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Ciência

Os exames de sangue que prometem prever doenças e revelar ‘idade real’ do corpo

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Nos EUA e Europa, uma explosão de novas empresas promete ajudar pessoas a ‘hackearem’ seus corpos

Nos últimos anos, tornou-se comum o uso de relógios e pulseiras que ajudam as pessoas a monitorar diversos aspectos de suas vidas que antes eram ignorados: as horas precisas de sono à noite, os batimentos cardíacos, a quantidade de passos dados durante o dia, as calorias queimadas ou o nível de oxigênio no sangue.

Surgiram novas empresas de tecnologia e saúde que prometem ajudar as pessoas a “hackearem” a sua saúde — ou seja, medir em números alguns aspectos da sua saúde e intervir diretamente em seus corpos, adotando dietas, mudando padrões de sono, fazendo exercícios físicos específicos e tomando suplementos ou remédios.

O termo usado por muitas dessas empresas é biohacking — ou seja, reprogramar o próprio corpo da mesma forma que hackers reprogramam computadores.

Agora, algumas novas empresas — principalmente nos Estados Unidos e na Europa — prometem dar um passo além.

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Elas oferecem exames de sangue que prometem monitorar biomarcadores, sinais dentro dos nossos corpos que são mensuráveis e que podem nos fornecer informações sobre o estado atual da nossa saúde.

Esses sinais podem ser desde moléculas, a genes e a níveis de hormônios e vitaminas.

As empresas coletam essas informações com alguma frequência — de três em três ou de seis em seis meses — e oferecem diversos serviços a seus clientes.

Algumas empresas usam os dados para calcular a “idade biológica real” ao comparar os biomarcadores de uma pessoa com os do resto da população. É o chamado “relógio epigenético”.

Uma pessoa pode ter 60 anos de idade, por exemplo, mas ter “um corpinho de 50”. Assim, embora a idade considerada real — ou cronológica — seja 60, diversos biomarcadores indicam que seu corpo é comparável ao de alguém de 50 anos.

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Um desses biomarcadores pode ser, por exemplo, a chamada metilação do DNA.

Trata-se de um processo químico que acontece dentro das nossas células, mas sem alterar a estrutura do DNA.

Cientistas acreditam que existe uma ligação forte entre a metilação do DNA e a idade “biológica”. E existem processos em estudo que poderiam ajudar a conter e até mesmo reverter a metilação.

O que essas empresas afirmam é que a idade “biológica” pode ser mais relevante para a saúde de uma pessoa do que sua idade cronológica ou real.

Além disso, ao contrário da idade cronológica, existiriam formas de intervir e fazer a idade regredir biológica — até certos limites —, com mudanças de hábitos, estilos de vida e uso de suplementos.

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Além da ideia de “hackear” o próprio corpo, alguns biomarcadores poderiam servir como alertas para doenças, como câncer.

Ao mesmo tempo, a multiplicação de empresas que oferecem esses serviços é alvo de críticas entre especialistas que alertam que isso pode gerar uma demanda desnecessária por serviços que são caros e podem desencadear um ciclo interminável de exames e tratamentos.

Isso estaria mais a serviço dos interesses financeiros das companhias que atuam no setor do que de seus clientes.

Eles também alertam que a tecnologia não é 100% precisa e pode levar a diagnósticos equivocados e que as promessas de algumas empresas que apresentam seus serviços como um “elixir da juventude” pode ludibriar consumidores.

Idade biológica

A ideia de monitorar biomarcadores não é nova. Na verdade, qualquer exame de sangue feito em laboratório há décadas já são testes de biomarcadores.

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A hemoglobina A1c, uma molécula presente nas células do nosso sangue, por exemplo, é um biomarcador para diagnosticar diabetes.

As duas grandes novidades no setor são o desenvolvimento de tecnologias para analisar esses dados e, principalmente, a queda nos custos de fazer estes exames.

“Esse teria sido um produto muito difícil de lançar no mercado há dez anos, porque o custo de exames era muito mais alto”, diz à BBC News Brasil o presidente da Lifeforce, Dugal Bain-Kim.

