O Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima (CIM) aprovou o Plano Clima, documento que estabelece o roteiro para o Brasil cumprir a meta do Acordo de Paris, visando a redução de até 67% das emissões líquidas de gases de efeito estufa até 2035. O plano, chancelado após ajustes para atender demandas do agronegócio, prioriza justiça climática e inclui planos setoriais de mitigação e adaptação.
Instrumento Nacional Define Rota Climática Após Uma Década de Lacuna
O Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima (CIM) aprovou, nesta segunda-feira (15), o novo Plano Clima, instrumento fundamental para a política ambiental brasileira. O documento encerra um período de dez anos sem uma orientação nacional atualizada sobre o tema e atualiza a primeira versão, lançada em 2008. A resolução oficial será publicada nos próximos dias no Diário Oficial da União.
O Plano Clima consolida as Estratégias Nacionais de Mitigação (ENM) e de Adaptação (ENA) e estabelece o caminho para que o Brasil atinja sua meta climática no âmbito do Acordo de Paris, que é a redução de emissões líquidas de gases de efeito estufa em uma faixa entre 59% e 67% até 2035, tomando como referência os níveis de 2005.
Segundo a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, o plano servirá como um roteiro para coordenar ações entre o Governo Federal, estados, municípios, setor privado, sociedade civil e academia, com foco em desenvolvimento sustentável e inclusivo. Pela primeira vez, o Brasil também submeterá oficialmente seu Plano Nacional de Adaptação à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC).
Negociações e Influência do Agronegócio na Versão Final
A aprovação do Plano Clima ocorreu após cerca de cinco meses de negociações e ajustes, principalmente em resposta às objeções levantadas pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), que chegou a boicotar a proposta inicial.
A principal crítica do setor agropecuário concentrou-se na responsabilização das metas de redução de desmatamento, onde a versão original não separava claramente as obrigações entre o desmatamento em áreas públicas e o desmatamento em áreas privadas.
-
Posição do Setor: O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, pontuou que “Todos os setores precisam mitigar emissões; a agropecuária, além de mitigar, pode sequestrar carbono pela fotossíntese e pela recuperação de áreas degradadas”.
-
Esforço Setorial: O Plano Setorial de Agricultura e Pecuária recebeu cerca de 400 contribuições durante a consulta pública, representando quase um quinto de todas as manifestações recebidas. A preocupação do setor era com a previsão de ter que responder por uma parcela expressiva do esforço total de redução de emissões.
-
Apoio e Incentivos: Para mitigar a resistência, o governo federal reforçou o argumento de que a transição climática na agropecuária exige apoio financeiro, destacando a inclusão de instrumentos, linhas de crédito e incentivos para práticas produtivas com menor impacto ambiental.
Um dos temas mais delicados incluídos no debate foi o uso de agrotóxicos, associado à segurança alimentar e nutricional e à necessidade de repensar modelos produtivos diante da crise climática. O secretário nacional de Mudança do Clima, Aloisio Nunes, esclareceu ao G1 que o debate não visa a proibição imediata, mas sim estratégias de transição, como o fortalecimento do Programa Nacional de Redução de Agrotóxicos, ancorado em agendas governamentais já existentes.
Estrutura do Plano e o Eixo da Justiça Climática
O documento aprovado é composto por oito planos setoriais voltados à mitigação de emissões e 16 planos específicos direcionados à adaptação aos impactos das mudanças climáticas.
A elaboração do plano, iniciada em setembro de 2023, envolveu um amplo processo participativo, com mais de 24 mil participantes em oficinas e consultas públicas, resultando em 1.292 propostas.
O Plano Clima adota a justiça climática como eixo norteador. Isso implica o reconhecimento das desigualdades históricas e o impacto desproporcional da crise climática sobre grupos vulnerabilizados. Povos indígenas, comunidades tradicionais, e recortes de raça, gênero, classe e território são reconhecidos como elementos centrais nos planos de adaptação.
O plano prevê avaliações bianuais e revisões a cada quatro anos, permitindo ajustes nos critérios de alocação de emissões, monitoramento e transparência. Com a aprovação, o governo busca fortalecer a posição do Brasil no debate climático global, enfrentando o desafio de transformar metas ambiciosas em políticas públicas eficazes em um contexto nacional de disparidades sociais e disputas territoriais.
Com informações: ECO