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Entrevista

‘Democracia vive um tempo de crise’, diz dom Jaime Spengler, presidente da CNBB

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Em entrevista ao Brasil de Fato, religioso admite que celibato para padres poderia ser “revisado” e “revogado”

Na presidência da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) desde maio de 2023, representante da igreja Católica no Brasil, Dom Jaime Spengler tem feito um mandato discreto, no espírito de sua eleição considerada, à época, uma alternativa à polarização entre direita e esquerda que ultrapassou o processo eleitoral de 2022 e chegou aos corredores da organização.

Em entrevista ao Brasil de Fato, Spengler lamentou o momento político do país e afirmou que “a democracia vive um tempo de crise. Aquilo que limita a participação de muitos no necessário debate político, salta aos olhos. Junto com a crise da democracia, é latente uma desafiadora crise ética”.

Por e-mail, o presidente da CNBB falou também sobre o movimento de padres que pedem a liberação do casamento e o fim do celibato para os clérigos. “Este é um tema que sempre retorna. O celibato é uma norma disciplinar da Igreja de tradição latina, introduzida a mais ou menos mil anos. Neste horizonte poderia ser revisada, revogada”, explicou Spengler.

Também arcebispo de Porto Alegre (RS), o religioso falou ainda sobre as enchentes que tomaram conta da capital gaúcha, em maio deste ano, após fortes chuvas na região.

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Sgundo ele, a Arquidiocese de Porto Alegre foi atingida pelas enchentes. O religioso afirma que as inundações “foram sim fruto de fatores climáticos que necessitam urgentemente de atenção. Foram também expressão da negligência da própria sociedade.”

Dom Jaime Spengler nasceu em Gaspar (SC), no dia 6 de setembro de 1960. Em 1982 entrou para a Ordem dos Frades Menores em Rodeio (SC). O presidente eleito da CNBB estudou Filosofia no Instituto Filosófico São Boaventura, no Paraná, e Teologia no Instituto Teológico Franciscano, no Rio de Janeiro.

Em novembro de 2010, foi nomeado pelo papa Bento XVI como bispo titular de Patara. No ano seguinte, em fevereiro de 2011, o bispo foi ordenado na paróquia São Pedro Apóstolo, em Gaspar. Em 18 de setembro de 2013, o papa Francisco nomeou dom Jaime Spengler como novo arcebispo de Porto Alegre.

Confira a entrevista na íntegra:

Brasil de Fato: Gostaria de saber como o senhor tem visto a polarização política em nosso país. A eleição do senhor, em abril de 2023, também foi margeada por aspectos que refletiam a atmosfera política do país, com discussões sobre posicionamentos de bispos que estão mais à esquerda ou mais à direita.

Dom Jaime Sprengler: A polarização política tem marcado, sobretudo, a história recente do país, presente tanto no âmbito digital como físico. Isto não é privilégio do Brasil. Pode-se dizer que é o processo no qual a opinião se baseia em pontos de vista que não reconhecem aquilo que creem que seja o ponto de visto do outro. Ela se sustenta em dois grupos de pessoas que discordam, e cada um acreditando que o outro é totalmente culpado pelo que está em debate ou em questão; as posições defendidas por um e outro grupo são consideradas irremediáveis filosófica, política e moralmente. Alimentar a polarização produz obtusidades, fecha espaços de construção social, impede a promoção do necessário diálogo, especialmente quando em questão está o bem comum.

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Os bispos são pessoas que fazem parte da sociedade humana, são cidadãos e, consequentemente, se sentem corresponsáveis pelo bem comum. De forma ainda mais característica por acreditarem, testemunharem e anunciarem o Evangelho da Vida. Neste sentido, é inspiradora a expressão de Jesus: “Eu vim para que todos tenham vida e vida em abundância” (Jo 10,10). Por isso, onde a vida é ferida, desrespeitada ou até mesmo ignorada não podemos nos calar. Os bispos são eleitos, em cada tempo da história, para serem colaboradores da Igreja na obra da evangelização marcada por âmbitos característicos. Na história recente do Brasil, a Igreja tem demonstrado empenho decisivo em favor dos direitos humanos, da vida, da democracia, dos povos originários, dos urgentes e necessários cuidados e respeito pela Casa Comum.

Brasil de Fato: O que é democracia para o senhor? Como ela se manifesta e qual seu atual estágio em nosso país?

Recentemente, o Papa Francisco usou uma expressão simples que expressa com clareza e objetividade o que é a democracia: “Democracia é resolver ‘juntos’ os problemas de todos”. Ou, se quisermos, podemos usar outra forma para dizer o que seja democracia: é o ordenamento civil por meio do qual as forças sociais, jurídicas e econômicas cooperam proporcionalmente para a promoção do bem comum, em favor de toda a sociedade, com especial atenção aos mais fragilizados, ou numa outra expressão, aos que estão nas periferias existenciais – e que, na nossa realidade nacional, são uma multidão.

A realidade atual da nação exige coragem e determinação para avançar em maior rapidez e eficiência na construção, aplicação, acompanhamento e avaliação de políticas públicas capazes de integrar o maior número de pessoas no seio da sociedade, a fim de que justiça e paz possam se abraçar.

Brasil de Fato: Recentemente, tivemos a votação no Congresso Nacional de pautas que estão nas Casas Legislativas de grande parte do mundo, o aborto e a liberação da maconha. Parte da resistência ao avanço nessas pautas é feita por religiosos. O senhor acredita que a fé e a crença individual deva pautar a legislação de uma nação?

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Nossa sociedade está marcada pelos valores da tradição cristã; são, hoje, muitas as expressões desta tradição. Ora, a fé cristã é expressão de uma experiência de encontro com uma pessoa – Jesus Cristo. Neste sentido, vale recordar a celebre expressão de Bento XVI: “no início do ser cristão, não há uma decisão ética ou uma grande ideia, mas o encontro com um acontecimento, com uma Pessoa que dá à vida um novo horizonte e, desta forma, o rumo decisivo”.

As pautas citadas implicam diretamente na vida de pessoas que se orientam pela fé e crenças. A Igreja como uma instituição reconhecida, com direitos e deveres, tem a responsabilidade de participar dos debates públicos que envolvam temas relacionados à vida em todas as suas dimensões. O parlamento, espaço de debate e de construção de legislação, não pode não estar atento àquilo que a sociedade espera de seus representantes. Infelizmente, há um sentimento difuso de descrédito em relação aos poderes públicos; as razões de tal situação são variadas. A própria democracia vive um tempo de crise. Aquilo que limita a participação de muitos no necessário debate político, salta aos olhos. Junto com a crise da democracia, é latente uma desafiadora crise ética.

Tais pautas não podem ser conduzidas por ideologias ou interesses espúrios. Urge coragem e determinação para promover o necessário debate, levando em consideração valores éticos, avanços científicos e elementos antropológicos da tradição judaico-cristã, quais sustentáculos da nossa cultura.

A ideia do sofrimento, por exemplo, das inúmeras mulheres que sofrem formas distintas de abuso é altamente importante considerar. O argumento sobre o desrespeito pelo corpo da mulher toca um aspecto do convívio social merecedor de especial atenção. Mas é também importante o respeito pelo corpo da criança, que segundo dados da própria ciência é outro em relação ao da mãe. Estes poderiam ser alguns aspectos que tornam o debate em torno do aborto delicado.

No que tange ao projeto, dito, de liberação da maconha há também aspectos delicados. Não faltam estudos que apontam para graves danos cerebrais, neurológico, sobretudo em usuários adolescentes e jovens da referida planta. No passado tive oportunidade de cooperar num centro de recuperação de dependentes químicos. Afirmar o uso recreativo da maconha aponta para um limite delicado. É preciso maior honestidade no debate em torno desta temática. Uma família que possui no seu núcleo um viciado sabe – e sofre – as consequências de tal hábito.

