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‘Foi inimigo número um das elites e do próprio imperador’, diz biógrafo de Luís Gama

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Com pseudônimo de Afro, o renomado advogado abolicionista fundou e foi editor-chefe de jornal intitulado Democracia

Apesar de ter nascido livre em 1830, Luís Gama teve que conquistar a própria liberdade após ter sido vendido pelo seu pai, um fidalgo português, quando tinha oito anos de idade. Esta foi apenas a primeira vitória que o intelectual, advogado, professor, poeta e abolicionista conquistou ao longo de sua vida.


Luís Gama garantiu por via judicial a liberação de, pelo menos, 750 pessoas.


Esta aptidão para interpretar as leis da época, somado à sua defesa pela democracia fizeram dele o “inimigo número um das elites imperiais e do próprio imperador”, afirma o historiador Bruno Rodrigues de Lima.

O pesquisador lançou recentemente o livro Luiz Gama contra o Império: A luta pelo direito no Brasil da Escravidão, publicado pela editora Contracorrente. A obra de mais de 600 páginas é uma adaptação e atualização da tese de doutorado do historiador.

Bruno Rodrigues de Lima defendeu seu trabalho na Faculdade de Direito da Johann Wolfgang Goethe-Universität Frankfurt am Main e lhe rendeu o prêmio Walter Kolb de melhor tese de doutorado da Universidade de Frankfurt e a medalha Otto Hahn de destaque científico da Sociedade Max Planck.

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Livro é uma adaptação da tese premiada de doutorado de Lima / Reprodução/Contracorrente

“É algo muito valioso, para quem pensa em um projeto de Brasil, pensar o projeto de Luís Gama. É um projeto abolicionista radical, sem concessões aos senhores, sem concessão e sem negociação, ou seja, é alguém que consegue ir à frente com uma bandeira tão difícil de ser levada à frente. E ele vai lá e leva a bandeira da abolição, da democracia, da terra, trabalho, direito para todos e todas”, comenta o pesquisador em entrevista ao programa Bem Viver desta terça-feira (14).

O pesquisador lembra que Gama também foi poeta, sendo o primeiro homem negro a publicar um livro deste gênero literário no país. Além disso, fundou e foi editor-chefe de um jornal intitulado Democracia. Lima comenta que por uma questão de segurança, Gama não assinava com seu próprio nome, mas com o pseudônimo Afro.

“Ele é o Afro, ele é um homem preto na São Paulo branca, e ele vai afirmar que a democracia dele é uma democracia sem pena de morte, é uma democracia socialista, palavra do gama antes da Comuna de Paris.”

Confira a entrevista na íntegra:

Brasil de Fato: No seu livro você demonstra como o Brasil do século 19 tinha leis que legitimavam a escravidão. No entanto, é usando destas leis que Luís Gama foi capaz de libertar mais de 750 pessoas. Como ele fez isso? Que tipo de truque, magia ou sagacidade ele tinha para furar o sistema usando as regras do próprio sistema?

Bruno Rodrigues de Lima: É um pouco de truque, um pouco de magia, um pouco de sagacidade. É Luiz Gama contra o Império.

O nome do livro sintetiza um pouco essa ideia de que ele tinha lado, sabia contra quem estava lutando, e tinha um profundo conhecimento do Império, das armas do Império, da estrutura do Império, de como ele funcionava. Por ter esse conhecimento é que ele sagazmente inventou um repertório de ferramentas para abrir caminhos de liberdade dentro do edifício escravista.

Brasil, você sabe, era a única sociedade escravista de soberania plena das Américas. Tinha escravidão em todos os cantos do Brasil, em todos os lugares. O Brasil tinha 20 províncias, tinha escravidão nas 20 províncias. O Brasil tinha 635 municípios, tinha gente escravizada nos 635 municípios. O Brasil tinha 1.449 paróquias, tinha gente escravizada em 1.442 paróquias.