No Brasil, laboratórios de exames já fazem análises de biomarcadores há anos, sob pedido dos médicos. Mas ainda não existe no mercado brasileiro empresas como essas que estão surgindo na Europa e nos EUA, em que diversos biomarcadores são monitorados em conjunto e com periodicidade frequente.

A Lifeforce é uma das empresas que surgiu no boom recente do mercado de biomarcadores.

“O custo dos testes caiu e, pelo menos nos Estados Unidos, por meio de serviços de coleta [de sangue] em casa, você pode fazer esse tipo de coisa a um preço muito mais acessível.”

Fundada há três anos na Califórnia, a Lifeforce afirma já ter realizado mais de 50 mil exames de sangue.

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O modelo de negócios desta e de outras empresas do tipo é parecido com o de outros negócios de tecnologia como Netflix ou Spotify, baseado em assinaturas.

Ao contratar o serviço, o cliente tem seu sangue examinado de tempos em tempos — indo a um centro de coleta ou usando kits caseiros.

As empresas dizem que conseguem reduzir os preços dos exames devido ao alto volume com que costumam lidar.

A Function Health — outra destas novas empresas — afirma que, se uma pessoa fosse encomendar no mercado cada um dos exames de biomarcadores de seu pacote, gastaria cerca de US$ 15 mil (quase R$ 80 mil).

A assinatura anual da Function Health custa cerca de US$ 500 (R$ 2,6 mil). A empresa oferece exames anuais de mais de 100 biomarcadores e testes trimestrais ou semestrais de outros 60.

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Já o pacote da Lifeforce custa US$ 349 (R$ 1,8 mil) no primeiro mês e depois US$ 129 (R$ 680) por mês.

A empresa testa com frequência 40 biomarcadores, como hormônios, nutrientes e condições metabólicas, e oferece um acompanhamento por uma equipe médica, que cria um plano personalizado para “otimizar” a saúde do assinante.

‘Medicina 3.0’

Um dos lemas repetidos pelas empresas é “pare de adivinhar, comece a medir”.


“Quando perguntamos a nossos clientes ‘você é saudável?’, a resposta mais comum é ‘acho que sim, porque não estou doente ou não tenho nenhuma doença grave’”, afirma Bain-Kim, da Lifeforce


“Mas, quando realmente analisamos o que está acontecendo ‘embaixo do capô’, 25% dos novos membros estão com a saúde abaixo do ideal; 23% deles estão em estágio de pré-diabetes, por exemplo. E a maioria não sabe disso.”

Os resultados dos exames são colocados em um painel de um aplicativo que exibe os dados em gráficos de forma didática.

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O primeiro passo é usar os biomarcadores para tentar detectar as doenças mais preocupantes — como problemas cardíacos, câncer e demência.

Outro objetivo dos exames é montar planos personalizados para fazer a idade biológica regredir e melhorar a qualidade de vida dos clientes.

“Um dos grandes problemas no setor de saúde para os consumidores é a fragmentação [das informações]”, diz Bain-Kim.


“As pessoas falam com seus médicos, mas depois tomam um suplemento, talvez porque viram no Instagram, e adotam uma dieta que viram em outro lugar. O consumidor acaba tendo que integrar todas essas informações sozinho.”


Os planos incluem planejamento de dieta, estresse, sono, suplementos e medicamentos — já que a empresa conta com médicos que podem receitar.

Mas por que alguém assinaria um plano de monitoramento de saúde tão detalhado?

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Para se manter com a saúde em dia, não bastaria realizar uma bateria de exames comum e seguir as recomendações de praxe, como comer bem, se exercitar ou controlar as horas de sono?

Este é um grande debate no mundo da Medicina hoje em dia.

A noção de que as pessoas devem realizar mais exames se popularizou graças às novas empresas que surgiram no setor e também a médicos que escrevem livros e falam sobre o assunto no YouTube.

Um dos livros mais influentes é Outlive: A Arte e a Ciência de Viver Mais e Melhor (Intrínseca, 2023), do médico canadense Peter Attia, em que ele diz que o mundo está chegando um ponto que chama de “Medicina 3.0”.

Segundo o livro, nos dois estágios anteriores, a medicina se desenvolveu como uma ciência e ajudou a tratar condições graves de saúde.

