Ao longo de 38 anos de trabalho na Secretaria de Educação do DF, o professor José Gadelha contribuiu para formação de centenas de estudantes no Centro de Ensino Médio 9 de Ceilândia
O professor José Gadelha Loureiro, 67 anos, é um historiador com raízes fincadas na filosofia e na sociologia. Ao longo de 38 anos de trabalho na Secretaria de Educação do DF, formou uma legião de estudantes também comprometidos com a construção de uma escola pública protagonista e que forma cidadãos aptos a exercerem seus direitos, e não apenas deixá-los registrados no papel.
Gadelha, como é conhecido, orgulha-se de ter participado da formação de juízes, advogados, servidores das forças de segurança e tantos outros profissionais, mas, principalmente, de professores. Ao menos dois deles atuam na Universidade de Brasília (UnB), nos departamentos de Línguas e de Sociologia. Outros voltaram para o Centro de Ensino Médio (CEM) 9 de Ceilândia e alçaram até mesmo cargos de gestão na escola.
“Eram meninos e meninas que entraram aqui na sétima série (hoje oitavo ano). Tivemos a oportunidade, em sala de aula, de mostrar a eles a importância da educação”, afirma.
Em sala de aula e nos anos que passou na direção da escola, Gadelha sempre se recusou a limitar a prática pedagógica e a rotular estudantes como incapazes de desenvolver qualquer tarefa que fosse. Para ele, essa é uma questão filosófica: a pergunta feita a uma criança, a um adolescente ou a um adulto pode ser a mesma, o que muda é o nível de exigência com relação à resposta. A partir daí, cabe ao professor guiar o caminho pelo aprendizado. “O problema é que criou-se um conceito de normalidade, de um certo grau de resposta, que nem sempre é compatível para todos os níveis de compreensão”, avalia o especialista em filosofia e sociologia.
Quantos alunos eu tive a oportunidade de colocar para ler além das possibilidades… Alguns, na época, diziam: ‘Você é maluco! Esses meninos não têm nível’. Eu dizia: ‘Vamos na compreensão’.”E foi assim que, ainda na educação básica, os alunos do professor de história leram Raízes do Brasil, clássico de Sérgio Buarque de Holanda que interpreta o processo de formação da sociedade brasileira.
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Para Gadelha, portanto, partir da realidade do aluno, como ensina Paulo Freire e outros pensadores da educação, é importante, mas não pode ser um limitador. “Sim, eu parto, mas no sentido de arrancar o aluno daquela realidade. No sentido de pegar aquela realidade e modificá-la, vê-la em perspectiva, e não ficar limitado àquela condição.”
A história do historiador
Natural de Limoeiro do Norte, no interior do Ceará, a cerca de 200km de Fortaleza, Gadelha veio para Brasília em 1977, aos 20 anos. Tinha completado apenas o ensino fundamental e, um ano depois, conseguiu concluir todas as provas do supletivo para receber o diploma do ensino médio.
No Nordeste, ele e os sete irmãos percorriam quilômetros a pé ou no lombo de um jegue para estudar. A distância se compara à do Condomínio Privê, em Ceilândia, a Taguatinga, como bem repara o professor. “Dá uma distância boa, para estudar, para ver as coisas. Eu me lembro que meu pai comprava pão e trazia aqueles embrulhos que a gente usava até para escrever. Ou trazia um jornal e a gente fazia como se estivesse narrando uma notícia”, recorda o professor. De Monteiro Lobato a José de Alencar, aos poucos os oito filhos iam embarcando no universo da literatura. “Uma coisa muito importante que os meus pais, que mal sabiam assinar o nome, fizeram era mostrar a relevância da leitura”, orgulha-se Gadelha.
O investimento de um dos tios, Ubatan, irmão de seu pai, na educação dos sobrinhos fez toda a diferença. Ele havia se formado em medicina na Universidade Federal do Ceará (UFC) e foi o primeiro da família a emigrar para a capital federal. Em 1977, a família toda do Galego, como o tio o chamava por causa dos cabelos loiros, chegou a Brasília. “Eu falava com ele (tio), agora no mês de abril, o quanto é importante você ir constituindo aquilo que o (Pierre) Bourdieu chama de capital cultural, capital cognitivo: você entender o que você constitui. Porque a partir da família que se preocupa e quando se tem uma escola num período integral, com todo o acompanhamento, você faz democracia”, diz o professor, citando o célebre sociólogo francês.