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Poder-se-ia, neste contexto, invocar a liberdade. Mas, o que é a liberdade? Não certamente poder realizar o que cada um decide. Tal compreensão leva a caminhos, no mínimo, perigosos. Liberdade é, antes de tudo, libertação contínua da nossa inalienável dignidade: sede de vida e de amor que vence ódio e morte. A liberdade pressupõe discernimento e responsabilidade; são elementos adquiridos quando se busca a honestidade e se reconhece a própria limitação.

Brasil de Fato: Como o senhor vive a experiência das enchentes que tomaram conta do Rio Grande do Sul? Ela chegou até o senhor? Dois meses após as enchentes, há uma análise sobre o que aconteceu?

As fortes chuvas que se abateram o Rio Grande do Sul em fins de abril e durante o mês de maio, produziram muita destruição e morte. O número de municípios, e consequentemente de comunidades, famílias, pessoas atingidas foi enorme. A região metropolitana de Porto Alegre, território da Arquidiocese, foi duramente atingida.

As enchentes foram sim fruto de fatores climáticos que necessitam urgentemente de atenção. Foram também expressão da negligência da própria sociedade. Tais fenômenos sempre aconteceram ao longo do tempo. Entretanto a frequência maior de tais fenômenos chama a atenção de muitos – também em várias cidades do Brasil; e a comunidade científica não se cansa de lançar alertas. Há cidades no Rio Grande do Sul que nos últimos 12 meses, sofreram três enchentes seguidas e devastadoras.

A região metropolitana conta com um complexo sistema de proteção contra cheias, cuja construção teve seu início na década de 70. Todavia o projeto não foi totalmente concluído, além de carecer de manutenção ao longo dos anos. O número de flagelados foi enorme. Empresas, fábricas, comércios grandes e pequenos situados nas regiões mais baixas foram fortemente atingidas.

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A tragédia fez com que viesse o melhor de uma multidão – no Brasil e no exterior. Não recordo de haver testemunhado um mutirão de solidariedade tão expressivo na história recente do Brasil; sinal de que entre nós existem pessoas boas, que testemunham compaixão e solidariedade. Digno de destaque o número de voluntários provenientes de distintas regiões de nosso Brasil, dispostos a colaborar no que fosse necessário: atendimento primário aos flagelados, atendimento à saúde, preparo de alimentação, seleção e distribuição dos donativos que chegaram, colaboração no árduo e delicado trabalho de limpeza. O empenho das Forças Armadas, da Defesa Civil, Bombeiros, a dedicação de tantos jovens ficará certamente como uma característica marcante na história da região. Vimos a fraternidade personalizar-se, pois como disse o Papa Francisco “perante o sofrimento, onde se mede o verdadeiro desenvolvimento dos nossos povos, descobrimos e experimentamos a oração sacerdotal de Jesus: ‘Que todos sejam um só (Jó 17, 21)’”.

Precisamos também reconhecer que no meio da tragédia, infelizmente, veio também o pior de alguns: roubos, desvios, saques, o tráfico buscando marcar territórios, oportunistas no meio da tragédia buscando tirar vantagens para si, em vistas de ‘projetos pessoais’ futuros.

Merece, contudo, destaque, reconhecimento, gratidão a solidariedade de muitos. Rezo para que todos que de uma forma ou de outra se engajaram no socorro e atendimento das necessidades dos flagelados sejam recompensados não com o dobro, mas com a medida do Evangelho: cem vezes mais. É em situações semelhantes que se pode perceber em que consiste a humanidade do ser humano. Todo auxílio é, sim, sempre auxílio em favor de alguém. Mas é também expressão do que cada ser humano é, traz no seu interior, ou ‘construiu’ ao longo da própria existência.

Brasil de Fato: Como o senhor dialoga com o movimento dos padres que pedem a liberação do casamento e o fim do celibato? O Papa chegou a dizer que colocaria essa discussão na agenda da Igreja.

Este é um tema que sempre retorna. O celibato é uma norma disciplinar da Igreja de tradição latina, introduzida a mais ou menos mil anos. Neste horizonte poderia ser revisada, revogada. Trata-se de uma forma de vida que certamente exige disciplina, determinação, coragem, fé. É também, de algum modo, uma opção de vida.

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Creio que se faz necessário promover espaços amplos de diálogo sobre este tema. É uma realidade que merece particular atenção. Há certamente na norma disciplinar aspectos positivos. Há também aspectos antropológicos que não podem ser desconsiderados num possível espaço de diálogo e estudo sobre o tema.

Na celebração do Sínodo da Amazônia se chegou a falar sobre este tema. Contudo, o debate não avançou. Imagino ser necessário coragem e parresia para avançar. Não se trata simplesmente de ser a favor ou contra. A ordenação sacerdotal é para sempre, mesmo quando o padre, por acaso, deixar a Igreja, pedindo dispensa das obrigações do ministério. Dentro da Igreja Católica, sacerdotes das igrejas que seguem ritos orientais podem contrair matrimônio. Por isso, não há contradição no caso de sacerdotes contraírem matrimônio.

Brasil de Fato: Por fim, como o senhor tem visto a resistência à agenda implementada pelo Papa Francisco, que prevê um maior engajamento da Igreja na luta pelo Meio Ambiente, aliança com movimentos sociais e uma agenda econômica crítica ao capitalismo.

A questão do cuidado pela “Casa Comum” envolve a todos, sem distinções. Uma pergunta que poderia nortear o engajamento nesta causa é a seguinte: que mundo desejamos deixar para as novas gerações. Não faltam sinais de que o Meio Ambiente está necessitado de atenção particular. E sou testemunha do quanto recentemente padecemos por isso [recordando as tragédias no RS].

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil possui um histórico de engajamento nessa causa. Bastaria aqui recordar o histórico recente das Campanhas da Fraternidade que tiveram como tema aspectos que compõem o Meio Ambiente e a necessidade de cuidado particular para com a Casa Comum. A Comissão Episcopal para a Ação Sociotransformadora tem uma excelente trajetória neste âmbito. Existe uma Comissão especial para a Ecologia Integral e Mineração que se dedica ainda mais especificamente sofre o tema em questão. No contexto latino-americano estão sendo constituídas redes de atuação em distintas âmbitos, como por exemplo, a Rede Eclesial Gran Chaco e Aquífero Guarani.

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Para o próximo ano de 2025, a Campanha da Fraternidade promovida anualmente pela CNBB, com particular ênfase durante o período da Quaresma, terá como tema “Fraternidade e Ecologia Integral”, cujo lema será “Deus viu que tudo era muito bom” (Gn 1,31). Desejamos recordar com isso, que tudo está interligado e com isso o ser humano não pode se isentar dos cuidados com esta “casa comum”.

A cooperação entre as melhores forças da sociedade que acreditam na urgência de promover uma agenda consistente em torno do tema “Meio Ambiente”, “Casa Comum” é um imperativo. No próximo ano teremos, em Belém, a COP30 espaço privilegiado para estudos, debates possíveis e necessárias decisões sobre os desafios do clima. Esta será uma oportunidade privilegiada para que também as Igrejas expressem o engajamento nesta causa. Sendo o Brasil o anfitrião de tal evento, podemos afirmar que temos responsabilidade ainda maior; o Brasil também tem responsabilidades diante dos desafios que tocam a vida do planeta. Imagino que o legado de Francisco de Assis há de inspirar e auxiliar a todos para que não só redescubramos, mas verdadeiramente reconheçamos, respeitemos e promovamos a dignidade e o valor de toda criatura.

Brasil de Fato: O senhor acha que a Igreja no Brasil dialoga com essa agenda?

Com certeza. Se trata aqui de reconhecer que tal agenda faz parte da obra da evangelização. Nenhum batizado que se reconhece seguidor, discípulo de Jesus – “o homem que passou por entre nós fazendo o bem” e “que fazia bem todas as coisas” – pode, em sã consciência, afirmar que tal agenda não lhe diz respeito.

