêmen de salmão na esperança de que isso ajude sua pele a se regenerar e a produzir mais colágeno. O tratamento tem sessões em torno de US$ 500, e também já foi testado pela atriz Jennifer Aniston, estrela da sitcom Friends (1994-2004). No entanto, não possui aprovação da FDA.
As redes sociais poderiam explicar parte da aversão ao envelhecimento atualmente, especialmente entre as gerações mais novas. Mas há mais coisas nessa conta — como os próprios avanços nas áreas de estética e biotecnologia. “Hoje em dia, você pode parecer jovem se gastar dinheiro em produtos muito caros, ou se fizer alguma cirurgia plástica. Acho que essa ideia de confiar na tecnologia para permanecer jovem tem dado às pessoas algum tipo de concepção errada de que é possível retardar o envelhecimento”, reflete Chao Fang, professor de sociologia e vice-diretor do Centro de Envelhecimento e Curso de Vida da Universidade de Liverpool, na Inglaterra.
Como envelhecer bem
Abordar o envelhecimento de forma mais positiva é tão importante quanto esforços para tornar esse processo mais saudável. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), com apenas quatro anos, as crianças já começam a se dar conta dos estereótipos de idade em suas próprias culturas. Então, internalizam esses sentimentos, o que pode levá-las não só a reproduzir preconceitos com os outros, mas também a sofrer em qualquer fase da vida. Um estudo publicado na revista Aging & Mental Health em 2023, por exemplo, observou um impacto gravíssimo do etarismo sobre a saúde mental.
“Aqueles que possuem uma capacidade limitada de ficar contentes e de se senti-rem bem com a vida, o que são marcas registradas do etarismo internalizado, possuem maior risco de ter pensamentos suicidas”, concluíram os autores, após aplicarem um questionário a 454 pessoas com idades entre 65 e 91 anos nos Estados Unidos.
Essa percepção não tem a ver apenas com a maneira como cada um enxerga a si mesmo — mas também em como vemos os outros. Um levantamento da consultoria Ernst & Young Brasil e da plataforma Maturi fez apontamentos preocupantes sobre como o mercado de trabalho brasileiro lida com profissionais mais velhos. Após duas pesquisas — uma feita em 2022 com 191 empresas de 13 setores, e outra conduzida em 2023 com 4.840 participantes com idade de 58 anos, em média —, os autores constataram, entre outras percepções, que as organizações são etaristas. Os profissionais com mais de 50 anos não costumam ser considerados como força de trabalho. Das empresas ouvidas, 42% haviam contratado somente de uma a 10 pessoas nessa faixa de idade nos últimos cinco anos, e 9% não haviam admitido ninguém com esse perfi l durante o mesmo período.
Além disso, 47% estavam desempregados ou sem ocupação que gerasse renda, e 93% buscavam recolocação. Essas conclusões se tornam ainda mais inquietantes uma vez que dados do Censo Demográfico 2022 mostram um envelhecimento do Brasil: o total de pessoas com 60 anos ou mais cresceu 56% desde 2010. Hoje, esse público representa 15,6% da população.
As sociedades deveriam combater sistemas etaristas por meios políticos ou legais, na visão de Pachana. “Não pode ser apenas ações individuais, porque se uma empresa tenta mandar pessoas embora quando elas têm, digamos, 55 anos, dizendo que estão muito velhas, existe uma questão sistêmica”, analisa a professora da Universidade de Queensland, que também é autora do livro Ageing: A Very Short Introduction (sem edição no Brasil), publicado pela Oxford Press em 2016.
Um dos meios para combater estruturas etaristas é parar de rotular o envelhecimento ou as pessoas idosas como um “fardo”, acrescenta Chao Fang. “Precisamos adotar narrativas mais inclusivas ou mais positivas nas políticas”, defende. E, embora não haja nenhuma solução rápida para esses problemas, o professor da Universidade de Liverpool observa mais um caminho para abraçarmos o envelhecimento a nível tanto individual quanto coletivo: a convivência intergeracional.
