Do lado de nossos vizinhos, as obras necessárias já foram concluídas. A Rota 3 terá a “perna” do Acre pronta, com a conclusão das pontes da BR-425 e do Contorno de Brasiléia, na BR-317, até 2025.
Também do lado peruano está tudo pronto. A Rota 4 envolve, fundamentalmente, a ponte binacional Brasil-Paraguai no Mato Grosso do Sul, cuja conclusão é esperada para o fim de 2025, com as obras de alça de acesso à ponte, por parte do Ministério dos Transportes, sendo concluída um ano depois.
Do lado paraguaio, a rodovia já está sendo pavimentada e estará concluída, também, em 2026. Na Rota 5, a dragagem da Lagoa Mirim é fundamental para a integração do Brasil com o Uruguai e a previsão é de já estar operando até 2026.
O projeto tem tido reciprocidade nos países vizinhos para o avanço das obras? Com que países há maior facilidade em avançar e em quais se encontrou maiores dificuldades?
Sim. Do lado peruano, importante parceiro nas Rotas 2 e 3, as obras mais importantes — de dragagem de hidrovias (Rota 2) e de melhorias rodoviárias (Rota 3) — já estão concluídas. O Porto de Chancay é esperado para março de 2025 estar em funcionamento.
Do lado equatoriano, a rodovia que leva até o porto de Manta está em bom estado.
No lado do Paraguai (Rota 4), as obras da rodovia que serve de extensão da ponte binacional com o Brasil, no Mato Grosso do Sul, estão em andamento e devem ser concluídas até 2026.
Do lado chileno, importantes investimentos foram realizados nos portos de Iquique e Antofagasta. Temos tido excelente diálogo com a Bolívia (Rota 3) e com a Guiana (Rota 1) para que as obras em seus territórios ocorram a contento e temos apoiado, também, o diálogo junto aos bancos multilaterais, para ajudar no financiamento desses projetos.
O projeto de criação de rotas de integração prevê um impacto bastante significativo no âmbito comercial e diplomático do Brasil. A partir dele, quais modernizações e benefícios especificamente o governo Lula possibilitaria para o país, levando em consideração que a medida nem sequer foi cogitada na gestão anterior, uma vez que o Ministério do Planejamento e Orçamento foi extinto pelo governo Bolsonaro.
A integração sul-americana é um sonho histórico, presente em nosso imaginário há mais de dois séculos. Como fazemos fronteira com todos os países de nosso continente, salvo com Equador e com Chile, temos este sonho de forma muito clara há gerações e gerações. Aliás, a própria Constituição de 1988 prevê, logo em seu artigo 4º, o impulso para a integração regional. Diversos presidentes fizeram esforços fundamentais neste sentido e cumpre citar José Sarney, Fernando Henrique Cardoso e Lula. Mas no governo anterior, vimos exatamente o contrário. O MPO foi extinto e a política externa perseguiu um movimento isolacionista. Então não tínhamos nem planejamento interno e nem agenda externa ativa. Isso tudo mudou em 2023.
Agora, em parceria com o MRE, temos feito justamente o maior esforço de integração sul-americana, com o desenho das 5 Rotas e com o diálogo ativo dentro do Brasil, com cada um dos 11 Estados de fronteira, e fora do Brasil, com cada um dos países. Viajamos ativamente para ouvir todos: políticos, empresários, movimentos sociais, agronegócio, indústria, comércio, turismo, embaixadores. Este projeto deixou, então, de ser um sonho distante. Passou a ser realidade.
Quando ativarmos as 5 Rotas teremos criado caminhos para nossa produção circular para mais consumidores do que circula hoje, o que eleva a renda nacional e aumenta os empregos, como também criaremos novas oportunidades de negócios.
São novas ideias que a integração trará: seja em modelos de negócios, seja em turismo. Temos 200 milhões de habitantes em nossos vizinhos que poderão viajar pelo Brasil, conhecendo nossos restaurantes, nossos hotéis, nossos parques, nossos passeios. E temos 200 milhões de habitantes aqui, dispostos a consumir bens mais baratos e a fazer negócios com nossos vizinhos. Saímos do sonho para a realidade. É disso que se trata.
