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Ciência

Genética psiquiátrica revela elo inédito entre 14 transtornos

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Maior análise da história agrupa doenças como depressão e TDAH em cinco perfis genéticos, abrindo caminhos para tratamentos mais eficazes e humanizados

Um estudo sem precedentes, publicado na renomada revista científica Nature em 10 de dezembro, está redefinindo a compreensão da ciência sobre a saúde mental. A maior análise genética de perturbações psiquiátricas já realizada concluiu que as variantes genéticas mais relevantes não atuam de forma isolada, mas estão conectadas a múltiplas condições simultaneamente.

A pesquisa, que analisou o DNA de mais de 1 milhão de pessoas de ascendência majoritariamente europeia, identificou que 14 transtornos psiquiátricos distintos podem ser classificados em apenas cinco grandes grupos biológicos. Essa descoberta sugere que doenças tratadas historicamente como distintas podem compartilhar a mesma “raiz” biológica.

Os cinco grupos genômicos da saúde mental

Liderado por Andrew Grotzinger, professor assistente do Instituto de Genética do Comportamento da Universidade do Colorado Boulder, o estudo utilizou correlações genéticas para mapear como os transtornos se sobrepõem. Os pesquisadores descobriram que condições aparentemente diferentes compartilham uma arquitetura genética comum.

A nova classificação proposta pelo estudo divide os transtornos nos seguintes fatores:

  • Compulsivo: Agrupa Anorexia Nervosa, Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) e Síndrome de Tourette.

  • Neurodesenvolvimento: Inclui o Transtorno do Espectro Autista (TEA) e o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH).

  • Internalizante: Reúne quadros de Depressão, Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT) e Ansiedade.

  • Uso de Substâncias: Abrange a dependência de álcool, cannabis, nicotina e opioides.

  • Psicótico (Esquizofrenia-Bipolar): Conecta a Esquizofrenia ao Transtorno Bipolar.

Essa categorização indica que distúrbios dentro do mesmo grupo podem resultar de mecanismos biológicos compartilhados. Para a medicina, isso representa uma oportunidade de desenvolver medicamentos que atuem em vias comuns, tratando múltiplas condições de forma mais assertiva.

O papel do cérebro e das células de suporte

O estudo foi além do agrupamento e identificou padrões biológicos únicos para cada fator. No grupo Esquizofrenia-Bipolar, por exemplo, os genes associados mostram forte atividade em neurônios excitatórios — células responsáveis por estimular a ativação de outros neurônios — e em regiões do cérebro ligadas à interpretação da realidade.

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Já no grupo Internalizante (depressão e ansiedade), a descoberta surpreendeu os cientistas. Os genes não estão ligados primariamente aos neurônios, mas sim à glia. As células da glia funcionam como suporte imunológico e estrutural, mantendo as conexões cerebrais.

Segundo Abdel Abdellaoui, geneticista da Universidade de Amsterdã, isso implica que tratamentos para depressão e ansiedade talvez devessem focar mais na saúde dessas células de suporte e no sistema imunológico do cérebro do que apenas na química neuronal tradicional.

Genética não é destino: O fator ambiental

Apesar do avanço no mapeamento do DNA, os especialistas alertam para o risco do determinismo genético. O estudo reforça que os genes não são o único fator determinante. Variantes genéticas ligadas a distúrbios psiquiátricos também estão associadas a características consideradas positivas ou neutras, como inteligência, criatividade, personalidade e até sucesso acadêmico.

A sobreposição genética entre esquizofrenia e transtorno bipolar, por exemplo, também se correlaciona com traços de persistência e criatividade. Isso levanta questões éticas importantes sobre a triagem genética de embriões em processos de fertilização in vitro (FIV).

Abdellaoui argumenta que selecionar embriões para evitar “riscos psiquiátricos” pode ser um erro, pois os mesmos genes que trazem vulnerabilidade também podem conferir resiliência e talentos cognitivos.

A interação com o ambiente é a chave. Ter a predisposição genética não garante o desenvolvimento de um transtorno. A doença mental surge, muitas vezes, na interseção entre a biologia e eventos adversos da vida, como traumas, estresse crônico ou ambiente social desfavorável.

Cautela na interpretação dos dados

Chunyu Liu, professor de psiquiatria na SUNY Upstate Medical University, destaca que as descobertas validam observações clínicas antigas, mas pede cautela. Embora a genética compartilhada explique as semelhanças, ela ainda não explica por que os sintomas variam tanto entre pacientes com o mesmo perfil genético.

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“Genes ou vias biológicas estatisticamente associadas a um distúrbio não devem ser interpretadas como causais sem evidências adicionais. Correlação não implica causalidade”, adverte Liu.

