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Candidatos autodeclarados negros são reprovados em cotas raciais de concursos no DF

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O recém aprovado em um concurso público Iure Marques, de 31 anos, e a estudante Ana Karolina, de 17, relatam dividir o mesmo sentimento: ter suas identidades negadas por uma banca examinadora. Eles são moradores do Distrito Federal e viveram situações parecidas. Ao passarem pela etapa de heteroidentificação, não passaram como cotistas mesmo se autodeclarando negros.

  • Iure passou em todas as fases do concurso para ser advogado da União, mas foi reprovado na fase de heteroidentificação, em abril deste ano. Ele chegou a entrar com recurso, mas foi indeferido;
  • Já Ana Karolina foi reprovada na heteroidentificação do vestibular da Universidade de Brasília (UnB). Ela também entrou com recurso, que foi aceito. Mas conta que todo o processo a fez duvidar de si mesma (veja detalhes mais abaixo);
  • A banca examinadora em que houve as reprovações dos cotistas foi o Cebraspe.

Procurada pelo g1, a banca informou que todos os candidatos que solicitam concorrer às vagas reservadas aos candidatos negros são submetidos à verificação do fenótipo — procedimento que visa analisar se o participante tem um conjunto de características fenotípicas da pessoa negra.

“Registra-se que aproximadamente 80% dos candidatos autodeclarados negros têm sua condição confirmada pela comissão de heteroidentificação nos processos seletivos realizados pelo Cebraspe. Dos que não são considerados negros, cerca de 5% têm sua situação revertida por meio da etapa recursal”, informou a banca.

A professora da Universidade Católica de Brasília (UCB) e pesquisadora de relações étnico-raciais e de gênero Kelly Quirino explica que o sistema de cotas e a etapa de heteroidentificação são fundamentais no processo de reparação história com a população negra. Mas pondera que alguns mecanismos podem e devem ser aprimorados.

“A gente precisa levar em consideração o colorismo, que é um sistema que quanto mais escura uma pessoa é, mais ela sofre. Porém, a gente está falando de pessoas que são afrodescendentes. Elas sofrem com os efeitos do racismo, elas sofrem violência. Às vezes, a pessoa não tem uma pele tão escura, mas ela é criticada pelo tamanho da boca, pelo formato do nariz, pelo cabelo ser crespo”, diz a especialista.

‘Emocionalmente fragilizado’

Iure Marques, à época de sua formatura, e o parecer da banca de heteroidentificação — Foto: Reprodução

Iure Marques, à época de sua formatura, e o parecer da banca de heteroidentificação — Foto: Reprodução

Iure conta que é filho de uma mulher preta, mãe solo, que por sua vez é filha de uma mulher indígena e um homem negro. Egresso da rede pública de ensino do DF, ele se formou em direito pela UnB. Hoje, ele trabalha no Tribunal de Justiça do DF, cargo que, segundo ele, foi conquistado por meio das cotas.

O servidor público afirma que passar no concurso de advogado da União seria um passo além. “Quando eu fui passando pelas etapas do concurso, achei que o mais difícil eu tinha conquistado. Estávamos muito felizes e confiantes, porém, na banca de heteroidentificação, última etapa do concurso e justamente na fase em que eu estava menos preocupado, sobreveio esse resultado surpreendente“, relata ele.

“Eu nunca tive minha negritude questionada. Sou de Brasília e onde quer que eu vá nesta cidade, sou reconhecido como negro. Quem é negro sabe o que significa esse reconhecimento. A reprovação no resultado preliminar da banca já me abalou bastante. Emocionalmente eu me vi bastante fragilizado, pois é um resultado que atinge diretamente a minha identidade”, diz Iure.

Depois de ter o recurso negado, Iure diz que se prepara para entrar com uma ação judicial para lutar por sua vaga no concurso.

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“O sentimento de injustiça é muito grande, eu não queria me aproveitar das cotas, somente queria exercer um direito que me cabe. […] Eu me olho no espelho e fico tentando encontrar os traços brancos que foram imputados a mim. É uma situação dilacerante”, desabafa.

Crise de identidade

Ana Karolina, à esquerda, e o parecer de heteroidentificação, à direita — Foto: Reprodução

Ana Karolina, à esquerda, e o parecer de heteroidentificação, à direita — Foto: Reprodução

Ana Karolina diz que, quando foi negada no processo de heteroidentificação, a justificativa da banca foi de que ela tinha “pele clara, cabelo liso e traços finos”.

Em seu recurso, ela argumentou que, na verdade, tem pele escura, cabelos cacheados, nariz achatado e lábios cheios, e que suas características podem ser averiguadas por meio da filmagem que é feita durante a avaliação da banca.

“Além disso, minhas vivências são de uma mulher negra, a qual teve sua pele, seu cabelo e sua capacidade questionadas por causa de suas características. Neguei me esconder, alisar meu cabelo e concordar com a sexualização precoce por que passei. O racismo nas ruas, e até mesmo na escola, são velados, mas cravam o peito de quem o sofre“, diz a estudante, que hoje cursa medicina na UnB.