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No terceiro, que estaria começando agora, poderá ajudar a estender a vida das pessoas com foco na prevenção e não no tratamento de doenças.

Isso só seria possível, segundo Attia, por causa do desenvolvimento tecnológico da humanidade.

Attia defende que as pessoas monitorem — com o devido acompanhamento médico — diversos biomarcadores com frequência.

Não apenas os mais comuns, como colesterol e glicose, mas outros que ajudem a medir os riscos de ataque cardíaco, derrame, câncer e doenças neurodegenerativas.

Um exemplo desses testes avançados de biomarcadores é o Galleri, desenvolvido pela empresa californiana GRAIL, e detecta sinais para mais de 50 tipos de câncer.

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O Galleri verifica mais de 1 milhão de locais específicos no DNA para detectar sinais da doença.

O exame em si não diagnostica o câncer, mas ajuda a dar pistas de tumores que podem se desenvolver.

Após o Galleri, é preciso realizar mais investigações com acompanhamento médico para se chegar a um diagnóstico preciso.

Disponível apenas nos Estados Unidos, o exame custa US$ 949 (mais de R$ 5,1 mil), não costuma ser coberto por planos de saúde e só pode ser feito com prescrição médica.

Esses preços e barreiras mostram que a “Medicina 3.0” ainda é um conceito acessível apenas a pessoas com mais dinheiro.

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Segundo Bain-Kim, da Lifeforce, seus clientes têm necessidade de entender melhor o que podem fazer por sua saúde, em vez de seguir apenas as recomendações gerais de alimentação e exercício emitidas pelas autoridades de saúde.


“No meu caso, tenho um histórico familiar de doenças cardíacas, mas, fora isso, estou razoavelmente em boa forma”, diz.


“Olhando para mim ou para meus hábitos de vida, seguindo as diretrizes gerais de saúde da população, você não diria que eu precisaria mudar nada na minha vida.”

No entanto, afirma Bain-Kim, quando começou a rastrear seus biomarcadores, ele descobriu, conforme os resultados dos exames, que tinha um risco elevado de ter ataques cardíacos e derrames.

“Ou seja, estava seguindo todas as diretrizes das autoridades de saúde, mas os dados e os biomarcadores mais relevantes estavam apontando que eu estava na direção errada.”

Bain-Kim diz que, a partir desses dados — que são confirmados por um histórico familiar de problemas cardíacos —, passou a seguir uma dieta específica para reduzir estes riscos.

“Em termos de risco de ataque cardíaco, eu não estou apenas na média, eu tenho risco maior. Portanto, eu preciso fazer mais coisas contra esse risco do que uma pessoa mediana faria.”

Críticas e perigos

A explosão de novas empresas oferecendo exames de biomarcadores também despertou críticas entre acadêmicos.

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Em um artigo no Journal of the American Medical Association, dois pesquisadores alertam para o marketing agressivo do setor.

Os autores argumentam que, mais do que atender às necessidades dos pacientes, podem estar servindo aos interesses econômicos de empresas, hospitais e laboratórios, que estariam fabricando um novo mercado baseado em serviços pelos quais são cobrados preços elevados dos consumidores.

É um fenômeno que eles chamam de biomarkup — um trocadilho em inglês que combina biomarcadores e aumento de preços.


“É um quadro complicado. Biomarcadores são essenciais para monitorar doenças e respostas a terapias e gerar diagnósticos precisos. Mas ao mesmo tempo há forças econômicas poderosas que tendem a usar biomarcadores para gerar mais tratamentos e mais exames”, disse à BBC News Brasil Kenneth Mandl, do Departamento de Informática Biomédica da Harvard Medical School, nos Estados Unidos, e um dos autores do artigo.


Outro risco, segundo Mandl, é a existência de falsos positivos. A tecnologia de testes de laboratório não é 100% precisa, e, às vezes, alguns exames diagnosticam equivocadamente uma doença em um paciente saudável.

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Em muitos laboratórios, a precisão é de 95%. Ou seja, a cada 20 exames realizados, um deles está errado, em média.