Em 1979, foi aprovado no concurso da Secretaria de Saúde, cargo que assumiu no ano seguinte. Na mesma época, provou que olhar a realidade em perspectiva e não se ater a rótulos traz recompensas: foi aprovado no vestibular da UnB para o curso de geologia. Apesar da conquista de passar numa federal depois de se mudar do interior do Ceará, não pôde se matricular, pois não havia aulas no período noturno e deixar o trabalho era uma impossibilidade. Optou, então, por cursar história no UniCeub, o início da construção da carreira que seguiu até a aposentadoria, em janeiro deste ano.
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A aprovação no concurso da então Fundação Educacional do Distrito Federal veio em 1986. “Era dia 20 de abril, um domingo. Saiu no Correio Braziliense a lista com os convocados”, recorda-se. Durante anos, ele acumulou as funções, na Saúde e na Educação, em plantões sucessivos. A partir de 1999, passou a se dedicar apenas à sala de aula.
Um salto filosófico
Com o tempo, o repertório do professor evoluiu e ele, hoje, consegue reconhecer os pais no personagem principal da obra do filósofo francês Jacques Rancière, O mestre ignorante — Cinco lições para a emancipação intelectual. O protagonista é um docente que convida os estudantes à reflexão sem sequer falar o mesmo idioma que eles, um método filosófico que vai além da pedagogia da explicação.
“Eu tenho certeza: hoje, todo mundo explica tudo e não explica nada. Porque o ensino não está voltado para a curiosidade”, atesta o professor, numa crítica contundente aos dispositivos móveis. “Eu fico abismado quando alguém quer substituir a figura do professor por uma suposta inteligência artificial”, reclama, no único momento em que o semblante calmo e a voz pacífica parecem mudar e dar lugar à indignação.
“Você tem uma massa de informação tecnológica, mas você não tem uma massa de sabedoria. Quando eu falo que o professor é importante, é porque ele constitui diálogo. Isso aqui vai te dar o vazio (aponta para o celular). Conexão não é interação. Interação é muito mais importante.”
Gerações impactadas
Gadelha testemunhou as várias mudanças do CEM 9, única escola em que trabalhou. Quando chegou, em 1986, a instituição havia acabado de ser transformada em Centro Educacional (CED) e recebia também alunos do ensino fundamental. Só em 1995 passou a ser Centro de Ensino Médio. Teve aluno cuja família inteira passou pela sala de aula do professor.
Em 2007, assumiu a direção da escola, cargo que ocupou quase ininterruptamente até o início deste ano. Pouco tempo depois, a escola começou a aprovar grupos maiores de alunos na Universidade de Brasília e em outras instituições públicas pelo país. Com o reforço escolar aos sábados, no âmbito de projetos de preparação para o Programa de Avaliação Seriada da UnB (PAS/UnB) e o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), alcançaram resultados notáveis e consistentes ao longo dos anos. O recorde de aprovações foi de 123 estudantes.
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Alunos do CEM 9 já participaram também da final de uma conferência de matemática, meio ambiente e ciências na Índia, em 2012, e de olimpíadas de filosofia e de matemática pelo país. “Formamos um conjunto de profissionais, de pessoas, que acreditamos terem contribuído para a sociedade brasiliense e, por que não dizer, do Brasil, não sabe?”, orgulha-se Gadelha, com o sotaque cearense. “Para mim, isso é o que fica.”
Em nome da educação
Um dos desafios que Gadelha encara até hoje, junto a uma associação de diretores de escolas públicas, é a luta por uma educação pública de qualidade. Na avaliação dele, o Brasil sustenta ainda um modelo de escola improvisado, e Brasília, como capital, privilegiada, inclusive, em termos de recurso financeiro, precisa dar um exemplo melhor.