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Distrito Federal

Entrevista: reitora eleita da UnB pontua principais desafios da gestão

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Rozana Naves foi escolhida com 64% dos votos para comandar a próxima gestão da UnB, que afirma que vai focar em uma gestão democrática

Na primeira entrevista após ser eleita próxima reitora da Universidade de Brasília (UnB), Rozana Naves, elencou ao Metrópoles quais os principais desafios que terá nos quatro anos frente à instituição de ensino superior. A docente diz que aposta em uma gestão democrática e participativa, com foco em mecanismos como audiências públicas e interlocutores para a comunidade.

“Pensamos na universidade como palco desses grandes debates, das discussões, dos grandes temas de interesse nacional, internacional”, disse. “É uma ação assim que está no nosso radar e que a gente pretende tornar permanente, viabilizando assim um maior engajamento da comunidade nos nossos processos democráticos internos e também no país”, completou.

Rozana também abordou a questão do orçamento, incluindo a intenção de implementar um sistema participativo, e a necessidade de buscar recursos externos para projetos como novos alojamentos e reformas nos já existentes.

“A gente tem observado que há espaço orçamentário para realizar reajustes na assistência estudantil”, afirmou. “Esse é um caso que pode ser colocado para a consulta estudantil”, exemplificou a reitora eleita.

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Para Rozana, uma das prioridades é o investimento em infraestrutura nos campi, com apoio a obras de contenção de chuvas, que têm causado alagamentos frequentes em laboratórios da universidade.

A professora defende a parceria Governo do Distrito Federal (GDF) no projeto “Drenar” para lidar com o grande volume de água proveniente das chuvas. “Um outro ponto seria a substituição do asfalto dos estacionamentos por blocos permeáveis”, acrescentou,

A reitora eleita também fala em obras para acessibilidade física dentro da Universidade de Brasília, especialmente nos acessos aos prédios.

Outra proposta é a reforma dos alojamentos estudantis. Em abril, o Ministério Público Federal (MPF) investigou suposta omissão da Universidade de Brasília (UnB) de garantir moradia digna aos estudantes de graduação.

“Pelo volume de reformas necessárias, será muito difícil executá-las com o orçamento discricionário da universidade. Então, para esse tipo de reforma, vai ser necessário buscar recursos novos, talvez na forma de emendas parlamentares”, disse.

A professora criticou o fato das construções dos alojamentos não estarem incluídas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do governo federal. Em relação ao orçamento, Rozana destacou que a universidade ainda depende da aprovação do orçamento de 2025 pelo Congresso Nacional, prevista para fevereiro ou março do próximo ano.

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Na entrevista, a reitora eleita também discute a situação do calendário acadêmico, impactado pela greve recente, e a necessidade de regularizar a situação.

Eleição

Na quinta-feira (5/9), a professora Rozana Naves foi eleita a nova reitora da Universidade de Brasília (UnB) e assumirá a gestão da instituição de ensino superior de 2024 a 2028. Representante da chapa “Imagine UnB: Participar e Transformar”, ela recebeu a maioria dos votos no segundo turno do pleito, contra Olgamir Amancia Ferreira. O vice-reitor eleito é Márcio de Farias.

Ao todo, foram computados 8.163 votos. Desses, 5.287 foram às urnas a favor de Rozana (64,98%), enquanto 2.876 votaram em Olgamir (35,02%). A porcentagem de abstenção foi semelhante à do primeiro turno, somando 84,4% dos 56.431 professores, alunos e técnicos aptos a votar, mas que não o fizeram.

Rozana Naves – professora e pesquisadora do Departamento de Linguística, Português e Línguas Clássicas (LIP)

Rozana Naves é professora e pesquisadora do Departamento de Linguística, Português e Línguas Clássicas (LIP). Foi diretora do Instituto de Letras e atuou como decana de Administração, além de ter sido coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Linguística.

O vice de Rozana é o professor Márcio Muniz. Ele é formado em engenharia pela Universidade Federal do Ceará, tem mestrado pela PUC-RJ e doutorado pela Swansea University, Inglaterra. Eles está há 38 anos na Universidade de Brasília. Ao longo desses anos foi diretor, vice-diretor e coordenador de pós-graduação e de extensão da Faculdade de Tecnologia.

Como funciona

A próxima etapa será a inscrição das candidatas ao cargo de Reitora, na Secretaria dos Órgãos Colegiados (SOC), em 10 de setembro de 2024. Em seguida acontece a elaboração da lista tríplice pelo Conselho Universitário (Consuni) da UnB, em 13 de setembro de 2024. A lista tríplice será encaminhada ao Ministério da Educação e ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), responsável pela nomeação da Reitora.

Historicamente, o candidato mais votado nas consultas da UnB é nomeado reitor pelo Presidente da República. A expectativa é que Rozana assuma a gestão em novembro.

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Leia entrevista na íntegra:

Jade: Bem-vindos a mais um Metrópoles Entrevista. Meu nome é Jade de Abreu e hoje vamos conversar com a reitora eleita da Universidade de Brasília. Rozana Naves, que venceu o pleito com uma vantagem superior a 2 mil votos da adversária, Olgamir. Rozana é professora e pesquisadora do Departamento de Linguística Português e Línguas Clássicas (Lip), foi diretora do Instituto de Letras e atuou como decana na administração, além de ter sido coordenadora do Programa de Pós-Graduação de Linguística. Certo, professora? Primeiro, parabéns pela vitória, parabéns pela campanha e obrigada por ter vindo aqui logo depois de ter ganhado as eleições. Eu sei que foi uma rotina muito grande, então muito obrigada pela sua participação hoje com a gente aqui no Metrópoles.

Rozana: Eu é que agradeço pelo convite. É um prazer reencontrá-la desde ontem na cobertura. Você que foi egressa do nosso curso de Letras também. E obrigada ao Metrópoles pelo convite à audiência que está nos acompanhando. Estou à disposição de vocês aqui nesta tarde.

Jade: Pefeito, professora! Primeiro eu gostaria de saber quais são as principais ações a partir de que começar a gestão dentro da reitoria.

Rozana: Primeiro, agradecer e deixar aqui o meu agradecimento à comunidade da Universidade de Brasília. Nós ontem tivemos mais uma ação desse processo democrático que se constitui de várias fases, várias etapas. Foi o segundo turno com a participação dos três segmentos. Nós tivemos a alegria de poder contar com a maior votação nos três segmentos, com uma diferença significativa e em particular entre técnicos, mas também entre estudantes e docentes.

Isso demonstra a capacidade da universidade de realizar processos democráticos, o que é muito importante para o nosso país. Eu estou falando disso porque justamente uma das ações centrais do programa de gestão que a gente apresentou à comunidade é o da gestão democrática e participativa. Esse é um eixo transversal do programa, porque a gente tem observado uma certa desmotivação da comunidade, em geral, mas acho que da população como um todo em relação às pautas que envolvem o engajamento político e a própria discussão sobre democracia, defesa com incondicional dessa democracia que a gente tanto quer.

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As universidades têm sido um baluarte aí na sustentação da nossa democracia. Então a gente entende que esse exercício democrático no processo de consulta para reitoria, mas na convivência, no convívio diário da universidade, é algo muito importante de ser implementado. Então, pensar a universidade como palco desses grandes debates, das discussões, dos grandes temas de interesse nacional, internacional, é uma ação assim que está no nosso radar e que a gente pretende se tornar permanente, viabilizando assim um maior engajamento da comunidade nos nossos processos democráticos internos e também no país.

Jade: Nesse sentido mesmo, como vai funcionar uma gestão participativa? Tantas pessoas opinando como é que vai ser algo para que a gente vai conseguir gerir? Como funciona na prática?

Rozana: Bom, a gente pretende criar alguns mecanismos de participação mais efetiva da comunidade. A gente tem plena consciência de que a universidade atua e delibera na forma do seu regimento Interno, ou seja, por uma democracia representativa dos seus colegiados superiores, mas também nos colegiados das unidades acadêmicas. Mas há vários mecanismos que a gente pode implementar para possibilitar que toda a comunidade participe efetivamente dos processos decisórios, especialmente aqueles que implicam uma ampla abrangência das políticas em relação à nossa comunidade.

