Fundo de Apoio à Cultura promove acesso artístico em todas as regiões administrativas da capital, celebrando a diversidade cultural do Cerrado
O Fundo de Apoio à Cultura (FAC) ajuda a cena artística do Distrito Federal a ir além – além do Plano Piloto, com projetos que buscam descentralizar e democratizar o acesso à arte em áreas periféricas; além da ideia de que Brasília é a capital do rock, mas também da música popular brasileira (MPB); e, neste ano, além dos próprios limites, com o Governo do Distrito Federal (GDF) investindo R$ 82 milhões em projetos culturais. Este é o maior valor já pago, se considerado os editais anuais, sem saldos remanescentes, conforme explica o subsecretário de Fomento e Incentivo Cultural (Sufic), José Carlos Prestes.
“Em 2024, conseguimos destinar um investimento de R$ 82 milhões em projetos culturais, sendo R$ 78 milhões em editais ordinários e outros R$ 4 milhões em premiações. Esse foi o maior valor para um ano corrente”, destaca.
As propostas selecionadas pretendem contemplar todas as regiões administrativas do DF para que a população tenha acesso às mais diferentes manifestações artísticas. Se considerados os valores remanescentes, ou seja, de editais anteriores, o maior investimento ocorreu em 2021, quando foram repassados R$ 155 milhões a propostas culturais.
“O FAC é o maior fundo estadual de cultura do país. O objetivo é permitir que a população tenha acesso a bens culturais. Esses projetos têm sido acessados por pessoas de diferentes regiões administrativas. Nós temos descentralizado essas ações culturais, para que toda a população possa acompanhar a produção artística da cidade”, diz Prestes.
“Graças ao FAC, nós já levamos o teatro a mais de 10 mil espectadores. E o Fundo não é só para nós, artistas. É um retorno para a sociedade, é do povo”, destaca Alana Ferrigno, fundadora da Estupenda Trupe
Um dos projetos que busca democratizar o acesso à cultura é do grupo Estupenda Trupe que, há 19 anos, se dedica a desenvolver espetáculos, cursos teatrais e projetos sociais para pessoas de regiões periféricas. Fundado e produzido por Alana Ferrigno, 37 anos, o elenco lançou, em outubro, o espetáculo Respeitável Público, uma celebração ao teatro. O projeto recebeu um incentivo de R$ 200 mil. A primeira apresentação será feita em Ceilândia.
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“Graças ao FAC, nós já levamos o teatro a mais de 10 mil espectadores. E o Fundo não é só para nós, artistas. É um retorno para a sociedade, é do povo. É uma entrega à sociedade. Nós temos como missão ampliar o acesso à arte e à educação. É preciso democratizar a cultura por meio de medidas sociais”, ressalta Alana.
Segundo a Secretaria de Cultura, o FAC incentiva uma média de dois mil projetos artísticos por ano. As produções vão desde propostas voltadas ao mundo da música e do cinema, até ideias relacionadas a arte plástica, dança e cultura popular. O fundo também está presente em projetos literários, como é o caso do livro Clodo, Climério e Clésio: a profissão do sonho, da jornalista e produtora cultural Dea Barbosa, 71, que será lançado em dezembro.
Com um incentivo de R$ 60 mil, a obra conta a trajetória de três irmãos piauienses que fizeram história em Brasília na década de 1970, quando se destacaram no cenário musical e se tornaram elementos importantes para a MPB. Um dos sucessos interpretados por Fagner, a música Revelação, é de autoria do Clodo e Clésio. Além disso, a única música composta por Nara Leão, em parceria com Fagner e Fausto Nilo, foi em homenagem ao trio, chamada Cli-Clé-Clô.
Em Brasília, os irmãos contribuíram para a formação do cenário musical brasiliense para além do rock, que fazia sucesso na capital na mesma época. Por meio da MPB, o grupo compôs músicas de grande sucesso que foram gravadas por grandes nomes da música brasileira, como Nara Leão, Milton Nascimento, Angela Maria, Ney Matogrosso, Zizi Possi, Fafá de Belém e Elba Ramalho.
“O registro desse trabalho vai deixar uma grande contribuição para a memória musical da capital. Isso tudo não teria sido feito sem o FAC. No fim, será um material de acervo, de patrimônio. Todo mundo diz que Brasília é referência do rock nacional, mas a cidade também tem muita MPB, e poucos sabem disso. Eles foram essenciais na construção da MPB e o FAC foi essencial para a produção desse projeto”, pontua Dea.