Gadelha defende que o investimento na educação seja centralizado — recursos financeiro, humano e pedagógico. “Hoje, percebo que há muita gente fazendo muita coisa, até louvável. O que não é louvável é muita gente dando pitaco na educação pública. Muita coisa se perde no meio desse caleidoscópio de boas intenções. Não bastam boas intenções, não basta falar. Precisa ser concreto”, critica o professor.
“Fazer, todo mundo diz que faz, mas encarar o dia a dia na escola pública é de uma complexidade enorme, porque a sociedade brasileira é muito desigual, e é dentro da escola onde todos os problemas sociais se concluem: a violência, a desagregação, o descaso com o jovem, com a criança”, diz ele, que é ainda um grande defensor da educação em tempo integral, com atividades esportivas, culturais e pedagógicas pensadas para os estudantes.
“Com leitura, com compreensão, com uma boa escola, com um professor, você atinge tudo. Nesse exato momento, está nascendo uma criança na Estrutural. Nesse exato momento, na área mais nobre de Brasília, está nascendo uma criança. Todo o nosso aparelho cognitivo, nossa percepção, nossa relação com o mundo é igual. O problema é a constituição do capital cultural”, conclui ele, que, ao lado da mulher, Divina Maria, cuida com zelo do capital cultural dos filhos Camilo, 34 anos, e Kauan, 21. O caçula é aluno do curso de química do Instituto Federal de Brasília (IFB).
Honraria será concedida no Dia da Consciência Negra; homenageada é colunista do Brasil de Fato MG
Célia Gonçalves Souza, mais conhecida como Makota Celinha, é jornalista, professora, militante, ativista social, coordenadora do Centro Nacional de Africanidade e Resistência Afro Brasileira (Cenarab) e colunista do Brasil de Fato MG. Essas são algumas de suas nomeações, mas que não a resumem. Makota Celinha vai muito além. E, por essa razão, a Universidade Estadual de Alagoas (Uneal) concedeu a Célia o título de Doutora Honoris Causa, honraria máxima concedida pela academia a personalidades que tenham se destacado nos âmbitos da cultura, da educação ou da humanidade.
Histórias e caminhos
Célia Gonçalves nasceu em Belo Horizonte, em 1963, e é a caçula de 15 irmãos. Em entrevista ao Brasil de Fato MG, ela destaca, em diversos momentos, a importância que seu pai, Aderval Souza, teve na sua criação e na de seus irmãos.
“Meu pai foi o meu maior incentivador. Foi um entusiasta da minha militância na esquerda. Sempre muito solidário”, comenta.
Aderval era alfaiate e semianalfabeto, e foi ele quem provocou em Célia o amor pelas pautas sociais.
“Meu pai foi um dos fundadores do PT, foi um dos primeiros filiados. Sempre esteve ligado a essas pautas e fazia parte dos sindicatos. Por isso, eu também me inseri”, relembra.
No entanto, Célia revela que, mesmo com muita luta, as dificuldades continuaram sendo presentes em sua vida e na de sua família. Makota relata que seu pai era quem sustentava a família, mesmo com um salário mínimo. “A casa que nos mudamos, no bairro Nova Vista, não tinha nem telhado”.
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Sua mãe era lavadeira e, assim como seu pai, era semianalfabeta. Na escola, Célia revela que era bagunceira. Gostava de conversar e fazer piadas com sua irmã gêmea, Celita Souza, mas sempre tirando boas notas.
Makota fez o magistério e se destacou em seus projetos escolares. Inclusive, uma de suas iniciativas foi vencedora de um programa internacional, que concedeu a ela a bolsa necessária para iniciar a sua etapa de estudos na faculdade com tudo pago.
“A gente era muito levada, mas sempre tiramos boas notas, nunca tomamos bomba. Tanto que eu virei professora”, brinca.
Inserção na academia
Makota Celinha foi a primeira da sua família a entrar em uma universidade, motivo de grande honra e orgulho para seu pai e outros familiares. Contudo, ela revela que passou por muitos desafios e preconceitos.
“Eu enfrentei muitos desafios. Desafio de não ter material, desafio de não ter dinheiro para uma boa bibliografia, desafio de vender pastel, coxinha e empadinha no intervalo da aula para conseguir levantar dinheiro para pagar a passagem”, relata.