Os falsos positivos são problemáticos não só porque geram ansiedade e medo no paciente. Também podem desencadear uma série de novos exames e até mesmo tratamentos que, além de serem inúteis para alguém saudável, geram gastos desnecessários.

Outro estudo de Mandl estima que falsos positivos geram gastos desnecessários da ordem de US$ 4 bilhões (mais de R$ 20 bilhões) por ano só em casos de câncer de mama nos Estados Unidos.

Mas o pesquisador de Harvard acredita que há uma oportunidade importante na explosão de empresas de exames de biomarcadores com uso de inteligência artificial.

Os novos avanços podem aumentar substancialmente a margem de precisão dos exames, diminuindo os falsos positivos.

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Isso acontece porque a inteligência artificial permite que os laboratórios examinem diversos biomarcadores e outros fatores — como histórico familiar — ao mesmo tempo, em vez de basear seus diagnósticos em apenas um marcador.

Bain-Kim diz que sua empresa está montando uma base de dados com os exames de seus clientes que é usada para treinar modelos de inteligência artificial para melhorar a precisão das análises.


“Acho que há oportunidades, mas também riscos. É muito importante discernir esforços que são projetados para gerar mais testes e aumentar receita daqueles que são realmente projetados para melhorar a saúde. Essa distinção nem sempre é óbvia, nem mesmo para quem está trabalhando no setor”, diz Mandl.


O pesquisador de Harvard defende mais atenção das autoridades de regulação e também maior educação dos consumidores por meio de campanhas.

O presidente da Lifeforce concorda que esse é um problema para os consumidores.

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“Há empresas que estão fazendo isso da maneira certa e outras que não estão. Que não estão coletando os dados certos ou os interpretando da maneira certa”, diz Bain-Kim.

“Há muito entusiasmo no setor. E há também todos os perigos que acompanham isso. O consumidor precisa ter bastante atenção.”

Ele também alerta para empresas que prometem soluções que se apresentam como um “elixir da juventude”.

“Há empresas de biotecnologia que estão trabalhando em moléculas e coisas do tipo para prolongar a vida humana. Mas esse tipo de promessa de elixir da juventude está muito distante.”

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Fato Novo com informações e imagens: Correio Braziliense

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Ciência

Jovens para sempre: será mesmo possível evitar o envelhecimento?

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“Eu sou aquele maluco que está tentando não morrer”, diz Bryan Johnson, com uma dose de orgulho e outra de humor, na bio do seu Instagram. Nas redes sociais, o empresário americano de 46 anos detalha seus esforços para voltar a ter o organismo de alguém com 18. A lista inclui fazer exercícios de “um atleta profissional de rejuvenescimento” (como ele mesmo se define), seguir uma dieta ultrarregrada (com direito a uma “mistura da longevidade” que contém alguns dos seus 111 suplementos diários) e ter uma noite de sono perfeita (o que exige, entre outras condições, encontrar o travesseiro da espessura certa para não bloquear a circulação das veias do pescoço).

Não para por aí. Johnson, que diz investir cerca de US$ 2 milhões por ano na tentativa de rejuvenescer, também teria editado seu DNA “em uma ilha secreta para viver para sempre” e recebido “300 milhões de células-tronco” para ter “articulações super-humanas”, segundo anuncia aos seus mais de 1 milhão de inscritos no YouTube. Todo o esforço é acompanhado por uma equipe que o empresário contratou em 2021 para analisar pesquisas sobre longevidade e monitorar dados sobre os órgãos dele.

Na descrição do seu canal, o americano declara que, graças ao seu “protocolo”, já “alcançou uma saúde metabólica equivalente ao top 1,5% dos jovens de 18 anos, 66% menos inflamação do que a média para uma criança de 10 anos e reduziu sua velocidade de envelhecimento em 31 anos”. Sim, segundo o próprio, foi possível estimar tudo isso com rigor científico. Tanto que, hoje, comemora seu aniversário a cada 19 meses.

O milionário não está sozinho nesse empenho, e chegou a criar o ranking Rejuvenation Olympics (“Olimpíadas do rejuvenescimento”, em tradução livre), para competir com outras pessoas pela menor taxa de envelhecimento. Quem lidera a disputa atualmente é Brooke Paulin — biohacker que vive em Chicago e que, no Instagram, ostenta orgulhosa a ideia de que envelhece só “0,64 ano” a cada 12 meses.