O estudo é um passo significativo para desestigmatizar as doenças mentais, reformulando-as não como “falhas de caráter”, mas como variações naturais da biologia humana que, sob certas condições de estresse, manifestam-se como transtornos. A compreensão desses mecanismos abre portas para um futuro onde o tratamento psiquiátrico seja mais preciso, biológico e menos baseado em tentativa e erro.


Com informações: Live Science e Nature.

 

Ciência

Ciência em foco: Do mapa 3D de 2,75 bilhões de edifícios à terapia inovadora para Huntington

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Pesquisadores criam o GlobalBuildingAtlas combinando imagens de satélite e IA; Austrália vira laboratório para estudar efeito de proibição de redes sociais em jovens; e neurologista revela sucesso de terapia gênica.


Mapeamento e Inovação Tecnológica

O cenário científico global foi marcado por avanços em tecnologia e mapeamento. Cientistas revelaram o GlobalBuildingAtlas, um mapa que renderiza 2,75 bilhões de edifícios em 3D com uma resolução de 3 metros por 3 metros. A criação, que combinou imagens de satélite e aprendizado de máquina, abre novas possibilidades para avaliação de risco de desastres, modelagem climática e planejamento urbano, segundo Xiaoxiang Zhu, coautor do estudo.

Outro destaque tecnológico é a nova abordagem de previsão do tempo aprimorada por inteligência artificial (IA). Pesquisadores combinaram um modelo de IA com um modelo climático baseado em princípios físicos e adicionaram ferramentas matemáticas para analisar estatísticas de eventos raros. Em testes iniciais, essa abordagem híbrida previu probabilidades de eventos climáticos extremos, como chuvas torrenciais e ondas de calor, com a mesma precisão do método anterior, mas de forma muito mais rápida.

Saúde e Desafios Sociais

Na área da saúde, a neurologista Sarah Tabrizi foi a principal consultora científica de um estudo que revelou uma terapia inovadora para a doença neurodegenerativa de Huntington. O tratamento, chamado AMT-130, é direcionado a genes e mostrou resultados impressionantes: reduziu a taxa de declínio da doença em 75%, medida por uma escala padrão de avaliação de funções motoras e cognitivas.

Em outro segmento da saúde, pesquisadores investigam a predileção do câncer pancreático pelo sistema nervoso. As células tumorais se espalham para os neurônios em quase todos os pacientes com a doença. O conhecimento sobre as estratégias que o tumor utiliza para sequestrar a atividade nervosa visa aprimorar as terapias, embora o campo da neurociência do câncer ainda esteja em estágio inicial.

No âmbito social, a decisão da Austrália de proibir o uso da maioria das redes sociais por crianças menores de 16 anos criou um experimento natural para cientistas sociais. Pesquisadores estão se preparando para estudar como a ausência das redes afeta a saúde mental dos adolescentes e suas conexões com os pares.

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Opinião e Reflexão

Em termos de opinião, o sociólogo Anthony Kaziboni argumenta que muitas instituições de ensino superior estão adotando ferramentas de ensino baseadas em IA apressadamente, não por acreditarem que sejam as melhores para a educação, mas por acharem que devem fazê-lo. A jornalista ambiental Tatiana Schlossberg compartilhou um artigo pessoal na The New Yorker, onde relata seu diagnóstico terminal de leucemia mieloide aguda e sua crescente preocupação com o sistema de saúde, em meio à ascensão de seu primo, Robert F. Kennedy Jr., ao cargo de secretário de saúde dos EUA.


Com informações: Nature Briefing

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Ciência

Estudo confirma relatividade de Einstein: O tempo passa mais rápido em Marte

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Pesquisa sugere que os relógios no planeta Vermelho adiantam cerca 477 microssegundos por dia terrestre, um fator que impõe novos desafios para a sincronização das futuras missões espaciais

Um novo estudo confirmou uma previsão da teoria da relatividade geral de Albert Einstein: o tempo passa de forma ligeiramente diferente em corpos celestes com diferentes forças gravitacionais. Cientistas descobriram que, em média, os relógios em Marte marcam $0,477\text{ milissegundos}$ ($477\text{ microssegundos}$) mais rápido em 24 horas quando medidos da Terra. Essa diferença é significativamente maior do que a observada na Lua ($56\text{ microssegundos}$ mais rápido por dia terrestre).

A pesquisa, conduzida pelos físicos Neil Ashby e Bijunath Patla do instituto Nacional de Padrões e Tecnologia no Colorado, utilizou fórmulas baseadas na física para calcular como a gravidade e a velocidade de Marte influenciam o tempo marciano, utilizando um nível de referência em Marte (o areóide) análogo ao nível do mar na Terra.