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Tudo isso que eu estou dizendo é segundo os dados oficiais do Censo Demográfico de 1872, quando o Luiz Gama tinha 42 anos de idade.

Esse era o Brasil do Luiz Gama. Esse era o Império do Brasil: um império de cima a baixo, de norte a sul, leste a oeste, o império da escravidão.

Ele entende o direito, entende que a escravidão era justificada, amparada, chancelada pelo direito. Com essa compreensão, ele vai conseguindo abrir caminhos para garantir liberdade para mais de 750 pessoas, através do judiciário e outras estratégias processuais à margem do judiciário também.

É por tudo isso que 150 anos depois da existência de Luís Gama estamos aqui reunidos falando da história de luta pela liberdade no Brasil que ele protagoniza.

Ele não protagoniza no sentido de que ele individualmente se sobrepõe às demais lutas, não é nesse sentido, mas é no sentido de que ele compreende o seu tempo histórico, os valores que ele luta, a causa que ele encampa e organiza, o movimento abolicionista, quando nem movimento abolicionista tinha, e vai coletivamente liderar esse processo.

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É algo muito valioso, muito importante para quem pensa em um projeto de Brasil, pensar o projeto de Luís Gama, que é um projeto abolicionista radical, sem concessões aos senhores, sem concessão e sem negociação.

Ou seja, é alguém que consegue ir à frente com uma bandeira tão difícil de ser levada à frente, tão desigual eram as armas da época, tão desigual as forças forças e as correlações. Ele vai lá e leva a bandeira da abolição, da República, da democracia, da terra, trabalho, direito para todos e todas.

Isso quando o movimento abolicionista ainda nem existia.

Seu livro mostra como Luís Gama lutou contra o Império. Ele morreu antes que a República fosse declarada. No entanto, com mais de 100 anos de República, o Brasil segue reproduzindo práticas escravistas. Você acredita que Gama se desiludiria com a República brasileira?

Essa é a pergunta que eu me faço também, porque eu quero compreender esse Brasil, quero entender o que está acontecendo nele e faço isso lendo Luís Gama.

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Ver que a República tal qual proclamada e os arranjos de poderes que se sucedem nas primeiras décadas, pelo menos até Getúlio, e depois mesmo durante o período de Getúlio todos os golpes e contragolpes dessa metade do século 20 até chegar agora o pacto de 1988…. O Brasil é muito jovem.

Então, se a gente perguntar, os avós dos nossos avós são contemporâneos do Luz Gama, sabe? Está muito perto. Então, a própria República é um regime político recém proclamado. A gente tem um século e pouco…

Agora, o que eu quero dizer até que as mesmas famílias que estavam lá atrás, no judiciário, por exemplo, ou nas forças armadas, são as mesmas famílias em muitos oficiais de hoje, muitos juízes de hoje.

Se a gente analisar a linhagem familiar, vamos ver que o Brasil mudou muito pouco. Se há trabalho análogo à escravidão como há e pesado se formos pensar: Tocantins, Pará, ou o bairro do Brás, em São Paulo, ou bairros da zona central das grandes cidades, do Rio, Belo Horizonte…

Você tem coisa acontecendo que o Ministério Público nem sonha em investigar, que tem obrigação funcional de investigar.

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Luís Gama funda um jornal em 1867 chamado Democracia, uma palavra proibida de se enunciar no discurso político da época.

Luís Gama é aquele que vai plantar a semente da democracia no Brasil. Ele foi o redator-chefe desse jornal. Ele assina esse jornal com pseudônimo, porque não poderia assinar em nome próprio, senão o pescoço dele estaria ao alcance da milícia dos escravizadores, cafeicultores do interior paulista, por exemplo.

Mas não escondeu que era dele a autoria daquele jornal. Luís Gama vai afirmar e outras pessoas vão testemunhar que ele estava envolvido em projetos literários como o Democracia.