Por exemplo, o dispositivo das audiências públicas. Mas não apenas para que elas constem dos processos administrativos, mas como instrumentos a partir dos quais são criadas as políticas e não o inverso, não é? Não se trata de criar políticas e colocar em consulta pública, mas é trabalhar com o resultado das consultas públicas na implementação das políticas. Nós tivemos essa experiência na elaboração do planejamento estratégico do Decanato de Administração, que foi construído com ampla participação tanto da equipe do decanato como da comunidade interna e da comunidade externa, que fazia a relação com o decanato de Administração.

Então, esse é um dos mecanismos, mas a gente também pretende criar junto ao gabinete da Reitoria, interlocutores ou segmentos que possam trazer diretamente ao gabinete as demandas dos segmentos em específico e, com isso, também possibilitar um acesso maior da comunidade. E a reitora, então, criar mecanismos de maior interlocução entre a reitoria, o gabinete e a comunidade diretamente. Isso é importante pra nós, porque a nossa candidatura foi construída pela base. Nós nos constituímos como um grupo de docentes, técnicos e estudantes que elaborou o programa que trabalhou na proposição da candidatura. Então, é uma candidatura genuinamente UnB. E isso nos deu muito orgulho durante o processo e é assim que a gente quer continuar construindo as políticas da universidade.

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Jade: Não só em questões políticas. Isso vai mexer também na questão do orçamento. O orçamento também vai passar por uma análise participativa e por opiniões de diversos segmentos. É isso mesmo? Vai ser na mesma linha, audiências públicas?

Rozana: É isso mesmo. A gente pretende desenvolver também instrumentos tecnológicos, um pouco de uso da inteligência artificial que a gente já tentou implementar um pouco na campanha, experimentar e, a partir desses mecanismos, recolher informação da comunidade a respeito daquilo que ela acha prioritário em termos de execução dos nossos recursos públicos e também de ampliação desse orçamento.

Em outras áreas, por exemplo, a gente deve captar recursos via emenda parlamentar, via captação externa para projetos. Quais são os temas estratégicos que a Universidade de Brasília pretende contribuir para o desenvolvimento do país, para o desenvolvimento, inclusive em âmbito internacional, para sua projeção internacional? Então, a comunidade se manifestar sobre esses temas é muito importante para orientar estrategicamente as ações da gestão.

O orçamento participativo visa, por exemplo, priorizar que ações poderão ser desenvolvidas com nosso orçamento próprio, com orçamento discricionário, que é oriundo do Ministério da Educação e aquilo para o que a gente precisa captar emendas durante o processo de campanha e mesmo na pré campanha, vários temas foram surgindo e a gente foi conduzindo já antecipadamente à comunidade ou sugerindo a eles que se manifestassem mesmo em torno de priorizações, por exemplo, o segmento estudantil.

Eles têm um leque imenso, imenso de demandas e são capazes de hierarquizar, de reconhecer complexidade, algumas ações e outras menos complexidade. Então eles conseguem fazer essa análise e a gente vai conversar com eles nesse sentido.

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Jade: Perfeito, professor. A senhora vai assumir. É bom a expectativa de que assuma, porque também vai passar pela consulta e avaliação. Depois ela passa para o presidente Lula, que deve chegar em novembro, quando realmente assumirá a gestão. Dentro desse primeiro. Nesse início desse primeiro momento, já vai ter esse orçamento participativo ou funciona da mesma forma no governo federal? Ainda é com o governo anterior que faz a LOA. Faz toda a questão das diretrizes orçamentárias do ano seguinte. Como é que funciona dentro da nossa diretoria?

Rozana: É uma ótima pergunta, que me permite explicar também um pouco para a comunidade como é que se dá esse processo de nomeação de uma reitora ou de um reitor? Então, um processo de consulta à comunidade. Ele é organizado pelas entidades representativas dos três segmentos docentes, estudantes e técnicos e daí geram nomes para uma lista tríplice que é aprovada no âmbito do Consuni [Conselho Superior Universitário].

Como é que está previsto isso na Universidade de Brasília? O Consuni já se reuniu anteriormente e deliberou que na próxima terça-feira (10) serão feitas as inscrições dos nomes de candidatos a reitores. No caso, porque fomos só mulheres no processo e a partir dessa inscrição os nomes são levados à reunião do Consuni, que ocorrerá na sexta feira (13).

Com esse processo constituído, os nomes referendados pelo Consuni e, em geral, segue-se a escolha da comunidade, ou seja, o resultado do processo de consulta é a lista. O processo todo é administrativo e formalizado e encaminhado ao Ministério da Educação com 60 dias de antecedência em relação ao fim do mandato da atual reitora. Então, o mandato termina em finais de novembro, quando a gente vai poder realmente assumir nesse intervalo.

A gente deve reconstituir junto da reitoria uma equipe de transição e aí é que a gente vai tomar pé realmente da situação e nos apropriarmos dos dados e fazermos o planejamento do próximo ano. Significa que a gente já vai estar no final do ano orçamentário. Então, para esse ano, claro, a gente vai executar o que estiver previsto. Não vamos ter muito tempo para reformulações, mas eventualmente a gente já vai ter tempo para iniciar um processo de consulta à comunidade, pensando nas ações do ano seguinte.

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O orçamento de 2025, que deve ser aprovado como de praxe, por volta do mês de fevereiro e março pelo Congresso.

Jade: Falando em calendário, também a senhora assume, a partir de um momento em que veio uma greve que mexeu com o calendário estudantil, que já vinha também um pouco afetado pela. Ouvi de agora que estava começando a entrar nos eixos o semestre de começar a funcionar como um semestre, mesmo o primeiro semestre. Segundo semestre, porque até então estava em um semestre, você tinha dois.

Assim, um dos dois turnos de janeiro a janeiro a julho, junho, você pegava dois semestres porque tava bem apertadinho. Falar isso pro pessoal que às vezes não conheceu a dinâmica dentro da UnB nesse período. Então foram uns três anos, pelo menos, de muito cansaço estudantil e dos professores, porque vinha de um semestre atropelado, pouco tempo de férias, voltavam semestre a pouco, tempo de férias.

Veio a greve quando normalizou. Passou um pouquinho e veio a greve, que estendeu novamente o primeiro semestre, terminando agora em setembro. Isso como que vai assumir e lidar também com esse calendário, com esse cansaço, com toda essa luta, uma certa frustração. Tem uns que estão para formar e tiveram um atraso. Como que seu olhar sobre isso? Professor?

Rozana: Olha, meu olhar é sempre otimista sobre a reação da comunidade. É verdade que a gente tem ouvido já bastante relatos de professores e de estudantes dizendo sobre o quão longo está esse semestre, porque a gente interrompe ali para o período da greve. Claro que é também importante dizer que a greve é um instrumento legítimo de reivindicação dos direitos. Houve agravados técnicos e também dos professores e alguns estudantes. Também de centros acadêmicos que apoiaram esse movimento. Mas é evidente que alongar o semestre traz um cansaço, porque tira todos da rotina. E isso também explica porque que a gente está agora num intervalo subsequente que deve ocorrer entre esse final de setembro e início de de outubro, é que vai atrapalhar, vamos dizer assim, não vai atrapalhar. Não é bem a palavra, mas que vai postergar o segundo semestre.

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Então a gente vai ter uma diferença entre o fim do calendário orçamentário e o do exercício financeiro. Como a gente estava falando na questão anterior e a execução do ano letivo, que deve terminar só lá para o final de fevereiro, e aí sim a gente volta a tentar regularizar o semestre. Como é que a gente lida com isso?

Não é uma excepcionalidade que isso aconteça na UnB. A gente já teve, como você mesma disse, os anos de convívio em que isso aconteceu e o planejamento é essencial. O planejamento administrativo da instituição é essencial para que a gente consiga manter as atividades funcionando, mesmo com a passagem do ano orçamentário e a comunidade vai se adaptando e a expectativa de voltar ao calendário normal.