Fatores da Relatividade e Variações ⏳

De acordo com a relatividade geral, o tempo em uma área passa mais lentamente onde a gravidade é mais intensa. Embora a velocidade orbital mais lenta de Marte tenda a atrasar seus relógios, sua gravidade superficial mais fraca (cinco vezes menor que a da Terra ao nível do mar) os acelera em maior grau.

  • Flutuação Diária: Os pesquisadores descobriram que o desvio do tempo em Marte não é constante; ele varia diariamente em $226\text{ microssegundos}$ ao longo de um ano marciano.

  • Causa da Variação: Essa flutuação resulta do formato mais oval da órbita de Marte e das mudanças na força gravitacional de seus vizinhos celestes (incluindo o Sol e a Lua da Terra) à medida que se aproximam e se afastam do planeta.

  • Desafio para Comunicação: As grandes flutuações e a complexidade dos cálculos (que ainda apresentam uma imprecisão de cerca de $100\text{ nanossegundos}$ por dia) complicam os esforços para sincronizar o tempo em todo o sistema solar. O estabelecimento de um relógio padrão interplanetário seria crucial para futuras missões tripuladas e para a criação de canais de comunicação rápidos.

Os achados, publicados no The Astronomical Journal, fornecem uma base para futuros testes da relatividade geral, mas destacam os desafios da navegação e comunicação no futuro do sistema solar.


Com informações: Deepa Jain, Live Science

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Ciência

Restauração da cana-de-rio: O bambu nativo da América do Norte como baluarte contra a erosão e desastres climáticos

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Uma rede dedicada de cientistas, ambientalistas e povos indígenas está impulsionando o “renascimento da cana-de-rio” (rivercane), uma espécie de bambu nativa do Sudeste dos EUA. A planta, que desapareceu em mais de 98% devido à colonização, provou ser um elemento crucial na estabilização das margens de rios e na prevenção da erosão durante inundações e eventos climáticos extremos, como o furacão Helene.


O Poder Ecológico da Cana-de-Rio 🌱

A cana-de-rio costumava revestir riachos, rios e pântanos do Sudeste em densos povoamentos chamados canaviais. A sua estrutura subterrânea, composta por uma vasta rede de rizomas (caules resistentes logo abaixo da superfície do solo), é excepcionalmente eficaz na retenção do solo e das margens fluviais.

  • Baluarte contra Cheias: Um projeto no Tuckabum Creek, Alabama, demonstrou que as mudas de cana-de-rio sobreviveram a uma cheia de $2,7\text{ metros}$ e, crucialmente, mantiveram a margem do rio intacta. Durante o furacão Helene, cursos de água revestidos com cana-de-rio resistiram muito melhor à devastação.

  • Benefícios Ambientais: Além da estabilização das margens, a cana-de-rio oferece habitat crucial para espécies nativas (como mariposas) e funciona como um filtro, removendo nitratos e outros poluentes da água.

Restauração e Desafios Culturais 🏹

A Aliança de Restauração Rivercane (RRA), liderada por Michael Fedoroff da universidade do Alabama, está coordenando esforços de replantio em 12 estados do Sudeste, mantendo canaviais existentes e educando o público sobre os benefícios da planta.

  • Relevância Indígena: A inclusão de tribos, como a Nação Choctaw de Oklahoma, é essencial, pois a cana-de-rio tem um profundo papel cultural histórico. Povos nativos utilizavam a cana para fazer cestos, zarabatanas e flechas. Hoje, muitos artesãos estão voltando a usar a cana em seu artesanato pela primeira vez em décadas.

  • Barreiras à Restauração: Os principais desafios incluem a educação (a cana-de-rio nativa é frequentemente confundida e removida como o invasivo bambu chinês) e o alto custo e baixa disponibilidade das plantas em viveiros.

Inovação de Baixo Custo: O “Trem de Cana” 🚂

Para contornar o custo proibitivo das mudas (que podem custar até $50-60 por planta), a especialista Laura Young, da Virgínia, desenvolveu um método de propagação de baixo custo conhecido como “trem de cana”.

  • Metodologia: O método consiste em reunir pedaços de rizoma, plantá-los em sacos de sanduíche cheios de terra e usar as mudas propagadas. O custo total para iniciar um canavial pode ser de apenas $6.

  • Resultados: Embora o método de propagação seja imperfeito (diferentes variedades são ideais para diferentes locais), ele oferece uma maneira prática e barata para voluntários e proprietários privados se envolverem na estabilização das margens dos rios.

Com a colaboração entre cientistas, proprietários de terras e tribos, o movimento busca imaginar uma “ecologia futura que seja melhor”, oferecendo uma solução prática e de baixo investimento para curar a paisagem.


Com informações: Grist

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