Lúcio de Mendonça vai dizer: “Eu conheci o Luiz Gama quando ele colaborava na imprensa com o pseudônimo Afro nos jornais de São Paulo”.

Gama não assinava em nome próprio, assinava como Afro, que é uma maneira de afirmar sem afirmar, de ocultar a autoria do nome próprio e ao mesmo tempo ele afirma a autoria.

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Ele é o Afro, ele é um homem preto na São Paulo branca, e ele vai afirmar que a democracia dele é uma democracia sem pena de morte, é uma democracia socialista, palavra do gama antes da Comuna de Paris.

É uma pena que a história do movimento operário brasileiro e do movimento camponês, por exemplo, saber só agora que Luís Gama lançou um jornal chamado Democracia, com um projeto de educação inovador, de ensino laico, de educação em massa, de obrigação do Estado investir em educação de todos e todas, de meninos e meninas, de todas as faixas etárias, um projeto de alfabetização de jovens e adultos.

Ele próprio foi um professor de educação de jovens e adultos, ele próprio alfabetizou centenas e centenas de pessoas. A gente está falando de 1867, 1868, 1869, muito antes da queda da monarquia e do fim de trabalho escravizado.

A gente teve um homem preto que se definiu definiu “democrata e socialista”, que pensou a república e que foi o alvo, foi o inimigo número um das elites imperiais e do próprio imperador. É por isso que a Luís Gama contra o Império.

A sua pergunta toca nesse ponto do título do livro… E por quê esse título? Porque Luís Gama estava de um lado, o Império estava de outro. Então, se o Luís Gama estivesse hoje aqui, que é a sua pergunta, não é muito difícil imaginar quais seriam suas bandeiras.

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É a bandeira da democracia, da abolição, incompleta, mambembe, capenga, esvaziada, deturpada, que o Gama certamente choraria o choro mais íntimo de sua alma e ao mesmo tempo, da indignação do revolucionário. Iria lutar para fazer a abolição acontecer.

Como é que acontece uma coisa como aconteceu em 1888 e leva 30 a 40 anos para que o preto pudesse entrar na escola, pudesse ter um ensino técnico e mais 30 a 40 para que entrasse nas universidades e mais quantos que vamos esperar até que eles entrem na magistratura?

Porque a magistratura do Brasil, as carreiras do Itamaraty, as carreiras militares de alta patente, as carreiras do judiciário, da defensoria pública, do Ministério Público, são ocupados por quem?

Nós sabemos, é estatístico, 98% são brancos. Então, o Gama não se surpreenderia com o Brasil que ele ia encontrar.

O Brasil mudou muito pouco. O Brasil, o regime de produção do Brasil de hoje, muda muito pouco do modelo de produção das grandes plantations de café do século 19.

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A própria elite brasileira, muito tacanha, acha que isso aqui é uma grande fazenda. O Gama denuncia isso.

O projeto do Gama é muito sério, é um projeto de democratizar tudo isso que eu falei agora: riqueza, educação, conhecimento, terra, e que o trabalho seja algo muito mais valorizado, digno. Trabalhador precisa ser melhor remunerado.

No lançamento do seu livro na Bahia, você esteve ao lado de Mateus Aleluia e falou para ele como via ideias de Luís Gama nas música dele. Isso tem a ver com as poesias que Luís Gama escrevia ou as ideias que defendia?

Luiz Gama jogava em todas as posições, de modo como você disse também, era um poeta, era um jornalista, e, sim, um herói nacional.

Mateus Aleluia é uma dessas raridades que dá no Brasil e que a gente tem que saber reconhecer e valorizar enquanto é tempo. Valorizar em vida.

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Mateus Aleluia tem 80 anos, é um homem que foi pra Luanda, foi pra Angola, que viu a vitória do movimento de libertação de Angola. Que estava lá na luta de Angola contra o apartheid da África do Sul, ele estava lá e tem uma compreensão do panafricanismo que dá chão na Bahia, que dá chão no Brasil, e o lugar do Brasil no mundo.

