O conceito de Teocracia Agropastoril Miliciana descreve a fusão das identidades e interesses das antigas “bancadas BBB” (Boi, Bala e Bíblia) em um projeto unificado que visa a refundação do Estado brasileiro como um domínio sagrado e armado, e não mais como uma república laica e democrática. O fenômeno é sustentado pelo fundamentalismo religioso (o software ideológico, via Teologia do Domínio), o agronegócio predatório (o hardware financeiro e territorial, com a sacralização do lucro) e a contaminação miliciana das forças de segurança (o braço armado)
O conceito de Teocracia Agropastoril Miliciana é proposto como um diagnóstico da política brasileira contemporânea, sugerindo que as tradicionais divisões entre a bancada ruralista (Boi), evangélica (Bíblia) e da bala (Bala) não existem mais como meras coligações de interesses, mas sim como uma fusão de identidades em um projeto de poder totalizante.
Anatomia da Fusão Ideológica e Tática 🛡️
A antiga “Bancada BBB” evoluiu para um movimento orgânico que se autodenomina a “Bancada da Vida” ou do “Bem”. Essa mudança semântica é crucial: em vez de debater ideias como adversários políticos, o grupo se coloca em uma “Guerra Espiritual” contra o “Mal” (a dissidência, a esquerda, os movimentos sociais), onde a violência e a supressão de direitos são justificadas como saneamento moral ou vontade divina.
O Ato de 8 de janeiro de 2023 é citado como a materialização dessa fusão: a massa crítica foi inflamada por retórica religiosa de fim dos tempos, financiada por empresários do agronegócio e facilitada por omissão de parte das forças de segurança.
Os Três Pilares da Quimera 🔱
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O Pilar Teológico (O Software): A força motriz é a Teologia do Domínio, importada do reconstrucionismo cristão norte-americano. Essa doutrina prega que os cristãos têm um mandato divino para “ocupar” e governar as estruturas da sociedade (o “Mandato dos Sete Montes”) antes do retorno de Cristo. Sob essa ótica, a laicidade do Estado é vista como um erro a ser corrigido, e a política se torna um palco para o Cristofascismo, onde a oposição é tratada como “agentes demoníacos” a serem neutralizados.
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O Pilar Econômico (O Hardware): O agronegócio financeirizado e expansionista fornece o combustível material, substituindo o slogan “Agro é Pop” por “Agro é Santo”. A prosperidade da safra é sacralizada como bênção de Deus, o que oferece uma blindagem ética para a predação ambiental. O desmatamento e a invasão de terras são ressignificados como o cumprimento da ordem do Gênesis de “sujeição da terra”. No campo, essa aliança se manifesta nas Agromilícias, grupos armados que atuam para “limpar” áreas de interesse, atacando indígenas e sem-terra.
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O Pilar Coercitivo (O Braço Armado): Ocorre a captura ideológica das forças de segurança, onde a polícia passa a servir a Deus acima da Constituição. O principal vetor desse movimento é o programa UFP (Universal nas Forças Policiais). O policial que vê sua autoridade como concessão divina e seu pastor como comandante espiritual desenvolve uma dupla lealdade, tendendo a obedecer a diretrizes religiosas em detrimento da lei civil. Paralelamente, projetos como os Gladiadores do Altar militarizam a estética da igreja, preparando o imaginário do fiel para o confronto.
O Laboratório do Caos: Complexo de Israel
O Complexo de Favelas da Zona Norte do Rio de Janeiro é apresentado como um microcosmo da Teocracia Agropastoril Miliciana, onde o crime organizado (liderado por “Peixão”) adotou o fundamentalismo como método de governo. Ali, o Narco-Pentecostalismo impõe terror e intolerância religiosa (depredação de terreiros de Candomblé/Umbanda), com o traficante agindo como um “ungido”, e o fuzil e a Bíblia se tornando ferramentas de domínio territorial.
Conclusão
A atuação coordenada da “Bancada da Vida” no Congresso (financiada, em parte, pela indústria de armas e pelo agronegócio) demonstra que a Teocracia Agropastoril Miliciana já está operando, votando em leis que facilitam o acesso a arsenais, enfraquecem o licenciamento ambiental e tentam criminalizar movimentos sociais. O autor conclui que esse modelo representa o maior risco à democracia brasileira desde a redemocratização, exigindo que as instituições reafirmem o Estado laico.
Com informações: Diplomatique