Mas isso também dá uma nova energia para a gente. Então a gente espera que o ano também. E acho que todo o processo de consulta agora movimentou a universidade. A gente viu de novo os corredores com pessoas circulando, a gente viu as unidades acadêmicas e administrativas se mobilizando para receber os candidatos e talvez o meu olhar animado tenha a ver com o próprio movimento que a consulta causou dentro da universidade.

A expectativa de uma nova gestão eu acho que também contribui para esse ânimo de retorno ao semestre, para a continuidade dos trabalhos até a regularização do calendário.

Jade: A regularização do calendário está prevista para o ano que vem?

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Rozana: Para o ano que vem. E, se não estou enganado, a gente vai até fevereiro e aí temos aquele intervalo de 30, 40 dias, um início de março a gente já retorna, que é o calendário normal.

Jade: E aí segue normal, caso não haja nenhuma intercorrência. A professora este ano chamou muito a atenção as imagens de chuva dentro da UnB. Foi ali, em fevereiro, uma forte chuva. As águas inundaram parte do ICC, pegaram equipamentos no laboratório, enfim, chamou bastante atenção. Saiu amplamente em vários veículos. A gente deu inclusive essas imagens. Eu gostaria de saber se há um plano de contenção da chuva, como evitar que novos departamentos sejam inundados, que equipamentos sejam perdidos. O que está hoje no radar para evitar que em fevereiro já se repita?.

Rozana: Bom, tem sido cíclica nessa inundação nos corredores da UnB, em particular o ICC, que é o nosso prédio simbólico, sempre vira notícia, porque ali no subsolo ainda funcionam muitos laboratórios, muitos espaços de aula também. E ver o material todo se perdendo, não só a infraestrutura física, mas especialmente o material que a gente chama o patrimônio imaterial, que são as produções, os equipamentos também.

O patrimônio físico é bastante triste o que acontece. A gente está numa região da Asa Norte, que é um declive muito grande e todas as construções na Asa Norte canalizaram a água que corre ali até a UnB. Então, um primeiro ponto é poder integrar a UnB, passar a integrar o projeto do Governo do Distrito Federal, o projeto Drenar, que tem construído estruturas capazes de recolher essa forte água das chuvas.

E o nosso vice-reitor, eleito junto conosco na chapa, é um engenheiro civil. Ele já tem estudado bastante essa questão e o próprio departamento de Engenharia Civil e Ambiental da universidade. Lá, a gente tem informação de que eles auxiliaram a reitoria atual num diagnóstico da situação e ao desenvolvimento de algumas propostas. E além dessa parceria com o GDF, é importante a gente não creditar o meio ambiente também às frequentes cheias, porque lá pelas chuvas, porque esse é um fenômeno que a gente não consegue mais evitar.

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O nosso programa traz como ação transversal e estratégica esse compromisso da Universidade de Brasília com a justiça social ambiental. Ou seja, é importante que nós, com a expertise que temos nos vários departamentos, nos debrucemos sobre essa questão ambiental e proponhamos soluções não só para as crises ambientais, mas planos de contingência para a cidade, em particular ali para outra região do nosso continente.

E que a gente possa implementar do ponto de vista da infraestrutura e para as chuvas. Então, as soluções, do ponto de vista da engenharia, que podem ser desenvolvidas utilizando essa expertise que já foi proposta. Por exemplo, a mudança, a substituição do asfalto dos estacionamentos por aqueles blocos mais permeáveis à água, de maneira que a água vá sendo absorvida antes de chegar nas edificações, então as soluções do ponto de vista da engenharia, que devem ser consideradas também prioritárias para nós na execução orçamentária, em particular na relação com o governo do Distrito Federal.

Jade: É feita então, ano que vem, quando tiver realmente o orçamento e já habituada, já começando esse vai ser um ponto que vai estar no radar. Aí o ponto prioritário é isso?

Rozana: A gente tem várias questões que parecem pequenas, mas que devem ser prioridades. Essa questão de infraestrutura e para evitar alagamentos é uma. Uma outra são as infraestruturas de acessibilidade, o que a gente tem visto na universidade, uma grande preocupação com a acessibilidade interna aos prédios, Mas a acessibilidade física para um cadeirante, por exemplo, chegar dos estacionamentos ao elevador do prédio, muitas vezes ele enfrenta dificuldades enormes.

Então a gente tem visto o governo federal trabalhar e com os calçamentos acessíveis, toda a Esplanada já está com esses novos calçamentos. Então essas parcerias também serão importantes para que a gente possa promover a acessibilidade física interna na UnB. Mas uma parte externa aos prédios. Então essa é uma outra preocupação de infraestrutura que a gente tem. E, enfim, então tudo isso incluído. Estou aqui trazendo à memória o que a gente ouviu nas nossas reuniões de pré campanha em particular com esses grupos de estudantes e técnicos que são pessoas com deficiência, que demandam da universidade um atendimento muito específico.

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Jade: Uma outra proposta é a questão do reajuste das bolsas. Vocês pensam que é algo que já estão tendo os alunos que fazem parte, porque senão não vai funcionar: Já tem um valor que pensa em reajustar,? Vai seguir a inflação?

Rozana: A universidade realizou um reajuste das bolsas de iniciação científica de extensão a partir do reajuste que foi dado pelo próprio governo federal para as bolsas de pós graduação em pesquisa em geral, e agora foi anunciado também pelo governo que esses reajustes vão ser anuais. Então, essa política de reajuste anual ela precisa também ser seguida pela universidade naquilo que se refere às suas bolsas internas.

Mas a grande demanda dos estudantes tem sido pelo reajuste das bolsas de assistência estudantil, porque elas não sofreram um reajuste muito pequeno. Não, não é que R$ 30 e eles estão agora pedindo uma equiparação com o reajuste que foi dado às bolsas de extensão de iniciação científica.

Jade: R$ 400 R$ a bolsa.

Rozana: Isso, de R$ 400 foi para R$ 430. Essa faixa é então o que na verdade eles querem agora a equiparação. O que a gente tem observado em termos de execução do orçamento de assistência estudantil? Que a gente tem espaço orçamentário dentro do programa para realizar esses reajustes e então levar essa questão para o segmento estudantil.

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Essa é a típica consulta que pode ser colocada para o segmento estudantil, porque sempre que a gente vai utilizar o recurso para uma ação, por exemplo, o reajuste das bolsas, equiparando e criando isonomia com os outros tipos de bolsas da universidade, a gente deixa de atender alguma outra demanda, porque o orçamento ele tem um tamanho específico, né?

Então, colocar isso na balança é possibilitar que a própria comunidade envolvida decida sobre as suas prioridades e partes do processo de gestão que a gente vai fazer. De toda maneira, o que a gente tem visto é que é possível fazer o reajuste e ainda manter os programas que estão em andamento na universidade.

Jade: Além da questão da bolsa estudantil, também é um foco nos alojamentos. Eu li o programa, falava em construções de novos, que também é algo aí vai existir um peso do orçamento, construir novos alojamentos, mas é uma demanda da população dentro da universidade. Inclusive, neste ano, o Ministério Público Federal chegou a começar a investigar a parte de goteiras, infiltrações dentro dos alojamentos. A gente noticiou aqui dentro do Metrópoles e eu gostaria de saber como que vai funcionar. Já tem um projeto? Antes mesmo de construir, haverá uma reforma ali dentro desses alojamentos que já estão apresentando alguma infiltração?

Rozana: Nós fizemos várias visitas a casa de estudantes de graduação e tivemos reunião com os estudantes da Casa da Pós-Graduação e as demandas de infraestrutura são bastante urgentes.
O que a gente gostaria, mesmo que tivesse sido priorizado, era a construção priorizada. Era a construção da moradia estudantil no Plano de Aceleração do Crescimento das universidades, o PAC das universidades, que permite a construção de novas obras, tanto que em várias universidades foi a moradia estudantil. A obra é uma das obras indicadas para a execução desse tipo de recurso na nossa universidade.