Espaço recebe exibição do documentário ‘Black Rio! Black Power!’, seguida de debate com diretor, nesta terça (19); na quarta (20), será promovida uma masterclass sobre a obra
O Cine Brasília preparou uma programação especial para marcar o Dia da Consciência Negra. Nesta terça (19) e quarta-feira (20), o espaço promoverá, em parceria com o Instituto Afrolatinas, exibição de filme seguida de debate e uma marterclass. As atividades especiais são gratuitas.
Na terça, a partir das 17h, o público poderá conferir o Baile de Passinho, que servirá de aquecimento para a exibição do documentário Black Rio! Black Power!, marcada para as 19h. O longa do diretor carioca Emílio Domingos narra a história e a repercussão do movimento Black Rio, que marcou a cena cultural fluminense entre as décadas de 1970 e 1980. Logo na sequência, a partir das 20h30, o próprio diretor participa de um debate sobre a obra.
No Dia da Consciência Negra (20), Emílio ministrará a masterclass Black Rio! Black Power!: O documentário como construção de memória. A aula será das 10h às 12h e as inscrições já foram encerradas.
Sessão atípica e ‘Ainda estou aqui’
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O feriado terá ainda duas sessões atípicas, voltadas para pessoas autistas e neurodivergentes, com luzes acesas, volume do som reduzido e ar-condicionado desligado. Às 10h, será exibido Perfekta — Uma aventura da escola de gênios. Já às 14h será a vez de Robô selvagem. Os ingressos para a Sessão Atípica têm valor único de R$ 10 e podem ser adquiridos na bilheteria do Cine Brasília ou pelo site.
Já o público que quiser conferir o representante brasileiro na disputa por uma vaga no Oscar deste ano pode fazê-lo nesta terça-feira. O longa Ainda estou aqui, do diretor Walter Salles, com Fernanda Torres e Selton Mello, será exibido às 14h e às 16h30. Os ingressos custam R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia) e também podem ser adquiridos na bilheteria ou na internet.
Confira a programação:
Terça-feira (19)
10h — Perekta – Uma aventura da escola de gênios
14h — Ainda estou aqui
16h30 — Ainda estou aqui
19h — Sessão Especial Dia da Consciência Negra – Black Rio! Black Power! + debate
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Quarta-feira (20)
10h — Sessão Atípica – Perekta – Uma aventura da escola de gênios
14h — Sessão Atípica – Robô Selvagem
19h30 — 14ª Mostra Cinema e Direitos Humanos.
Estudantes da rede pública do DF participaram de palestra com o cantor Toni Garrido; programação da noite inclui Ellen Oléria, Marcelo Falcão e Nação Zumbi
Teve início nesta segunda-feira (18) o Festival Consciência Negra, dedicado à valorização da cultura afro-brasileira. O evento, que terá três dias, apresenta palestras, oficinas, gastronomia, moda e música. Toda a programação está concentrada na Torre de TV. Nesta manhã, alunos da rede pública de ensino do Distrito Federal participaram de uma palestra sobre afrocultura com o cantor Toni Garrido.
A festividade é promovida pelas secretarias de Justiça e Cidadania (Sejus-DF) e de Cultura e Economia Criativa (Secec-DF), contando com o apoio da Associação de Educação, Cultura e Economia Criativa (Aecec), do Serviço Social do Comércio (Sesc) e do Ministério do Turismo. O investimento total no evento é de cerca de R$ 7 milhões.
Na abertura do festival, o titular da Secec-DF, Claudio Abrantes, ressaltou a importância de o evento ser promovido no coração de Brasília. Segundo ele, a festividade deve integrar o calendário oficial de eventos do DF e se tornar uma política pública cultural permanente.
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“É uma oportunidade única que temos para quebrar preconceitos e combater o racismo, mas principalmente para celebrar a negritude que existe no nosso país”, declarou o gestor. “Temos feito um trabalho muito forte pela arte e pela cultura, porque esses meios, na verdade, são canais.”
Debate pontual
“Esse evento vem mostrar a cultura negra do DF, que é forte e potente”
Juvenal Araújo, subsecretário de Políticas de Direitos Humanos e de Igualdade Social
Subsecretário de Políticas de Direitos Humanos e de Igualdade Racial, Juvenal Araújo chamou atenção para a composição da população da capital brasileira – segundo levantamento elaborado pelo Instituto de Pesquisa e Estatística do Distrito Federal (IPEDF), 58% dos habitantes de Brasília são negros. “Esse evento vem mostrar a cultura negra do DF, que é forte e potente”, enfatizou Araújo. “Nós estamos felizes de poder mostrar o quanto Brasília tem de herança e fortalecer a população negra”.