A China vem insistindo em seu convite para que o Brasil faça parte da iniciativa do Cinturão e Nova Rota da Seda. As rotas de integração, com seus corredores de acesso a portos no Pacífico, apontam a uma possível adesão do país a esse projeto?
As questões de política externa brasileira são essencialmente uma responsabilidade do Presidente da República e do Ministério das Relações Exteriores. O nosso trabalho no Ministério do Planejamento está orientado a conduzir a Comissão Interministerial para a Infraestrutura e o Planejamento da Integração da América do Sul.
Entendemos que este tema seja de crucial importância para definir o lugar que o Brasil e a região almejam ocupar no mundo. A expectativa é que as Rotas de Integração Sul-Americana cumpram um duplo papel: potencializar as relações do Brasil com os seus vizinhos, compreender a relevância da região para o passado, o presente e o futuro do Brasil; e promover a criação de caminhos alternativos para o nosso comércio com os mercados emergentes da Ásia, sobretudo por meio de corredores bioceânicos.
A regionalização tem sido cada vez mais um elemento crucial para as nações, com uma crescente preocupação dos países em ampliarem os seus vínculos com a sua vizinhança estratégica.
Desde o início dos anos 2000, o Brasil intensificou essa agenda, paralisada durante o governo anterior. Agora precisamos recuperar o espaço perdido e superar o atual cenário de afastamento político e comercial. Entendemos que as Rotas, ao apresentar uma agenda positiva para todos os países da América do Sul, sirvam como ponte para a reaproximação e a ativação de vínculos entre nossas economias e sociedades.
Existe algum interesse do Brasil, por meio da Rota Amazônica, na ligação com o megaporto de Chancay no Peru, tratando-se de um porto extremamente estratégico para os interesses geopolíticos e econômicos da China, que financia o projeto peruano? Pode se tornar um porto estratégico também para o Brasil?
O megaporto de Chancay, que será inaugurado em novembro de 2024 e que começará a operar em março de 2025, terá grande importância para o Brasil e beneficiará duas rotas: a Amazônica (Rota 2) e a Quadrante Rondon (Rota 3).
Desde o estado do Amazonas, temos a via do rio Solimões até a cidade de Tabatinga-AM, na fronteira com o Peru e a Colômbia. O caminho por dentro do Peru pode seguir até as cidades de Yurimaguas ou Pucallpa e depois seguir por rodovias até zonas portuárias. Já pelo Acre, temos a saída de Assis Brasil-AC, consolidada com a Estrada do Pacífico ou Rodovia Interoceânica. A via asfaltada continua, por meio de diferentes ramais, por cidades como Puerto Maldonado, Nazca ou Arequipa até chegar ao litoral do Oceano Pacífico, no Peru. Os portos de Ilo e Matarani, ao sul do Peru, terão conexão por meio de navegação de cabotagem com o porto de Chancay.
Ou seja, a expectativa é que o Brasil possa potencializar as relações com a economia peruana e, ao mesmo tempo, projetar o comércio com os parceiros do sudeste asiático via Oceano Pacífico. Como se sabe, o novo trajeto diminuirá o tempo, a distância e os custos, ampliando a competitividade dos nossos produtos.
O Brasil integra o BRICS, um bloco econômico do Sul Global, que tenta ser antagônico ao G7, que reúne as nações mais desenvolvidas do Ocidente. Contudo, vários indicadores econômicos mostras grandes avanços do BRICS, especialmente na questão do PIB: em 2000 65,4% eram atribuídos ao G7 e apenas 8% ao BRICS; em 2022, o grupo do Ocidente ficou com 42,8% do PIB global, enquanto os do Sul Global passaram a 25,5%. Como você avalia o papel do Brasil, que é um dos membros do BRICS, na disputa entre esses blocos, de acordo com os interesses do nosso país? O projeto de rotas de integração pode ter impacto nesse cenário?