O recurso foi direcionado a uma unidade, ao prédio de uma unidade acadêmica, o que é importante também porque está entre as demandas do novo PAC fortalecer o ensino, pesquisa e extensão. E mais do ponto de vista da permanência, a gente ficou descoberto e não foi proposta a construção de um edifício histórico que até hoje não tinha sido construído, que é o prédio da Aula Magna, um auditório para receber convidados, realizar formaturas. Então a gente vai ter que buscar esse recurso extra prazo para a moradia estudantil.

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Em um primeiro momento que a gente vai trabalhar, é com a reforma dos edifícios que já existem, enquanto a gente busca esse novo recurso para o ano seguinte, provavelmente.

Jade: É possível acrescentar ainda ao PAC. Não existe uma tratativa com o ministério como vem federal.

Rozana: As obras já foram aprovadas até onde a gente sabe, e os processos já estão em andamento na universidade. Como a gente só assumiu em novembro, a gente não tem muita certeza de que a gente vai conseguir substituir a construção do auditório pela construção de novos prédios de moradia estudantil, mas a gente vai se empenhar em buscar recursos para essa finalidade.

Jade: Obrigada pelo seu tempo, pela disposição, está aqui com a gente no Metrópoles. Gostaria de saber se tem algo a acrescentar que a gente não tenha perguntado, não tenha conversado aqui dentro da entrevista.

Rozana: Bom, queria deixar uma mensagem final para nossa comunidade, não é? Uma vez indicados a partir do processo de consulta, professor. Mas passamos a ser os representantes da nossa comunidade universitária. Então convido todos a contribuírem na construção desse novo projeto de gestão. Quero também agradecer à professora Fátima Souza e ao Coletivo da Chapa 99, que compôs conosco nesse segundo turno. A professora Olgamir que participou do processo democrático cumprimentá-la também pelos resultados alcançados. E deixar aqui uma mensagem de harmonia na construção desse novo projeto. Convidar a todos a contribuírem novamente com essa construção.

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Fato Novo com informações e imagens: Metrópoles

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Educação

Rita Coelho: “educação infantil não tem meta de alfabetização”

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Atuante nos direitos das crianças há pelo menos 30 anos, a coordenadora do MEC defende o desenvolvimento de múltiplas linguagens nessa etapa, incluindo as interações e brincadeiras, além de apresentar os avanços das políticas pública

Referência nacional em educação infantil, principalmente no que diz respeito às políticas públicas, os trabalhos e posicionamentos da docente e socióloga Rita de Cássia de Freitas Coelho acalentam educadores que, assim como ela, lutam para as crianças serem respeitadas em suas especificidades e, assim, serem reconhecidas como sujeitos de direitos. Por nove anos (2007 a 2016) Rita Coelho ficou à frente da CoordenaçãoGeral de Educação Infantil (Cogei), do Ministério da Educação (MEC), trabalhando com oito ministros. No terceiro mandato do governo Lula, Rita retoma a Cogei. 

Doutora honoris causa pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), foi presidente da União Nacional de Conselhos Municipais de Educação (UNCME). Nesta conversa, contextualiza as conquistas da educação infantil, inclusive a mais recente, a Política Nacional Integrada para a Primeira Infância. Confira, a seguir, a entrevista exclusiva com a representante de educação infantil no MEC. 

Como coordenadora-geral da Cogei de 2007 a 2016, o que a sua gestão trouxe para a educação infantil? E agora, como estão os trabalhos?   

A gestão anterior foi importante em termos de projetos e políticas do governo para o MEC, além de ter qualificado a educação infantil no âmbito do governo federal. Havia uma parceria com MDS [Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome] para atender as crianças do Bolsa Família e conseguimos ainda ampliar as matrículas dessas crianças. Conseguimos rever as Diretrizes Curriculares para a Educação Infantil, que eram de 1999, fizemos uma boa e valiosa discussão da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que distingue a educação infantil, dá a ela uma identidade própria, não a confunde com o ensino fundamental.

Inclusive, na Base há uma ruptura entre a proposta do ensino fundamental e a nossa proposta de educação infantil. Nossa gestão conseguiu defender e executar uma especialização na docência em educação infantil. Discutimos muito a questão da creche, das brincadeiras, várias publicações; os próprios parâmetros de qualidade da educação infantil, os indicadores de qualidade, estimulamos as escolas a utilizarem. Foi uma gestão que deixou rastros, deixou identidade.  

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governo de hoje é de frente ampla. Eu não considero que ele é um governo do PT ou um governo de esquerda. Temos características muito desafiadoras no âmbito do diálogo intersetorial, interministerialÉ um diálogo em que a orientação da presidência da República é qualificar as diferenças em um debate democrático e ético sem negar e apagar a voz daqueles que pensam ou que defendem posições diferentes. O que é um grande desafio numa sociedade polarizada, dividida, e em um Congresso cujo governo não tem maioria.

Um exemplo desta dificuldade é o ensino médio, o qual o discutimos há um ano. Então muito do que fazemos é a busca do diálogo e da equidade. A prioridade hoje na educação é dialogar com todos, com quem não pensa como a gente, com quem não age como a gente. Mas dialogar com respeito e ética. Dialogar não significa negociar. Isso é um grande desafio, além de desgastante 

A outra prioridade dpresidência da República que nós temos perseguido no MEC, não apenas na educação infantil, é a equidade. Hoje nosso governo reconhece que a desigualdade é o maior problema do BrasilInfelizmente, a política, inclusive deducação infantil, a política educacional, reproduz essa desigualdade. Acabamos de aprovar os novos Parâmetros Nacionais de Qualidade da Educação Infantil. Assim que forem homologados pelo ministro Camilo Santana, iniciaremos a implementação. Também estamos implementando o Compromisso Nacional Criança Alfabetizada, outra prioridade do governo, e estamos trabalhando em ações que respeitam a identidade das crianças pequenas e a especificidade da educação infantil. 

Vamos produzir os indicadores da educação do campo, que é uma das situações mais graves da infância e que pertencem às famílias mais pobres e vulneráveis presentes no Bolsa Família. Então, de modo geral, temos propostas, a diferença [com a outra gestão de Rita] é o contexto político do Brasil e a situação da infância muito atingida pela pandemia e pela crise econômica o qual o Brasil e parte do mundo estão vivendo. 

Após decreto divulgado em junho pelo governo federal, aguarda-se a Política Nacional Integrada para a Primeira Infância. Qual a importância desse documento e o que pode adiantar?  

Saiu o decreto que compõe uma comissão, mas as pessoas não estão designadas. Primeiro, muito importante, quem coordena essa política é a Casa Civil, com Miriam Belchior; à frente, ela é uma profunda conhecedora da área social e da área de orçamento, sendo para nós motivo de satisfação. Comemoramos a coordenação da política de estar na Casa Civil pelo papel, características da Casa Civil e também pelo perfil de Miriam. Essa Política Nacional Integrada para a Primeira Infância é importante porque permite à educação infantil atuar na sua especificidade. Porque o que acontecia e ainda acontece é que as ações da primeira infância não estão articuladas, são políticas setoriais distintas, com padrão de orçamento distinto, com profissionais distintos.

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A saúde, por exemplo, é um sistema único. A assistência social é um sistema único. Nós, da educação, somos um sistema descentralizado, um sistema federal com 26 sistemas estaduais, um distrital e muitos sistemas. O padrão de financiamento nosso não é fundo a fundo. O Fundeb [Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica de Valorização dos Profissionais da Educação] tem características muito diferentes e não é gerenciado pelo Conselho de Educação ou pelos conselhos. Isso é um grande desafio 

E quanto mais programas e ministérios assumirem as suas políticas em relação à primeira infância, melhor para nós da educação infantil, porque o que acontece com criança subnutrida, desnutrida é que o posto de saúde manda pra creche. Isso não é problema nosso, é problema da saúde, do combate à fome. Crianças violentadas, negligenciadas pela família, mandam para a creche. Cadê o sistema de proteção? Cadê o atendimento das redes de proteção do Ministério de Direitos Humanos? Então, é muito importante essa Política de Primeira Infância para a sociedade e para o sucesso de todas as políticas, inclusive, para que a educação infantil, além de ser uma política muito efetiva com recursos constitucionalmente vinculados à matrícula, que ela tenha especificidades vinculadas ao desenvolvimento e à aprendizagem das crianças, como as interações e brincadeiras.