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Ciência

Como o código de barras, que completa 50 anos, revolucionou o comércio global

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O primeiro código de barras moderno foi escaneado há 50 anos – em um pacote de 10 chicletes, em um supermercado, em Troy (EUA).

Cinquenta anos remete a um tempo antigo para a maioria das tecnologias, mas essa ainda está em alta. Mais de 10 bilhões de códigos de barra são lidos todos os dias em todo o mundo. E novos tipos de símbolos, como os códigos QR, criaram ainda mais usos para a tecnologia.

Eu teria sido como a maioria das pessoas, sem nunca pensar duas vezes na humilde codificação, se minha pesquisa como acadêmico de mídia na Universidade Clemson (EUA) não tivesse tomado alguns rumos estranhos. Em vez disso, passei um ano da minha vida vasculhando os arquivos e artigos de jornais antigos para saber mais sobre as origens deste método visual legível por máquinas – e acabei escrevendo um livro sobre a história cultural do código de barras.

Embora ele não tenha anunciado o fim dos tempos, como os teóricos da conspiração chegaram a temer, deu início a uma nova e revolucionária era no comércio global.

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Os códigos de barras foram uma invenção da indústria de alimentos

Apesar de o mundo ter mudado muito desde meados da década de 1970, o Código Universal de Produto (UPC) – no qual a maioria das pessoas pensa quando ouve a palavra “código de barras” – não mudou. Ele foi escaneado pela primeira vez (no histórico pacote de chicletes) em 26 de junho de 1974 e continua, basicamente, idêntico aos bilhões de códigos de barras lidos em lojas de todo o mundo, atualmente.

Quando o primeiro UPC foi escaneado, era o resultado de anos de planejamento do setor de supermercados dos Estados Unidos. No final da década de 1960, os custos de mão de obra estavam aumentando rapidamente e o inventário (contagem, identificação e classificação dos produtos) estava se tornando cada vez mais difícil de rastrear. Os executivos do ramo esperavam que o novo método de leitura digital pudesse ajudá-los a resolver esses dois problemas, e acabaram acertando.

No início da década de 1970, o setor criou um comitê que desenvolveu o padrão de dados UPC e escolheu o símbolo de código de barras da IBM (empresa de tecnologia da informação), em vez de meia dúzia de designs alternativos. Tanto o padrão de dados quanto o símbolo ainda são usados até hoje.

Com base nas notas de reuniões que encontrei no Arquivo Goldberg da Stony Brook University, as pessoas que desenvolveram o sistema UPC achavam que estavam fazendo um trabalho importante. Entretanto, elas não tinham ideia de que estavam criando algo que sobreviveria por tanto tempo.

Até mesmo as estimativas otimistas do setor de supermercados previam que menos de 10.000 empresas usariam códigos de barras. Como resultado, a digitalização do primeiro código de barras UPC recebeu pouca atenção na época.

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Alguns jornais publicaram artigos curtos sobre o evento de lançamento, mas não foram exatamente notícias de primeira página. A importância só se tornou aparente anos mais tarde, à medida que os códigos de barras se tornaram uma das infraestruturas de dados digitais de maior sucesso no mundo.

Os códigos de barras criaram uma revolução no espaço de prateleiras

A invenção não mudou apenas a experiência de finalização de uma compra. Ao tornar os produtos legíveis por máquina, eles permitiram grandes melhorias no rastreamento de estoque. Isso significava que os itens que vendiam bem poderiam ser reabastecidos rapidamente quando os dados indicassem, exigindo menos espaço nas prateleiras para qualquer produto individual.

Como escreveu o especialista em código de barras Stephen A. Brown, a redução da necessidade de espaço nas prateleiras permitiu uma rápida proliferação de novos produtos. Você pode culpar os códigos pelo fato de seu supermercado vender 15 tipos de pasta de dente quase indistinguíveis.

Da mesma forma, as superlojas de hoje, provavelmente, não existiriam sem a enorme quantidade de dados de inventário que os sistemas produzem. Como disse o professor Sanjay Sharma, do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), “se os códigos de barras não tivessem sido inventados, todo o layout e a arquitetura do comércio seriam diferentes”.