Além disso, Célia foi vítima de racismo e exclusão na faculdade. “A academia sempre foi um lugar de muita exclusão, né? E a gente sempre foi muito, muito discriminado nesses espaços. Na minha sala eu era a única preta até minha formatura”, comenta. “Foi lá que eu descobri o racismo”, finaliza ela.
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A partir disso, já ligada às pautas populares, ela filiou-se ao Movimento Negro Unificado (MNU) e começou a sua jornada na luta antirracista.
Makota Celinha se formou em 1989. Anos depois, em 1991, surge o Cenarab, organização que ela coordena atualmente.
O Cenarab
O Cenarab surgiu em 1991, no 1° Encontro Nacional de Entidades Negras (ENEN), com o objetivo de lutar pelos direitos do povo negro, tendo como foco principal a luta contra a intolerância religiosa, a discriminação e o preconceito. Makota está no movimento, que se organiza em 18 estados do país, desde a sua fundação.
O centro tem como compromisso “criar e apoiar ações que possam transformar a realidade das comunidades tradicionais na formação de lideranças como forma de combater a intolerância religiosa, o preconceito e a discriminação”.
A premiação
Makota será premiada com o título de Doutora Honoris Causa pela Uneal por ter se destacado na caminhada coletiva pela defesa da cultura afro-brasileira e pela preservação das tradições de matriz africana.
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A cerimônia acontece no dia 20 deste mês, às 9h, na Serra da Barriga, em Alagoas, e será uma celebração pelo reconhecimento da luta por direitos do povo negro.
Médico foi um dos grandes nomes do país no combate à fome
Ao discursar nesta segunda-feira (18) durante o lançamento da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza na abertura da Cúpula de líderes do G20, no Rio de Janeiro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva citou o médico e filósofo Josué de Castro.
A fome, como dizia o cientista e geógrafo brasileiro Josué de Castro, “a fome é a expressão biológica dos males sociais”, recordou Lula.
O presidente apresentou dados da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) que apontam que 733 milhões de pessoas enfrentaram a fome em 2023.
Josué de Castro nasceu em Pernambuco, em 1908. Formado em medicina e filosofia, é um dos grandes nomes do país no combate à fome.
O coordenador da graduação em relações internacionais do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense (UFF), Fernando Roberto de Freitas Almeida, destaca que ao levar Josué de Castro para o G20, Lula reproduziu uma frase do pernambucano, “a fome é a expressão biológica dos males sociais”.
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Josué de Castro tem obras literárias como O problema da alimentação no Brasil, Geografia da Fome e Geopolítica da Fome.
Entre 1939 e 1945, implementou o Serviço de Alimentação da Previdência Social (SAPS), ministrou cursos sobre alimentação e nutrição no Departamento Nacional de Saúde Pública e na Faculdade de Medicina do Brasil. Em 1946, fundou o Instituto de Nutrição da Universidade do Brasil, hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Atualmente, o instituto leva o nome Josué de Castro.
O acadêmico foi eleito também presidente da FAO por dois mandatos seguidos, em 1951 e 1955. Ele foi ainda deputado federal por dois mandatos, de 1955 a 1962, período em que apresentou projetos sobre reforma agrária e regulamentação da atuação profissional dos nutricionistas.
Em 1957 presidiu a Associação Mundial de Luta Contra a Fome. Com a ditadura militar no Brasil, precisou se exiliar em 1964.
“Ele foi o primeiro pesquisador que fez um mapa da fome da nossa população”, aponta a pesquisadora da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan), Rosana Salles-Costa.
Fundador e reitor da Zumbi destaca que a criação da instituição foi e continua importante na institucionalização das cotas para negros e outras ações afirmativas. Ele é a personalidade homenageada do 18º Prêmio Top Educação
Oriundo de família rural e nascido em Marília, SP, o então entregador de biscoitos José Vicente se tornou advogado e doutor em educação. Há quase 30 anos é uma das pessoas mais atuantes na quebra do racismo estrutural e das desigualdades brasileiras. Os feitos de seus trabalhos têm gerado resultados expressivos. Um de seus marcos é a criação, em 2001, da Universidade Zumbi dos Palmares, na cidade de SP, o qual é o reitor (o primeiro vestibular veio em 2003).