Então, numa música, por exemplo, que o Mateus Aleluia fala de um novo estágio da humanidade, um estágio de alguém que tem uma utopia de um Brasil, de um mundo, sem reis e sem escravos como o Luiz Gama diria, sem patrões e sem subordinados, o Matheus Aleluia está pensando o Brasil de amanhã, um Brasil que é uma utopia, mas é essa utopia que faz a gente sonhar.

Ele vai falar de que a gente precisa de um líder popular, de alguém que pense o Brasil, que seja pragmático como [Nelson] Mandela, que traga poesia e independência como Leopold Cedarsan Singor, que tenha um sonho como Luther King e que seja um herói como Zumbi [dos Palmares].

Ele tem uma música que fala exatamente disso, que é Homem, o Animal que Fala. E eu, dialogando com ele, eu falei: “Olha, Mestre Mateus Aleluia, eu acho que esse ser humano que reúne essas qualidades de trazer poesia, independência, que lute pragmaticamente por um futuro melhor, e que tenha um sonho ao mesmo tempo uma utopia, esse homem é um Luís Gama”.

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Biografia

José Vicente: do inconformismo do racismo à criação da Universidade Zumbi dos Palmares

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Fundador e reitor da Zumbi destaca que a criação da instituição foi e continua importante na institucionalização das cotas para negros e outras ações afirmativas. Ele é a personalidade homenageada do 18º Prêmio Top Educação

Oriundo de família rural e nascido em Marília, SP, o então entregador de biscoitos José Vicente se tornou advogado e doutor em educação. Há quase 30 anos é uma das pessoas mais atuantes na quebra do racismo estrutural e das desigualdades brasileiras. Os feitos de seus trabalhos têm gerado resultados expressivos. Um de seus marcos é a criação, em 2001, da Universidade Zumbi dos Palmares, na cidade de SP, o qual é o reitor (o primeiro vestibular veio em 2003).

É por conta da criação da Zumbi e de muitos outros trabalhos de impacto social que José Vicente é a personalidade homenageada do 18º Prêmio Top Educação* (saiba mais no final da entrevista), da revista Educação.

Confira, a seguir, a entrevista com José, que é colunista em grandes veículos jornalísticos e membro de conselhos renomados, incluindo o conselho editorial da revista Ensino Superior.

José Vicente

José Vicente é a personalidade homenageada do 18º Prêmio Top Educação (Foto: divulgação)

O que te levou a fundar a Universidade Zumbi dos Palmares?

Foi a constatação e o inconformismo da exclusão do negro do ensino superior público e privado e a total ausência de qualquer tipo de debate do impacto da discriminação e do racismo nos ambientes educacionais em São Paulo e no Brasil. Na época da fundação da Zumbi dos Palmares, por exemplo, os negros representavam 2% do corpo discente da Universidade de São Paulo (USP).

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A criação da Universidade Zumbi dos Palmares foi o ponto de disrupção na condução dessas agendas no nosso país.

Criada em 2001, registrada em 2002 e com seu primeiro vestibular em 2003, a Zumbi é a primeira e ainda única universidade negra do país e da América do Sul. 

Foi a partir da sua constituição e experiência que as demais instituições e governo se encorajaram na institucionalização das cotas para negros e outras ações afirmativas. Nos seus 20 anos de existência, a Zumbi foi importantíssima na sustentação e consolidação do processo das ações afirmativas, nas universidades, governos, nas instituições da sociedade civil e na arregimentação e sensibilização do ambiente corporativo público e privado.

A Zumbi foi a criadora da Iniciativa Empresarial pela Igualdade Racial, o mais importante movimento empresarial de combate à discriminação no mercado corporativo, envolvendo mais de 100 empresas e instituições nessa ação. Criou também o Fórum Internacional de Equidade Racial Empresarial, o Índice de Equidade Racial Empresarial, e o primeiro Curso de Formação de Conselheiros Negros Empresariais das Américas.