Em muitas sociedades antigas, os jovens conviviam mais com os idosos, e, com isso, podiam ver os pontos positivos do envelhecimento, como os ganhos em sabedoria e respeitabilidade. “Na sociedade contemporânea, muitos jovens provavelmente só veem seus avós uma vez por ano. Claro que eles não sabem como é o envelhecimento. E, quando não conhecemos algo muito bem, isso pode criar um senso de incerteza”, aponta. Ou seja: no fundo, o pavor de ficar mais velho é nada além do que o medo do desconhecido.
Por isso, o caminho mais seguro para um envelhecimento feliz passa por tentar somar os anos da forma menos melancólica possível. Enxergar o envelhecimento — e, por tabela, a morte — como algo natural é apenas se convencer do óbvio: ninguém conseguirá sair desta (com o perdão do trocadilho) vivo para contar história. Até mesmo quem se esforçou muito na tentativa de provar o contrário.
Fato Novo com informações: Revista Galileu
Ciência
Como o código de barras, que completa 50 anos, revolucionou o comércio global
Publicado
3 semanas atrásno
24 de agosto de 2024Por
Fato novo
Invenção não mudou apenas momento de finalizar a compra. Ao tornar produtos legíveis por máquina, itens que vendiam bem podem ser reabastecidos rapidamente, exigindo menos espaço nas prateleiras
O primeiro código de barras moderno foi escaneado há 50 anos – em um pacote de 10 chicletes, em um supermercado, em Troy (EUA).
Cinquenta anos remete a um tempo antigo para a maioria das tecnologias, mas essa ainda está em alta. Mais de 10 bilhões de códigos de barra são lidos todos os dias em todo o mundo. E novos tipos de símbolos, como os códigos QR, criaram ainda mais usos para a tecnologia.
Eu teria sido como a maioria das pessoas, sem nunca pensar duas vezes na humilde codificação, se minha pesquisa como acadêmico de mídia na Universidade Clemson (EUA) não tivesse tomado alguns rumos estranhos. Em vez disso, passei um ano da minha vida vasculhando os arquivos e artigos de jornais antigos para saber mais sobre as origens deste método visual legível por máquinas – e acabei escrevendo um livro sobre a história cultural do código de barras.
Embora ele não tenha anunciado o fim dos tempos, como os teóricos da conspiração chegaram a temer, deu início a uma nova e revolucionária era no comércio global.
Os códigos de barras foram uma invenção da indústria de alimentos
Apesar de o mundo ter mudado muito desde meados da década de 1970, o Código Universal de Produto (UPC) – no qual a maioria das pessoas pensa quando ouve a palavra “código de barras” – não mudou. Ele foi escaneado pela primeira vez (no histórico pacote de chicletes) em 26 de junho de 1974 e continua, basicamente, idêntico aos bilhões de códigos de barras lidos em lojas de todo o mundo, atualmente.
Quando o primeiro UPC foi escaneado, era o resultado de anos de planejamento do setor de supermercados dos Estados Unidos. No final da década de 1960, os custos de mão de obra estavam aumentando rapidamente e o inventário (contagem, identificação e classificação dos produtos) estava se tornando cada vez mais difícil de rastrear. Os executivos do ramo esperavam que o novo método de leitura digital pudesse ajudá-los a resolver esses dois problemas, e acabaram acertando.
No início da década de 1970, o setor criou um comitê que desenvolveu o padrão de dados UPC e escolheu o símbolo de código de barras da IBM (empresa de tecnologia da informação), em vez de meia dúzia de designs alternativos. Tanto o padrão de dados quanto o símbolo ainda são usados até hoje.
Com base nas notas de reuniões que encontrei no Arquivo Goldberg da Stony Brook University, as pessoas que desenvolveram o sistema UPC achavam que estavam fazendo um trabalho importante. Entretanto, elas não tinham ideia de que estavam criando algo que sobreviveria por tanto tempo.
Alguns jornais publicaram artigos curtos sobre o evento de lançamento, mas não foram exatamente notícias de primeira página. A importância só se tornou aparente anos mais tarde, à medida que os códigos de barras se tornaram uma das infraestruturas de dados digitais de maior sucesso no mundo.