Embora o recurso tenha sido aceito, Ana Karolina diz que enfrentou uma crise de identidade quando seu direito às cotas foi inicialmente negado.

“Literalmente fiquei em uma crise de identidade, chorei horrores. Eu fiquei sem palavras, porque eu não sou branca, não sou amarela e nem indígena, então eu sou negra! Não tem a mínima possibilidade disso ter ocorrido de forma coerente”, afirma.

Falta de letramento racial

A especialista em questões étnico-raciais Kelly Quirino explica que ser branco em uma sociedade racista é ter privilégios; ser negro em uma sociedade racista é sofrer violências, perder direitos, estar na base da pirâmide e ser criminalizado.

“As banca do heteroidentificação beneficiam a população negra e é muito importante que ela continue existindo, pois elas corrigem distorções e impedem que pessoas lidas como brancas se beneficiem das cotas raciais. Agora, elas podem ser melhoradas? Sim”, diz a professora.

Segundo Kelly, além da questão do colorismo, também é preciso considerar as regionalidades do Brasil. Ela também afirma que a falta de letramento racial afeta diretamente a população negra.

“Falta pras bancas de heteroidentificação mais letramento, mais leitura, mais questionamentos em relação ao colorismo. As pessoas precisam ler mais. Precisam ler Abdias do Nascimento, Maria Beatriz Nascimento, Djamila Ribeiro, Carla Akotirene. Acho que isso ajuda muito a entender a complexidade do que é ser negro no Brasil”, diz.

No entanto, Kelly ressalta que a política das cotas raciais é extremamente positiva e, graças a ela, a cor da universidade e do serviço público tem mudado.

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“As instituições do nosso país têm que se parecer com o nosso país, que é um país diverso, plural, com diferenças. O sistema de cotas pode ser aprimorado, mas ele não pode acabar, porque você ainda tem grande parte da população negra com os piores indicadores sociais do nosso país, e as cotas estão aí para corrigir esse tipo de coisa”, pontua.

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Plano de ocupação ao lado do Parque das Garças vai levar infraestrutura e lazer aos brasilienses

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Projeto investe na segurança e na manutenção do acesso gratuito ao espaço; consulta pública será aberta para que todos os interessados possam contribuir

“O acesso a espaços como esse precisa ser democratizado”, é o que defende Joaquim Pereira, de 43 anos, ao opinar sobre o Plano de Ocupação para a Unidade Especial 4 – Polo 1 do Lago Norte. O local em questão fica ao lado do Parque Ecológico das Garças, que possui 53,1 mil m². Já a ocupação é um espaço público com 6 mil m².

Frequentada pela população para lazer e atividades esportivas, área teve plano de ocupação elaborado pela Terracap e aprovado por unanimidade no Conselho de Planejamento Territorial e Urbano do Distrito Federal (Conplan) | Fotos: Geovana Albuquerque/Agência Brasília

Apesar de já ser utilizada pela população para caminhadas, pedaladas e esportes aquáticos, a área da ocupação possui infraestrutura precária, com poucos bancos e sanitários, e sem serviços disponíveis no entorno.

Morador de Planaltina, o vigilante aproveitou o fim de semana de descanso para visitar a área pública da região pela primeira vez neste domingo (29). Chamou atenção, porém, a falta de infraestrutura no local.

“É um espaço muito bacana. Me surpreendi. Mas a área precisa ser melhor utilizada. Falta infraestrutura, a gente vê que falta banheiro. Aqui precisa ter um olhar público para investimento”, diz Joaquim.

O plano, elaborado pela Agência de Desenvolvimento do Distrito Federal (Terracap) e aprovado por unanimidade pelo Conselho de Planejamento Territorial e Urbano do Distrito Federal (Conplan) em 25 de setembro, traz uma série de diretrizes para definir a forma de ocupação e uso do local. O Conplan reúne órgãos de governo, como a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação do DF (Seduh) e Instituto Brasília Ambiental, além de associação de moradores e o próprio Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

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“Teremos mais árvores nativas do Cerrado, mais áreas esportivas e um espaço para comércio de restaurante. Vai deixar o local mais acessível. Vamos manter a questão da contemplação do uso atual”, destaca Thiago Freire, gerente da Terracap


Ao todo, três pilares regem a proposta: sustentabilidade ambiental, qualidade de vida e viabilidade econômica, conforme explica Thiago Freire, gerente da Terracap.


“A gente entende que a população utiliza o espaço como forma de contemplação. Isso será preservado. A ideia é revitalizar o espaço com mais estrutura”, afirma. “Nós vamos aprimorar os atributos ecológicos. Teremos mais árvores nativas do Cerrado, mais áreas esportivas e um espaço para comércio de restaurante. Vai deixar o local mais acessível. Vamos manter a questão da contemplação do uso atual.”

“Precisa ser melhor utilizada. Falta infraestrutura”, diz o vigilante Joaquim Pereira, que visitou a área pública da região pela primeira vez neste domingo (29)

Além de um espaço para comércios e serviços como restaurantes e lanchonetes, também poderão ser feitos estacionamentos, faixas de pedestres e ciclovias que garantam o acesso da população à orla do lago.