Nessas duas décadas de história, como avalia o trabalho da Zumbi na inclusão da população negra no ensino superior e no mercado de trabalho?

Tendo iniciado suas atividades com o curso de administração, em 2004, ao longo da sua trajetória a Universidade Zumbi dos Palmares formou e qualificou mais de 10 mil jovens negros nos seus cursos de graduação, pós-graduação, extensão e nos cursos técnicos e livres. Com a implantação do Colégio Técnico Dandara dos Palmares, da Unibella (Universidade da Beleza), Unisamba (Universidade do Samba) e da Afrosênior (Universidade da terceira idade) e os Climáticos, a Zumbi, além de cumprir integralmente sua missão de promover inclusão, formação e qualificação dos jovens negros na educação e no ensino superior, oportuniza a toda a sociedade o acesso à educação e ao conhecimento, à preparação e à inclusão no mercado de trabalho, à inclusão produtiva, ao acesso cultural e esportivo e ao meio ambiente protegido e sustentável.

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O que a Sociedade Afro-Brasileira de Desenvolvimento Sociocultural (Afrobrás), criada por você em 1997, tem feito?  

A Afrobrás é o organismo social instituidor de todas as ações estruturantes dessa agenda de empoderamento e fortalecimento do negro brasileiro. Ela criou e instituiu a Universidade Zumbi dos Palmares, a Iniciativa Empresarial pela Igualdade Racial, o Colégio Técnico Dandara dos Palmares, o Museu da História do Negro, a Virada da Consciência Negra, o Troféu Raça Negra, o Programa Televisivo Negros Em Foco, a FlinkSammpa — Festa Internacional da Literatura Negra, a Corrida da Consciência, o Concurso Estudantil Afrominuto. Além disso, realiza as ações de advocacy perante os governos, campanhas e movimentos de transformação social como a Campanha Cotas Sim, Movimento Ar: Nós Queremos Respirar, Movimento Racismo Zero, o Procon Racial, o Serviço Acolhe de Proteção ao Consumidor. As grandes ações de afirmação da negritude desde as cotas nas universidades, no serviço público, no mercado de trabalho, no congresso e nos veículos de comunicação, têm o protagonismo ou a participação relevante da Afrobrás.

Em parceria com a prefeitura, a Universidade Zumbi dos Palmares também integra o projeto do Museu da História do Negro, em São Paulo, SP. Qual a importância de se criar esses espaços? 

De forma injustificada e incompreensiva, o país que escravizou os negros por quase 400 anos nunca se interessou ou se preocupou em inventariar esse histórico que compõe a trajetória histórica e evolutiva do país. 

As contribuições dos negros para a formação do país e da sua cultura constituiu um legado de incomensurável valor e integra a própria essência do povo brasileiro. Ainda assim, não existe um equipamento museológico constituído com esse propósito. Não existe um Museu Nacional da Escravidão num país que escravizou mais de cinco milhões de pessoas por mais de 350 anos.

Por esses motivos entendemos que uma maneira assertiva e de grande valor para a celebração dos nossos 20 anos [da universidade], seria dotar nosso país do primeiro museu com essa finalidade e propósito. Assim, em parceria com a prefeitura e com o governo do estado, esse ano estaremos dando início à construção do Museu da História do Negro de São Paulo que, além de peças e documentos, contará com um centro cultural para proporcionar o convívio, a integração e o reforço da identidade e da cultura negra com exposições, biblioteca, cinemateca, cursos e exibições de arte, dança, cinema, música e teatro.

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Devido ao racismo estrutural, o Anuário da Educação Básica e outros estudos constatam que, no ensino básico, o índice de aprendizagem em português e matemática de estudantes negros(as) é menor do que de estudantes brancos(as). Quais parcerias e ações são necessárias para diminuirmos/quebrarmos essa realidade inaceitável?  