É por conta da criação da Zumbi e de muitos outros trabalhos de impacto social que José Vicente é a personalidade homenageada do 18º Prêmio Top Educação* (saiba mais no final da entrevista), da revista Educação.
Confira, a seguir, a entrevista com José, que é colunista em grandes veículos jornalísticos e membro de conselhos renomados, incluindo o conselho editorial da revista Ensino Superior.
José Vicente é a personalidade homenageada do 18º Prêmio Top Educação (Foto: divulgação)
O que te levou a fundar a Universidade Zumbi dos Palmares?
Foi a constatação e o inconformismo da exclusão do negro do ensino superior público e privado e a total ausência de qualquer tipo de debate do impacto da discriminação e do racismo nos ambientes educacionais em São Paulo e no Brasil. Na época da fundação da Zumbi dos Palmares, por exemplo, os negros representavam 2% do corpo discente da Universidade de São Paulo (USP).
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A criação da Universidade Zumbi dos Palmares foi o ponto de disrupção na condução dessas agendas no nosso país.
Criada em 2001, registrada em 2002 e com seu primeiro vestibular em 2003, a Zumbi é a primeira e ainda única universidade negra do país e da América do Sul.
Foi a partir da sua constituição e experiência que as demais instituições e governo se encorajaram na institucionalização das cotas para negros e outras ações afirmativas. Nos seus 20 anos de existência, a Zumbi foi importantíssima na sustentação e consolidação do processo das ações afirmativas, nas universidades, governos, nas instituições da sociedade civil e na arregimentação e sensibilização do ambiente corporativo público e privado.
A Zumbi foi a criadora da Iniciativa Empresarial pela Igualdade Racial, o mais importante movimento empresarial de combate à discriminação no mercado corporativo, envolvendo mais de 100 empresas e instituições nessa ação. Criou também o Fórum Internacional de Equidade Racial Empresarial, o Índice de Equidade Racial Empresarial, e o primeiro Curso de Formação de Conselheiros Negros Empresariais das Américas.
Nessas duas décadas de história, como avalia o trabalho da Zumbi na inclusão da população negra no ensino superior e no mercado de trabalho?
Tendo iniciado suas atividades com o curso de administração, em 2004, ao longo da sua trajetória a Universidade Zumbi dos Palmares formou e qualificou mais de 10 mil jovens negros nos seus cursos de graduação, pós-graduação, extensão e nos cursos técnicos e livres. Com a implantação do Colégio Técnico Dandara dos Palmares, da Unibella (Universidade da Beleza), Unisamba (Universidade do Samba) e da Afrosênior (Universidade da terceira idade) e os Climáticos, a Zumbi, além de cumprir integralmente sua missão de promover inclusão, formação e qualificação dos jovens negros na educação e no ensino superior, oportuniza a toda a sociedade o acesso à educação e ao conhecimento, à preparação e à inclusão no mercado de trabalho, à inclusão produtiva, ao acesso cultural e esportivo e ao meio ambiente protegido e sustentável.
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O que a Sociedade Afro-Brasileira de Desenvolvimento Sociocultural (Afrobrás), criada por você em 1997, tem feito?
A Afrobrás é o organismo social instituidor de todas as ações estruturantes dessa agenda de empoderamento e fortalecimento do negro brasileiro. Ela criou e instituiu a Universidade Zumbi dos Palmares, a Iniciativa Empresarial pela Igualdade Racial, o Colégio Técnico Dandara dos Palmares, o Museu da História do Negro, a Virada da Consciência Negra, o Troféu Raça Negra, o Programa Televisivo Negros Em Foco, a FlinkSammpa — Festa Internacional da Literatura Negra, a Corrida da Consciência, o Concurso Estudantil Afrominuto. Além disso, realiza as ações de advocacy perante os governos, campanhas e movimentos de transformação social como a Campanha Cotas Sim, Movimento Ar: Nós Queremos Respirar, Movimento Racismo Zero, o Procon Racial, o Serviço Acolhe de Proteção ao Consumidor. As grandes ações de afirmação da negritude desde as cotas nas universidades, no serviço público, no mercado de trabalho, no congresso e nos veículos de comunicação, têm o protagonismo ou a participação relevante da Afrobrás.