Os códigos de barras criaram uma revolução no espaço de prateleiras
A invenção não mudou apenas a experiência de finalização de uma compra. Ao tornar os produtos legíveis por máquina, eles permitiram grandes melhorias no rastreamento de estoque. Isso significava que os itens que vendiam bem poderiam ser reabastecidos rapidamente quando os dados indicassem, exigindo menos espaço nas prateleiras para qualquer produto individual.
Como escreveu o especialista em código de barras Stephen A. Brown, a redução da necessidade de espaço nas prateleiras permitiu uma rápida proliferação de novos produtos. Você pode culpar os códigos pelo fato de seu supermercado vender 15 tipos de pasta de dente quase indistinguíveis.
Da mesma forma, as superlojas de hoje, provavelmente, não existiriam sem a enorme quantidade de dados de inventário que os sistemas produzem. Como disse o professor Sanjay Sharma, do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), “se os códigos de barras não tivessem sido inventados, todo o layout e a arquitetura do comércio seriam diferentes”.
Outros setores aderiram rapidamente
O mecanismo nasceu no setor de supermercados, mas não ficou confinado aos corredores de alimentos por muito tempo. Em meados da década de 1980, o sucesso do sistema UPC incentivou outros setores a adotar os códigos de barras. Por exemplo, em um período de três anos, o Walmart, o Departamento de Defesa e o setor automotivo dos Estados Unidos começaram a usá-los para rastrear objetos nas cadeias de suprimentos.
As empresas privadas de transporte também adotaram o mecanismo para capturar dados de identificação. A FedEx e a UPS (setores de remessas) até criaram seus próprios símbolos de código de barras.
Como explicou o sociólogo Nigel Thrift, no final da década de 1990, eles tornaram-se “um elemento crucial na história da nova forma de mundo”. Ajudaram a permitir a rápida globalização de formas que seriam difíceis de imaginar se não existissem.
Preto e branco e despercebido por toda parte
Para alguém que ficou tão interessado nesta história – como eu, que fiz uma tatuagem no meu braço do código de barras do International Standard Book Number do meu último livro -, a passagem silenciosa do 50º aniversário do código de barras parece quase poética.
Cresci em um mundo onde eles estavam por toda parte: nos produtos que comprei, ingressos de shows que digitalizei, pacotes que recebi.
Por décadas, eles têm sido um cavalo de batalha operando no pano de fundo de nossas vidas. Os humanos modernos os escaneiam inúmeras vezes todos os dias, mas raramente pensamos neles porque não são chamativos e simplesmente funcionam – na maioria das vezes, pelo menos.
À medida que os códigos de barras continuam a se movimentar em sua velhice, eles são um lembrete de que as tecnologias aparentemente enfadonhas costumam ser muito mais interessantes e importantes do que a maioria das pessoas imagina.
Este artigo foi escrito por Jordan Frith, professor de comunicação da Universidade Clemson, nos Estados Unidos. O texto foi publicado originalmente no site The Conversation.
Fato Novo com informações: Revista Galileu
Mais vistas
-
Brasil2 dias atrás
Código de Defesa do Consumidor completa 34 anos de garantias de equilíbrio nas relações de consumo
-
Distrito Federal2 dias atrás
Inflação desacelera no DF em agosto
-
CLDF3 dias atrás
Mostra na CLDF conta histórias de crianças judias durante o Holocausto
-
GDF3 dias atrás
Segurança Pública institui Medalha Mulher Mais Segura
-
CLDF3 dias atrás
CLDF celebra Dia do Cerrado e 9 anos da encíclica Laudato Si’, nesta quarta (11)
-
Distrito Federal3 dias atrás
Agências do trabalhador têm 783 vagas de emprego nesta quarta-feira (11)
-
Justiça2 dias atrás
Eleições 2024: TSE lacra sistema que será usado em urnas
-
Distrito Federal2 dias atrás
Aberto novo processo seletivo para o IgesDF