A ação mais imediata e profunda para combater a desigualdade entre negros e brancos precisa e tem que estar no espaço [escolar] e equipamentos educacionais. Ali existe um abismo que separa negros e brancos no acesso e no desenvolvimento igualitário de suas competências e habilidades educacionais, sociais e emocionais.

Seja por conta da discriminação e hostilidade dos ambientes educacionais, seja por conta da indiferença e despreparo para tratar as diversas facetas que impactam mais intensivamente os jovens negros e periféricos, os resultados finais do processo educativo sempre irão ter distorções e desiquilíbrios entre estudantes negros e brancos.

Dessa forma é indispensável que o governo, escolas e sociedade juntem esforços para enfrentar esse grande desafio. As escolas podem formar e qualificar os professores para implementarem a Lei da História do Negro e da África, por exemplo. As universidades podem fortalecer essas dimensões na formação dos futuros professores, bem como produzir estudos e pesquisas dirigidas para conhecer e desenvolver estratégias e tecnologias de superação. A sociedade pode fortalecer o debate sobre a importância de enfrentar e combater o racismo. O Congresso pode produzir e aprimorar leis para combater o racismo e fortalecer as ações afirmativas. E o governo pode construir e ampliar políticas públicas e medidas dirigidas para fortalecer o conjunto das ações em andamento.

*Prêmio Top Educação

Em sua 18ª edição, o Top é uma votação espontânea na internet realizada pela revista Educação e tem como objetivo apontar as marcas mais lembradas entre as empresas que atuam na área de educação (conheça as marcas vencedoras). Desde o ano passado, a equipe editorial da revista Educação homenageia uma entidade e uma personalidade que tem impactado o setor.

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Este ano, além de José Vicente ser a personalidade homenageada, a entidade homenageada é a Fundação Itaú. Clique aqui para ler.

Em 2023, a personalidade homenageada foi Mozart Neves Ramos, titular da Cátedra Sérgio Henrique Ferreira, do IEA da USP e secretário de Educação do Estado de Pernambuco (2003-2007). Clique aqui para saber mais.

Já o Instituto Ayrton Senna foi a entidade homenageada do ano passado devido ao esforço de disseminar há pelo menos 10 anos aos educadores e educadoras do país o que são habilidades socioemocionais e como inseri-las nos espaços de aprendizagem. Clique aqui para saber mais.


Fonte: Revista Educação

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Biografia

Novo herói da pátria, André Rebouças deixou legado antirracista

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© Fernando Frazão/Agência Brasil

Engenheiro negro foi um nome importante do abolicionismo brasileiro

Quando se pensa em engenharia, uma obra de qualidade é aquela estruturalmente forte e estável, capaz de resistir aos efeitos do tempo. Esse critério bastaria para qualificar o engenheiro negro André Rebouças (1838-1898) como um dos nomes mais importantes do país.

Mas a obra dele vai além de pontes, docas, estradas de ferro e sistemas hídricos. Ele se destacou como um intelectual crítico, abolicionista, que viajou pelo mundo colhendo experiências em sociedades segregadas e projetou um Brasil onde todos pudessem ser iguais, sem distinções raciais.

O currículo credenciou André Rebouças a ser reconhecido oficialmente nesta semana como um “herói da pátria”, o que lhe garantirá um espaço no livro que reúne as principais personalidades do país.

Historiadores ouvidos pela reportagem da Agência Brasil celebraram a inclusão de Rebouças no documento. Em primeiro lugar, por entenderem que o engenheiro precisa ser mais conhecido no Brasil. Em segundo, por um resgate e revisão de sua memória, alvo de críticas por ter apoiado Dom Pedro II.