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Maria Eduarda Silva Santos, 16, é aluna do Centro Educacional do Lago Norte e participou da palestra sobre afrocultura. “É bom voltarmos ao passado para, no futuro, viver algo melhor”, avaliou. “Eu me sinto muito representada ao ver esse debate acontecendo. Faz com que nós, negros, fortaleçamos nossa autoimagem”. Colega de escola de Maria, Geovanna Martins de Assis, 17, complementa: “Esse debate é muito importante. A sociedade é parte do problema e parte da solução”.
Programação
Entre os artistas confirmados para as festividades, estão Ellen Oléria, Marcelo Falcão e Nação Zumbi, que sobem ao palco montado em frente à Torre de TV já nesta segunda. Na terça (19), será a vez, entre outros, de Dhi Ribeiro, Seu Jorge e Raça Negra. Já a quarta-feira (20) terá apresentações de Olodum, Vanessa da Mata e Tribo da Periferia. Os shows são gratuitos, mas é preciso retirar o ingresso antecipadamente na plataforma Sympla.
Além das atrações musicais, o Festival Consciência Negra terá palestras com personalidades nacionais – como o rapper MV Bill -, venda de pratos assinados pelo chef Edilson Oliveira e de doces e sucos feitos por comunidades quilombolas e ainda uma feira, a Afro Brasília, onde serão comercializados produtos feitos por artesãos e empreendedores afro-brasileiros e peças de moda afro.
As crianças também terão vez, com peças teatrais, contação de histórias, atividades pedagógicas e brinquedos infláveis. Estudantes da rede pública participarão de ações como aulas de dança, capoeira e hip-hop. Nos três dias, as atividades começam às 9h.
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A iniciativa tem como objetivo não apenas celebrar a cultura e as contribuições da população negra ao Brasil, mas também promover o debate sobre temas essenciais como igualdade racial, justiça social e combate ao racismo.
Confira, abaixo, a programação completa.
Segunda-feira (18)
⇒ 9h às 9h30 – abertura
⇒ 10h às 11h30 – Palestra com MV Bill
⇒ 12h às 14h – DJ Hool Ramos
⇒ 14h às 14h40 – Visita escolar guiada
⇒ 14h40 às 16h40 – Oficina de dança Mãe África
⇒ 17h às 17h45 – Show Afoxé Ogum Pá
⇒ 18h às 18h45 – Filhos de Dona Maria
⇒ 19h às 19h45 – Show Patakori + Folha Seca
⇒ 20h às 21h – Ellen Oléria
⇒ 21h30 às 22h30 – Marcelo Falcão
⇒ 23h – Nação Zumbi
Terça (19)
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⇒ 9h às 9h30 – Visita escolar guiada
⇒ 9h40 às 11h40 – Oficina de breaking dance
⇒ 12h às 14h – DJ Alhoca
⇒ 14h às 14h30 – Visita escolar guiada – Bianca Tur Negro
⇒ 14h40 às 15h40 – Oficina de DJ com Arte Urbana – Fab Gril
⇒ 16h às 17h – Desfile da Beleza Negra
⇒ 17h às 17h45 – Nego De
⇒ 18h às 18h45 – Laady B
⇒ 19h às 19h45 – Julia Moreno
⇒ 19h30 às 20h30 – Dhi Ribeiro
⇒ 22h às 23h30 – Raça Negra
⇒ 0h – Seu Jorge
Quarta (20)
⇒ 10h às 23h – Visitação aberta
⇒ 10h às 12h – Encontro de B-Boys
⇒ 12h30 às 13h15 – Cirurgia Moral
⇒ 13h30 às 14h – DJ Odara
⇒ 14h às 15h – Francisco Pessanha
⇒ 15h às 15h45 – Tropa de Elite
⇒ 16h às 17h – Roda de capoeira
⇒ 17h às 17h45 – Show Marvin
⇒ 18h às 19h – Olodum
⇒ 19h30 às 20h30 – Vanessa da Mata
⇒ 21h – Tribo da Periferia.
Mistura de esporte, dança e arte marcial cresceu marginalizada nos quilombos brasileiros e ganhou adeptos em todo o mundo
Uma das expressões culturais mais importantes do Brasil, a capoeira é uma mistura de arte marcial e dança, desempenhada ao som de instrumentos de percussão e de um coral responsivo. Dois lutadores dançam em uma arena circular, a roda, acompanhando o ritmo da música. Lançando movimentos um sobre o outro, eles esperam o momento ideal — aquele em que o adversário baixa sua guarda e se expõe a um ataque. Na capoeira, os golpes são rápidos e letais.