Outros setores aderiram rapidamente

O mecanismo nasceu no setor de supermercados, mas não ficou confinado aos corredores de alimentos por muito tempo. Em meados da década de 1980, o sucesso do sistema UPC incentivou outros setores a adotar os códigos de barras. Por exemplo, em um período de três anos, o Walmart, o Departamento de Defesa e o setor automotivo dos Estados Unidos começaram a usá-los para rastrear objetos nas cadeias de suprimentos.

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As empresas privadas de transporte também adotaram o mecanismo para capturar dados de identificação. A FedEx e a UPS (setores de remessas) até criaram seus próprios símbolos de código de barras.

Como explicou o sociólogo Nigel Thrift, no final da década de 1990, eles tornaram-se “um elemento crucial na história da nova forma de mundo”. Ajudaram a permitir a rápida globalização de formas que seriam difíceis de imaginar se não existissem.

Preto e branco e despercebido por toda parte

Para alguém que ficou tão interessado nesta história – como eu, que fiz uma tatuagem no meu braço do código de barras do International Standard Book Number do meu último livro -, a passagem silenciosa do 50º aniversário do código de barras parece quase poética.

Cresci em um mundo onde eles estavam por toda parte: nos produtos que comprei, ingressos de shows que digitalizei, pacotes que recebi.

Como a maioria das pessoas, raramente pensei neles, apesar – ou talvez por causa – de sua onipresença. Só quando comecei a pesquisar para meu livro é que percebi como um código de barras em uma embalagem de chiclete desencadeou uma cadeia de eventos que transformou o mundo.

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Por décadas, eles têm sido um cavalo de batalha operando no pano de fundo de nossas vidas. Os humanos modernos os escaneiam inúmeras vezes todos os dias, mas raramente pensamos neles porque não são chamativos e simplesmente funcionam – na maioria das vezes, pelo menos.

À medida que os códigos de barras continuam a se movimentar em sua velhice, eles são um lembrete de que as tecnologias aparentemente enfadonhas costumam ser muito mais interessantes e importantes do que a maioria das pessoas imagina.

Este artigo foi escrito por Jordan Frith, professor de comunicação da Universidade Clemson, nos Estados Unidos. O texto foi publicado originalmente no site The Conversation.


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Ciência

Para matar mamutes, primeiros americanos faziam armadilhas em vez de atirar lanças

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Desenhos em cavernas que retratam a caça de mamutes costumam mostrar ataques feitos com lanças. Mas essa não era a única forma que os antigos humanos tinham para abater esses animais. Pesquisadores da Universidade da Califórnia em Berkeley, nos Estados Unidos, descobriram que os primeiros humanos das Américas usavam pedras cortantes para caçar bichos que habitavam o continente há 13 mil anos.

Em um artigo divulgado na última quarta-feira (21) no periódico PLOS ONEos cientistas apresentaram os achados de um estudo que reexaminou várias evidências históricas. O estudo revelou que, durante a Era Glacial, os humanos empregavam armadilhas para capturar presas como mamutes.

Um dos primeiros grupos humanos a se estabelecer no continente norte-americano foi o povo de Clóvis, que surgiu no final da Era Glacial. Esse nome foi atribuído devido à descoberta predominante de seus artefatos na cidade de Clovis, nos Estados Unidos. Eles são conhecidos por suas lanças afiadas, denominadas “pontas de Clovis”. Você pode ver um exemplo delas abaixo.

As pontas de Clovis, feitas a partir de diferentes materiais — Foto: Scott Byram
As pontas de Clovis, feitas a partir de diferentes materiais — Foto: Scott Byram

Anteriormente, acreditava-se que esse povo utilizava essas armas como lanças de longo alcance para a caça. No entanto, ao reexaminar artefatos arqueológicos e conduzir o primeiro estudo experimental com armas de pedra, os pesquisadores descobriram que os humanos podem ter colocado suas lanças no chão e inclinado a arma para cima, criando uma espécie de armadilha para empalar os animais. Essa técnica teria permitido que a força da investida penetrasse de forma mais profunda no corpo da presa.

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