“Embora seja um reconhecimento tardio, essa inclusão no livro de heróis vem corrigir a imagem de André Rebouças como um monarquista que desistiu do país e fez um autoexílio, ao sair junto com a família imperial no fim do Segundo Reinado. Ele sai por entender que a República nasce de um movimento revanchista, de uma elite escravocrata, que não aceitou o fim da escravidão sem indenização no Brasil. E a gente teve desdobramentos muito ruins para a projeção dessa figura histórica. Tenho certeza que ajuda, em parte a corrigir isso. Existe ainda todo um trabalho a ser feito de recuperação dessa memória”, avalia Antonio Carlos Higino da Silva, historiador e autor dos livros André Rebouças no Divã de Frantz Fanon.

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“A inclusão dele no livro é um fato muito importante, porque durante muito tempo o documento só tinha a presença de heróis brancos e excluía outros grupos sociais, como negros, indígenas e mulheres. E é um passo importante nesse processo de revisão histórica, em que aqueles antes excluídos ou apresentados como passivos ou coadjuvantes da história do Brasil, agora são vistos como protagonistas e agentes históricos potentes de transformação dos 500 anos de história do nosso país”, diz o historiador Jorge Santana, professor do Instituto Federal do Paraná.

Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria

O primeiro passo é entender do que se trata o Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria. Ele foi criado em 1992 e reúne personalidades do tidas como “protagonistas da liberdade e da democracia”, por terem dedicado parte da vida ao país. A obra também é conhecida com Livro de Aço, por ser feita com páginas desse material, e fica no Panteão da Pátria, na Praça dos Três Poderes, em Brasília.

A inscrição de um novo personagem depende de lei aprovada no Congresso. Entre os heróis e heroínas brasileiros, estão Tiradentes, Anita Garibaldi, Chico Mendes, Zumbi dos Palmares, Machado de Assis, Santos Dumont, Luís Gama e Joaquim Nabuco.

A Lei nº 15.003 , que oficializa a homenagem a André Rebouças, foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e publicada nesta quinta-feira, 17 de outubro, no Diário Oficial da União. As ministras Macaé Evaristo (Direitos Humanos) e Anielle Franco (Igualdade Racial), além do ministro Ricardo Lewandowski (Justiça e Segurança Pública) também assinam a medida.

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Biografia de Rebouças

André Pinto Rebouças nasceu no município de Cachoeira, na Bahia, em 3 de janeiro de 1838. Era filho de Antônio Pereira Rebouças e Carolina Pinto Rebouças. O pai, filho de ex-escravizada e de um homem branco, foi um advogado autodidata, deputado pela província da Bahia e conselheiro do imperador Dom Pedro I.

A família Rebouças veio para o Rio de Janeiro em 1846. André e o irmão Antônio, aos 15 e 16 anos, ingressaram na Escola Militar (precursora da Escola Politécnica) e formaram-se engenheiros militares em 1860. Depois de uma viagem pela Europa, (1861-1862) voltaram ao Brasil em 1863 e ficaram responsáveis por reformas nas fortalezas de Santos até Santa Catarina. Em 1864, André projetou o novo porto do Maranhão.

André participou da Guerra do Paraguai, entre 1865 e 1866, no batalhão dos engenheiros e retornou ao Rio de Janeiro por motivo de saúde. Participou das obras do porto da cidade, foi diretor das obras das novas Docas da Alfândega (na atual praça XV) e responsável pela construção das Docas de Pedro II (ao lado do Cais do Valongo).


“Esse armazém é uma grande fonte de inspiração e deve ser pensado como referência de resistência negra. O projeto é todo pensado pelo André Rebouças, em que ele se esforçou em não ter mão de obra escravizada, em constituir proteção social para os seus trabalhadores. Rebouças foi ao encontro de um projeto moderno, de um porto industrial, trazendo referências de um engajamento político e social importante”, diz o historiador Antonio Carlos Higino.


Rebouças nunca foi escravizado, pertencia a uma classe média negra e era protegido por uma rede de amigos poderosos, como a própria família imperial. Talvez isso explique um pouco o porquê de ter demorado a se colocar publicamente como um homem negro e abolicionista. Isso começou a mudar a partir da década de 1870. As viagens para a Europa e para os Estados Unidos, onde presenciou exemplos mais visíveis de discriminação e apartheid racial, foram fundamentais para impactar os projetos políticos e a subjetividade de Rebouças.