Como está a educação infantil no campo e indígena? 

Do ponto de vista da oferta está mal. É um grande desafio para nós. Populações indígenas, algumas populações aldeadas, têm posições distintas em relação ao direito à educação infantil. Populações indígenas não aldeadas são atendidas na rede comum de educação infantil e muitas vezes sem que a rede respeite as especificidades da língua e cultura da população indígena. A mesma situação ocorre com a população do campo, uma vez que é composta por uma diversidade de populações: assentamentospopulações da agricultura familiar, ribeirinhos, pescadores, quebradeiras de coco e castanha etc.  

[Extinta no governo Bolsonaro], o MEC retomou a Secadi (Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão) e política de educação no campo e indígena está nessa Secretaria. E nós [da Cogei] estabelecemos com a USP de Ribeirão Preto e a Secadi um projeto de cooperação técnica em que priorizamos o atendimento da educação indígena e educação no campo. Esse projeto prevê seminários regionalizados, diálogos com as populações indígenas, com o Fórum Nacional de Educação do Campo e com um grupo de pesquisadores nacionais que trabalham com essa problemática.

 

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Para a docente e socióloga, temos que mudar a concepção de brincar (Foto: divulgação/Cogei)

A Maria do Socorro Silva é a diretora de Políticas de Educação do Campo e Educação Escolar Indígena na Secadi e a professora Ana Paula Soares representa a USP de Ribeirão. Temos ainda o apoio da Fapesp, que é uma das mais importantes fundações de pesquisa vinculadas às universidades. É uma prioridade nossa, um grande desafio, já que nossos indicadores não são bons e a própria concepção da política é complexa, inclusive, porque os indígenas têm línguas próprias. 

Qual o papel da educação infantil e por que é preciso diferenciá-la do ensino fundamental, principalmente no que diz respeito à alfabetização?   

É a primeira vez que a humanidade — isso não é problema do Brasil — compartilha a educação de crianças pequenas com o Estado, com o setor público. Alguns países compartilham na assistência social, outros na proteção, nós compartilhamos o dever do Estado com a educação desde o nascimento. E como que o Estado cumpre esse papel? Cumpre com regras próprias. Essa área é profissionalizada, com professor
habilitado, com diretrizes curriculares coerentes com o desenvolvimento da criança. O eixo das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil abrange a interação e as brincadeiras, não é, a priori, o conteúdo. A priori, o ensino fundamental tem alguns conteúdos que devem ser desenvolvidos. A educação infantil tem muitos conteúdos, mas são [colocados] na medida do interesse e curiosidade do direito da criança.

Aprender a falar, a ler, a escrever é um direito das crianças, ainda mais em uma sociedade letrada. Mas elas manifestam essa curiosidade de forma diferente e em ritmos diferentes e na educação infantil somos obrigados a respeitar essa criança que às vezes tem dois anos, três anos, quatro anos, cinco anos. Então, a alfabetização não é uma meta da educação infantil, ela é um direito da criança. O nosso trabalho tem que estar centrado nas interações, nas brincadeiras, na criatividade, na imaginação da criança, e não na aquisição do código. Alfabetizar na educação infantil não é juntar letras, é entender, é atribuir e se apropriar de significados que estão estabelecidos na nossa sociedade. O gesto da criança é uma linguagem que antecede a letra.

O desenho é uma linguagem que antecede a letra. Ou seja, a nossa perspectiva é a de que as crianças têm direitos que devem ser garantidos, mas na especificidade do desenvolvimento das características de sua faixa etária. Então, não entendemos que a educação infantil, na sua identidade, seja preparatória para o ensino fundamental porque o seu objetivo é ampliar as experiências das crianças, estimular o desenvolvimento em grupo. Mas posso ter uma criança de três anos que distingue letra de número, que se interessa pelas letras, que desenha, que identifica. Como também posso ter uma criança de seis anos que sai da educação infantil sem esse interesse. Defendemos que a educação infantil tem que assegurar à criança práticas de oralidade, leitura e escrita, mas nós não temos meta, não temos que antecipar esse processo.

Por que há falta de conhecimento sobre a importância do brincar inclusive em creches e pré-escolas? Como mudar isso?

Sou uma defensora de a gente começar a falar positivamente da educação infantil. Para um país que, na década de 70, essas crianças estavam em abrigos, sem nenhuma organização que respeitasse as especificidades delas, muito na perspectiva da sobrevivência, diria que hoje, quando entendemos que a criança tem que brincar, isso é um grande avanço. Temos até que mudar essa concepção de brincar: na minha infância brincar era uma coisa, hoje brincar é outra coisa.

As mediações das brincadeiras são muito mais complexas, ricas, podem ser, inclusive, tecnológicasSe tivéssemos um levantamento dos últimos 20 anos, acho que veríamos o tanto que hoje brincamos, o tanto que no currículo existem as propostas de brincadeiras, brincadeiras livres, brincadeiras individuais, coletivas, brincadeiras mediadas por objetos — mas a criança não precisa de objeto para brincar, ela transforma um graveto num aviãonum cavalo, depende muito dessa ambiência que a gente cria. 

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Então, primeiro: acho um avanço a questão de a brincadeira estar pautada na Política Nacional de Educação Infantil, na política dos municípios. Temos metas ambiciosas produzidas por pesquisadores, por estudiosos da área que, muitas vezes, desconsideram a realidade. O
próprio Plano Nacional de Educação é uma meta nacional para uma realidade tão diversificada como a do Brasil e que acaba não sendo atingida por todos. Tem uma questão aí: temos que ter mais clara a graduação das nossas metas.

Quando a gente diz que ‘muitos não brincam’, quantos brincam? Quantos são muitos? O segundo ponto é que o sistema escolar brasileiro tem características tradicionais rígidas que não acolhem a educação infantil, por exemplo, como a pré-escola foi concebida. Existem tradições mundiais do sistema escolar muito coercitivas, disciplinares, cuja brincadeira não é acolhida como um fator de desenvolvimento ou como uma meta. A avaliação é uma tradição, a organização por turma é outra tradição, o ano letivo também. A gente não nasce sabendo brincar, a gente aprende culturalmente a brincar e as brincadeiras variam de cultura para cultura. Há um filme do Instituto Alana, O território do brincar, muito interessante ao apresentar que as brincadeiras das crianças por regiões são muito diferentes. Algumas inclusive, são violentas para outras regiões.

educação infantil

“Como gestora entendo que o meu papel é articular o coletivo”, avalia Rita Coelho (Foto: divulgação/Cogei)

Em um evento da Fundação Bracell, em junho, no Insper, SP, você alertou que o país tem 300 mil auxiliares na educação infantil. 

Sim. O dado é complicado porque nem toda auxiliar está registrada como auxiliar. São quase 300 mil auxiliares monitoras, estagiárias, são muitas denominações. Por isso você [repórter] não encontra esse dado. Porque o Censo pergunta: assistentes atuando na educação infantil’; o estagiário não é um assistentemonitor, então o que está acontecendo? A Lei de Diretrizes e Bases (LDB) admite esse auxiliaradmite outros profissionais, inclusive, atuando na educação infantil. Mas a LDB não regulamenta. Qual é a formação? Qual é a carreira? Qual é a função desse auxiliar? Hoje os municípios criam uma legislação própria, esticar’ de auxiliar, monitor, babápajemestagiário e atribuem a eles diferentes funções, exigem diferentes formações e competências, então nós precisamos enfrentar essa realidade de estabelecer qual é a formação? Qual é a função? Qual é o perfil? É um problema. 