O Brasil faz parte dos BRICS e o projeto das Rotas de Integração Sul-Americana não é antagônico nem com os BRICS, grupo que nos honra fazer parte, nem com o G-7 ou G-20. Nosso projeto dialoga tanto com questões do grupo de países em desenvolvimento, dado que compartilhamos dificuldades, quanto com os países desenvolvidos, dada a nossa centralidade em questões ambientais e climáticas.
O Brasil historicamente desempenhou uma postura responsável e construtiva nos fóruns internacionais e continuará agindo da mesma forma. O posicionamento brasileiro nos BRICS é similar ao assumido em outros blocos, no sentido de contribuir com espaços de governança que, ao mesmo tempo, expressam os nossos interesses e contribuem para as relações internacionais harmoniosas e propositivas.
Mas o mundo mudou bastante nos últimos 25 anos. Entendemos que precisamos agir de maneira condizente com essas transformações.
Em 2000, vendíamos apenas 2% das nossas exportações para a China; em 2024 já alcançamos mais de 30% do total. Ainda assim, a América do Sul foi o segundo maior destino dos produtos brasileiros. O Brasil vendeu mais para: Chile que Alemanha, Colômbia que Portugal, Paraguai que Reino Unido e Uruguai que França. O atual cenário requer que atuemos de maneira ampla e com muito planejamento.
Apesar de vários índices econômicos favoráveis mostrados na última semana, como desemprego baixo, inflação controlada, crescimento recorde, entre outros, o governo parece não conseguir fazer essa realidade refletir em uma maior imagem positiva. Isso é uma preocupação da equipe econômica? Como essa contradição tem sido tratada internamente?
Entendemos que há duas questões de fundo aqui. A primeira é que o trabalho tem sido feito. O governo do presidente Lula herdou uma situação de destruição institucional. Não é à toa que o mote é União e Reconstrução.
O governo anterior legou um país com inflação muito alta e fora do controle. Nossas ações reduziram dramaticamente o ritmo de aumento de preços, deixando a inflação sob controle do Banco Central. O governo anterior também tinha produzido um resultado fiscal “fake” em 2022, a custas de um calote nos precatórios e de apertos sociais terríveis, com subfinanciamento do Farmácia Popular, do Minha Casa, Minha Vida, da merenda escolar, e dos servidores públicos.
Em 2023, fizemos uma profunda correção de rota, tudo com transparência. O antigo teto de gastos fora descumprido pelo governo anterior em todos os anos. Criamos, então, uma nova regra fiscal, o arcabouço, dando previsibilidade para os agentes, com uma trajetória de consolidação fiscal perseguida ano a ano. Isso tudo foi feito e continua a ser feito, com a aprovação da reforma tributária e com a nova agenda de revisão dos gastos públicos.
Mas há um segundo ponto aí que é o quanto esses esforços de política econômica chegam na sociedade. A economia cresceu quase 3% em 2023, três vezes mais do que as expectativas do mercado financeiro. O mesmo está ocorrendo agora em 2024. A geração de empregos com carteira assinada cresce em ritmo acelerado. Há uma velocidade diferente agora, muito mais positiva, que aos poucos chega na sociedade como um todo, conforme os resultados são percebidos.
Como tem sido a sua relação com o presidente Lula nestes 21 meses de mandato? Vocês foram adversários no primeiro turno, depois se uniram em um governo de Frente Ampla. Como você avalia o funcionamento dessa coalizão?
O governo do presidente Lula é um governo de frente ampla. Tenho colegas ministros de diversos partidos, o que é muito bom: é assim que funciona o presidencialismo de coalizão. Vimos que todas as vezes que o país teve bons resultados ocorreu por meio do diálogo com diferentes agentes. A sociedade está espelhada no Congresso Nacional e é muito positivo que assim seja refletido no Executivo.
O diálogo com o presidente Lula é muito bom: tanto nas agendas de política econômica, como na revisão de gastos, quanto na agenda das Rotas de Integração Sul-Americana, um tema que o presidente nos deu todo o apoio e liberdade para, em parceria com os demais ministérios de seu governo, liderar essa agenda.
Marcos
16 de junho de 2024 no 11:01
Olá! Tudo bem?
Parabéns pelo trabalho! Desejo que tenha sucesso!