Ainda está prevista a instalação de um mobiliário urbano, como lixeiras, sanitários, quiosques, bancos, estações de aluguel de bicicletas e iluminação pública; assim como o plantio de espécies nativas do Cerrado para uma maior arborização do espaço.

A gratuidade para acessar o espaço segue garantida. Segundo a Terracap, não poderá ser feita qualquer cobrança para entrada nas áreas. A ocupação vai respeitar a forma como o local já é atualmente utilizado e contribuir para a qualificação da área em prol da população.

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O adestrador Geniel Melo é a favor de mais infraestrutura: “A gente tem dificuldade para comprar alguma coisa, para poder ir ao banheiro, para procurar um local para pra ficar embaixo se chover”

Quem também é a favor da ocupação é o adestrador de cães Geniel Melo, 28, morador de Planaltina. Frequentador assíduo da área, ele conta que a maior dificuldade é a questão dos banheiros públicos e a falta de comércio.


“A gente tem dificuldade para comprar alguma coisa, para poder ir ao banheiro, para procurar um local para pra ficar embaixo se chover. Eu venho de Planaltina para poder tirar um dia de descanso, mas sinto essa dificuldade na falta de estrutura”, relata.


“Eu achei muito bacana a elaboração desse plano, que é uma política pública para que toda a população tenha acesso gratuito”, diz Geane Ferreira, que frequenta a área com o filho Davi

A administradora Geane Ferreira, de 47 anos, e o filho, Davi Lourenço Coelho, de 14 anos, visitam a área pública todos os fins de semana. Diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA), Davi sente que o espaço público acaba sendo muito mais que um área de contemplação, mas um local para se sentir mais à vontade. Com uma infraestrutura otimizada, ele conta que essa experiência seria melhor.

“Gosto. Aqui é bem legal. Gosto de ficar aqui com minha mãe. Mas precisa de mais segurança, mais banheiros e comércio”, reforça.

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Agências do trabalhador têm mais de 500 vagas disponíveis nesta sexta-feira (4)

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São 516 oportunidades para candidatos de diferentes níveis de escolaridade, com e sem experiência; salários chegam a R$ 3,9 mil

As agências do trabalhador do Distrito Federal oferecem, nesta sexta-feira (4), 516 vagas para quem procura um emprego. Há oportunidades para candidatos de diferentes níveis de escolaridade, com e sem experiência. Também há posições exclusivas para pessoas com deficiência. Os salários chegam a R$ 3,9 mil.

O cargo que oferece maior remuneração é o de enfermeiro, em Águas Claras. São quatro oportunidades para pessoas que tenham experiência prévia e Ensino Superior na área.

Já o posto que oferece o maior número de vagas é o de frentista, no Park Way, com 50. É preciso ter ensino médio completo, mas não há exigência de experiência. O salário é de R$ 1.439.

Para participar dos processos seletivos, basta cadastrar o currículo no aplicativo Sine Fácil ou ir a uma das 14 agências do trabalhador, das 8h às 17h, durante a semana. Mesmo que nenhuma das oportunidades do dia seja atraente ao candidato, o cadastro vale para oportunidades futuras, já que o sistema cruza dados dos concorrentes com o perfil que as empresas procuram.

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Empregadores que desejam ofertar vagas ou utilizar o espaço das agências do trabalhador para entrevistas podem se cadastrar pessoalmente nas unidades ou pelo aplicativo Sine Fácil. Também é possível solicitar atendimento pelo e-mail gcv@setrab.df.gov.br. Pode ser utilizado, ainda, o Canal do Empregador, no site da Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Renda (Sedet).


Fonte: Agência Brasília

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Detran-DF abre nova turma de Iniciação à Superação do Medo de Dirigir

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Aulas começam na próxima segunda-feira (7); as inscrições são gratuitas e devem ser realizadas, pessoalmente, na 906 Sul, até sexta-feira (4) ou enquanto houver vagas

O Departamento de Trânsito do Distrito Federal (Detran-DF) está com inscrições abertas para mais uma turma do curso de Iniciação à Superação do Medo de Dirigir, que será realizado de 7 a 15 de outubro. As aulas serão no período vespertino, das 14h às 17h30, na Escola Pública de Trânsito, localizada na 706/906 Sul.

Serão destinadas 20 vagas para o curso, que tem duração de 20h e pode ser feitos por homens e mulheres habilitados que por algum motivo sentem medo de dirigir.

As inscrições são gratuitas e devem ser realizadas, presencialmente, até sexta-feira (4), das 8h às 18h. na Escola Pública de Trânsito, localizada na 906 Sul. Para se inscrever, é necessário estar com a Carteira Nacional de Habilitação válida.

Serviço

Curso Iniciação à Superação do Medo de Dirigir
De 7 a 15 de outubro. De 14h às 17h30
Escola Pública de Trânsito – 706/906 Sul
Inscrições: até 4/10 ou enquanto houver vagas

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Fato Novo com informações do Departamento de Trânsito do Distrito Federal (Detran-DF)

 

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