Assim como muitas outras danças latinas, como a salsa (Cuba), o merengue (República Dominicana), o calipso (Trinidad e Tobago) e o frevo (Brasil), a capoeira tem origem afro-americana. Em nosso país, ela foi desenvolvida por pessoas escravizadas durante a era colonial e cresceu em popularidade ao longo do século 20, tornando-se uma das nossas tradições mais populares mundo afora.
Capoeira — brasileira ou africana?
A origem da capoeira é, de certa forma, controversa. Em seu artigo “A manifestação corporal capoeira: uma cultura nacional brasileira”, o professor e mestre capoeirista Bruno Nascimento Alleoni conta que não há consenso entre os pesquisadores se a capoeira, de fato, surgiu no continente africano ou se foi criada pelos escravizados aqui no Brasil.
Alleoni traz citações de pesquisadores para demonstrar isso. O autor Lamartine P. Costa afirma, por exemplo, que ”a forma primitiva da capoeira chegou no Brasil com os negros bantus, originários da África Ocidental”. Já o autor Gladson de Oliveira Silva afirma que “não há no continente africano e nos outros países influenciados pela etnia negra nenhuma expressão da Capoeira e que, portanto, ela foi criada em solo brasileiro”.
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“Dizer que a Capoeira é africana porque os africanos já dançavam o N’Golo (ou Kisema) ou que já lutavam a Bassúla ou a Kambangula é reduzir a Capoeira a uma forma limitada de expressão corporal, seja à dança ou à luta. Esquece-se, portanto, que a união destas e de outras expressões corporais mais a musicalidade e mais o toque de instrumentos musicais é que completam a arte da Capoeira”, afirma o próprio Alleoni.
Seja como for, é fato que a capoeira se desenvolveu no Brasil a partir da população negra escravizada. Ao longo do Brasil colônia (1500-1815) e até o final do século 19, cerca de 4 milhões de pessoas foram trazidas ao nosso país para serem vendidas e trabalharem forçosamente. A maioria veio de países do lado ocidental da África, como Angola e Congo.
Muitos escravizados, revoltosos com as condições desumanas a que eram submetidos, fugiam e criavam suas próprias comunidades, os quilombos. “Quilombo” é uma palavra do idioma quimbundo, uma língua africana falada na região de Angola, e significa “local de descanso”. Nesses lugares, além de cultivarem sua liberdade, os quilombolas também podiam desenvolver e expressar sua cultura sem medo de represálias — nas fazendas, a expressão corporal era proibida. Foi assim que a capoeira se desenvolveu, praticada por pessoas que, muitas vezes, vinham de contextos culturais muito diferentes e nem sequer falavam a mesma língua.
O termo “capoeira” vem do tupi: “ka’a” significa “mata” e “puêra” significa “o que foi”. Já desde o século 16, era usado para descrever as matas ao redor das fazendas. Os escravizados fugidos acabaram sendo também chamados de “capoeiras” e considerados foras da lei. Foi só muitos anos mais tarde, no século 18, que a palavra passou a nomear a mistura de dança e arte que eles praticavam.
Capoeira Angola e capoeira regional
A história da capoeira tem dois nomes principais: Vicente Ferreira Pastinha, o Mestre Pastinha (1889 a 1991), e Manuel dos Reis Machado, o Mestre Bimba (1900 a 1974). Pastinha foi expoente da capoeira Angola, mais focada em aspectos tradicionais e espirituais. A capoeira Angola tem movimentos mais lentos e próximos ao chão, maior uso de malícia (no sentido de ilusão, picardia) e muita teatralidade.
Mestre Bimba criou a capoeira regional, mais próxima das outras artes marciais. Ela é caracterizada por ser mais rápida e dinâmica, com o aspecto de disputa se sobrepondo ao de ritual. “Em 1928, eu criei, completa, a Regional, que é o batuque misturado com a Angola, com mais golpes, uma verdadeira luta, boa para o físico e para a mente”, disse Bimba ao autor Raimundo Cesar Alves para o livro A Saga do Mestre Bimba. De forma geral, a capoeira regional tem mais adeptos e é mais praticada no Brasil.
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A partir de 1930, Getúlio Vargas, buscando apoio popular, passou a permitir a capoeira (antes proibida), que cresceu em influência no Brasil, principalmente no Rio de Janeiro e na Bahia. Em 1932, Mestre Bimba abriu a primeira escola formal, que ainda chamava a prática de “luta regional”. E, em 1972, a capoeira foi finalmente reconhecida como esporte.