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Na década de 1880, passa a atuar ativamente no Brasil em projetos contra a escravidão. Foi um dos criadores da Sociedade Brasileira contra a Escravidão, junto com Joaquim Nabuco e José do Patrocínio, em 1880. E participou da Confederação Abolicionista (1883) e da Sociedade Central de Imigração (1883).


“Os mais sanhudos escravocratas confessam hoje publicamente: — a escravidão é um cancro. Já não há mais quem ouse negar que a escravidão é a gangrena nacional; que é a causa primária de todas as misérias e vergonhas que afligem este império; que é o obstáculo máximo à imigração, ao progresso da agricultora, da indústria e do comércio no Brasil”, escreveu Rebouças no texto de abertura do folheto “Abolição immediata e sem indemnisação”, publicado em 1883.


Monarquista, por considerar que o republicanismo brasileiro era liderado por antigos senhores de escravizados, Rebouças partiu para o exílio em 1889 junto com a família imperial. Depois da morte de Dom Pedro II em 1891, partiu para a África, para trabalhar e ajudar no desenvolvimento do continente. Foi nesse período que Rebouças passou a ver a África como “terra de origem” e a se declarar como homem negro, meio brasileiro e meio africano. Mas decepcionou-se com as dificuldades encontradas, como a pobreza decorrente da exploração de nações europeias. Morreu em Funchal, Portugal, em 9 de maio de 1898, em circunstâncias incertas, tendo sido encontrado no pé de um precipício, aos 60 anos.

Como legado para a realidade social dos negros pelo mundo, deixou textos e análises críticas, focados na construção de um país mais igualitário.


“O André Rebouças apontava como principal preocupação o 14 de Maio, ou seja, o dia seguinte à abolição. O que teria de ser feito, como a distribuição de terras, uma reforma agrária, para que os ex-escravizados pudessem ter um meio de sustento, de sobrevivência, e pudessem ser integrados à vida econômica do país”, diz o historiador Jorge Santana.

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“Ao fim movimento abolicionista e a libertação dos escravizados, André Rebouças propôs para o orçamento do ano de 1890 um aporte, parte dos recursos de orçamento, para investimento nas pessoas libertas. Ele pensou o Brasil do futuro, da proteção social, escolarização, estradas, portos, tudo que poderia esse país um lugar moderno e melhor. Ele é uma grande referência para os que querem um Brasil melhor e mais unido”, diz o historiador Antonio Carlos Higino.

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Fato Novo com informações e imagens: Agência Brasília

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Biografia

CLDF concede o título de Cidadão Honorário de Brasília ao ministro do STF, Cristiano Zanin

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Cristiano Zanin Martins - Foto: Carlos Moura/STF

Deputados Welligton Luiz (MDB) e Hermeto (MDB) são os autores da homenagem

Na próxima segunda-feira (21), às 19h, a Câmara Legislativa do Distrito Federal outorga o título de Cidadão Honorário de Brasília ao ministro do Supremo Tribunal Federal, Cristiano Zanin Martins, em sessão solene no plenário, com transmissão ao vivo pela TV Distrital (canal 9.3) e YouTube.
Os autores da homenagem, deputados Welligton Luiz (MDB) e Hermeto (MDB), destacam as contribuições do jurista e magistrado à sociedade brasileira.

Os parlamentares salientam a carreira de Zanin. Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), com especialização em direito processual civil pela mesma universidade, Zanin exerceu a advocacia de 2000 a 2023, e ganhou notoriedade por sua atuação como advogado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva nos processos da Operação Lava Jato. Ele foi empossado como ministro do STF em agosto de 2023.

Foram convidados para a sessão solene autoridades dos três poderes, em âmbito local e federal.


*Agência CLDF

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