Primeiro queremos conhecer [esses profissionais]. Queremos conhecer a realidade, que é muito diferente. Segundo, queremos um debate nacional sobre isso: existe a necessidade desse outro profissional ou deveriam ser dois professores? Alguns municípios possuem dois professores, outros três. Se essa profissão é uma necessidade, nós temos que regulamentá-la, essa é outra etapa.

Mas o pior problema, o que mais nos tem preocupado, é que os municípios, além de criarem esse trabalhador da educação, eles têm colocado esse auxiliar para exercer a docência na creche. Inclusive, sem a presença do professor. Nós precisamos dialogar e assim entender por que os municípios estão fazendo isso. É falta de dinheiro? É porque acham que a criança pequena não precisa de um professor? Então, o que estamos fazendo é conhecer para qualificar o debate, para depois tomarmos medidas. É para regulamentar? Não é para regulamentar?

Nos anos 80, como servidora do MEC em uma entidade ligada à Fundação de Assistência ao Estudante (FAE) — o que hoje abarca o FNDE —, você participou da descentralização de alguns programas. Como foi isso?  

Naquele período, a estrutura da educação era muito hierarquizada. Ou seja, municípios e estados eram subordinados à União. Com a Constituição de 88, isso acabou. O sistema é federativo, organizado por colaboração e descentralizado. Então, aquela centralização de programas do MEC foi toda revista porque o estado, o município e o Distrito Federal são entes com igual identidade e autonomia, como a União. Por isso, houve um grande movimento de descentralização: descentralização do Programa Nacional do Livro Didático, descentralização do Programa Nacional de Apoio ao Transporte Escolar, do Programa Nacional da Alimentação Escolar. Foi uma
consequência da Constituição de 88 que redefiniu a organização federativa do Brasil e acabou com essa hierarquia. Hoje, por exemplo, nós, do MEC, podemos definir parâmetros de qualidade, mas não posso obrigar o município a implementar esses parâmetros. O município tem autonomia para formular a sua política e para ter a sua identidade.

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A lei reconhece e regulamenta, mas ela não muda a realidade. No caso da educação infantil, ela é um instrumento e amparo de luta, mas
não é uma garantia de atendimento, por exemplo. Tanto que a educação infantil é a etapa mais judicializada da educação. Como gestora entendo que o meu papel é articular o coletivo, seja ele o coletivo dos gestores públicos, seja o de gestores privados e o coletivo de movimentos sociais. Ninguém faz nada sozinho, ainda mais no Brasil, um país continental com tanta diversidade.

Os avanços são muito grandes. Não quero deixar de mencionar o Fundeb, um avanço importantíssimo, sendo em 2007 a primeira vez que tivemos recursos vinculados às matrículas da educação infantil no Fundo. E esse investimento financeiro vem crescendo.


Fato Novo com informações: Revista Educação

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Entrevista

Zico destaca poder do futebol para paz e educação de jovens

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Ícone brasileiro sublinha no Podcast ONU News potencial do esporte como ferramenta de transformação social; ele relembra carreira brilhante nas quatro linhas e fala de suas escolas “Zico 10”, promovendo cidadania e solidariedade

Zico, como é conhecida a lenda do futebol brasileiro Arthur Antunes Coimbra, é o entrevistado do novo episódio do Podcast ONU News. Além de destacar momentos memoráveis de sua carreira e contar como atua no esporte atualmente, ele enfatizou a força do futebol como ferramenta para promover a paz e ações sociais.

Com uma carreira brilhante que começou no Flamengo e se estendeu a conquistas internacionais, Zico promove o futebol como um meio de formação de cidadãos e avalia que o esporte poderia ter um papel mais decisivo para mediar tensões globais.

Partida de futebol que parou uma guerra

“O futebol, principalmente aqueles que estão em atividade, tem muito mais facilidade, muito mais mídia, muito mais espaço. Por ser um esporte que agrega e que tem maior visibilidade no mundo, deveria dar um passo a mais. Não só se estar no meio do futebol, ele tinha que ter um espaço amplo para ajudar os países, ajudar nos conflitos… nós tivemos, no nosso país, o maior jogador da história, que é o Pelé, grande referência para todos nós. Na África, ele parou uma guerra. Ele foi lá jogar com o Santos, parou a guerra para verem ele jogar. Isso é o que representa o futebol”.

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O ex-artilheiro do Flamengo visitou a sede da ONU, em Nova Iorque, em meio a homenagens oferecidas por comunidades do Brasil e do Japão radicadas nos Estados Unidos.

Zico faz referência a um conflito na Nigéria, em 1969. Embora a história seja contestada, ela é utilizada como uma referência sobre o poder do esporte em unificar povos e juntar pessoas de diversas origens.

Assim, o “Galinho”, mais um dos apelidos do jogador, avalia que muitos futebolistas fazem um trabalho social individual, que poderia ter ainda mais impacto se fosse organizado.

Zico afirma que sempre procurou contribuir além dos campos e mencionou a criação do “Jogo das Estrelas”, que há 20 anos arrecada fundos para entidades beneficentes do Rio de Janeiro.

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Zico 10

Além disso, Zico se dedica à educação de jovens através de suas escolas de futebol, a “Zico 10”. Estas escolas não apenas ensinam habilidades futebolísticas, mas também focam na formação do caráter e cidadania dos alunos. Ele enfatiza a importância de preparar os jovens para a vida, independente de se tornarem ou não jogadores profissionais.

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“Não é só o futebol, é a questão da formação do cidadão. A gente tem que saber que você pode ir para o futebol, mas se você tiver bem formado, se não der certo no futebol, o mundo não vai acabar para você. Você está bem-preparado com as coisas que você aprende no futebol, as regras que tem no futebol, de ser um esporte democrático, um esporte que todos podem participar, seja branco, negro, amarelo, seja magro, alto, gordo, seja pobre ou rico. Não importa, todo mundo vai participar. […] o futebol você não pode jogar para si. É um esporte coletivo. E esse esporte coletivo te faz entender que você é uma peça, uma engrenagem daquele grupo.”

A visão de Zico sobre o futebol como ferramenta para a paz e a educação reflete sua própria experiência de vida e carreira. Ele também apontou para a necessidade de solidariedade genuína, sem interesses.

Zico, ídolo da Copa do Mundo do Brasil, carrega a chama olímpica ao lado de ex-craques da seleção japonesa

Divulgação – Zico, ídolo da Copa do Mundo do Brasil, carrega a chama olímpica ao lado de ex-craques da seleção japonesa

Legado e frustrações

Zico também revelou sua maior frustração profissional: não ter participado em uma Olimpíada. Ele foi eleito o melhor do mundo em 1983, disputou três Copas do Mundo e foi homenageado em diversos partes do mundo. Lembrando de sua trajetória aclamada, ele lamentou quando foi cortado da equipe olímpica.

“Eu não tive a felicidade de disputar uma Olimpíada. Fui cortado para a seleção na convocação. Você vê como é que são as coisas. Eu fui para o pré-olímpico, fiz o gol da classificação. Ganhamos da Argentina de 1 a 0, eu fiz gol. E fomos classificados para ir para Olimpíada de Munique – aquela Olimpíada que teve o atentado. Eu não fui, fui cortado. Estou falando da maior decepção que eu tive na minha vida, na minha carreira. E foi a única vez que eu que eu quis parar de jogar futebol.”

Por fim, Zico continua a inspirar novas gerações com seu exemplo de dedicação e amor pelo futebol. Ele acredita que a determinação e os valores éticos aprendidos no esporte são fundamentais para o sucesso dentro e fora dos campos.

“Minha vida foi toda pautada nesse sentido,” concluiu Zico, mostrando que sua paixão pelo futebol vai além do jogo, buscando sempre usar o esporte como uma força para o bem social.

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