Em parceria com a prefeitura, a Universidade Zumbi dos Palmares também integra o projeto do Museu da História do Negro, em São Paulo, SP. Qual a importância de se criar esses espaços?
De forma injustificada e incompreensiva, o país que escravizou os negros por quase 400 anos nunca se interessou ou se preocupou em inventariar esse histórico que compõe a trajetória histórica e evolutiva do país.
As contribuições dos negros para a formação do país e da sua cultura constituiu um legado de incomensurável valor e integra a própria essência do povo brasileiro. Ainda assim, não existe um equipamento museológico constituído com esse propósito. Não existe um Museu Nacional da Escravidão num país que escravizou mais de cinco milhões de pessoas por mais de 350 anos.
Por esses motivos entendemos que uma maneira assertiva e de grande valor para a celebração dos nossos 20 anos [da universidade], seria dotar nosso país do primeiro museu com essa finalidade e propósito. Assim, em parceria com a prefeitura e com o governo do estado, esse ano estaremos dando início à construção do Museu da História do Negro de São Paulo que, além de peças e documentos, contará com um centro cultural para proporcionar o convívio, a integração e o reforço da identidade e da cultura negra com exposições, biblioteca, cinemateca, cursos e exibições de arte, dança, cinema, música e teatro.
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Devido ao racismo estrutural, o Anuário da Educação Básica e outros estudos constatam que, no ensino básico, o índice de aprendizagem em português e matemática de estudantes negros(as) é menor do que de estudantes brancos(as). Quais parcerias e ações são necessárias para diminuirmos/quebrarmos essa realidade inaceitável?
A ação mais imediata e profunda para combater a desigualdade entre negros e brancos precisa e tem que estar no espaço [escolar] e equipamentos educacionais. Ali existe um abismo que separa negros e brancos no acesso e no desenvolvimento igualitário de suas competências e habilidades educacionais, sociais e emocionais.
Seja por conta da discriminação e hostilidade dos ambientes educacionais, seja por conta da indiferença e despreparo para tratar as diversas facetas que impactam mais intensivamente os jovens negros e periféricos, os resultados finais do processo educativo sempre irão ter distorções e desiquilíbrios entre estudantes negros e brancos.
Dessa forma é indispensável que o governo, escolas e sociedade juntem esforços para enfrentar esse grande desafio. As escolas podem formar e qualificar os professores para implementarem a Lei da História do Negro e da África, por exemplo. As universidades podem fortalecer essas dimensões na formação dos futuros professores, bem como produzir estudos e pesquisas dirigidas para conhecer e desenvolver estratégias e tecnologias de superação. A sociedade pode fortalecer o debate sobre a importância de enfrentar e combater o racismo. O Congresso pode produzir e aprimorar leis para combater o racismo e fortalecer as ações afirmativas. E o governo pode construir e ampliar políticas públicas e medidas dirigidas para fortalecer o conjunto das ações em andamento.
*Prêmio Top Educação
Em sua 18ª edição, o Top é uma votação espontânea na internet realizada pela revista Educação e tem como objetivo apontar as marcas mais lembradas entre as empresas que atuam na área de educação (conheça as marcas vencedoras). Desde o ano passado, a equipe editorial da revista Educação homenageia uma entidade e uma personalidade que tem impactado o setor.
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Este ano, além de José Vicente ser a personalidade homenageada, a entidade homenageada é a Fundação Itaú. Clique aqui para ler.
Em 2023, a personalidade homenageada foi Mozart Neves Ramos, titular da Cátedra Sérgio Henrique Ferreira, do IEA da USP e secretário de Educação do Estado de Pernambuco (2003-2007). Clique aqui para saber mais.
Já o Instituto Ayrton Senna foi a entidade homenageada do ano passado devido ao esforço de disseminar há pelo menos 10 anos aos educadores e educadoras do país o que são habilidades socioemocionais e como inseri-las nos espaços de aprendizagem. Clique aqui para saber mais.