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CONIB usa ‘soft power sionista’ para tentar criminalizar fala de Lula

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Especialistas e lideranças de organizações da sociedade civil interpretaram a reação da Confederação Israelita do Brasil (CONIB) à declaração do presidente Luís Inácio Lula da Silva, que denunciou o genocídio contra os palestinos, como parte de uma estratégia do governo israelense. No último domingo (11/05), a organização judaica classificou as falas do mandatário como suposto ato de apoio ao antissemitismo.

Segundo fontes ouvidas por Opera Mundi, o que está por trás da nota da entidade sionista é uma estratégia política coordenada nos planos nacional e internacional. O objetivo seria consolidar o que identificam como um verdadeiro plano de extermínio do povo palestino.

O soft power sionista

Para Arturo Hartmann, membro do Centro de Estudos Árabes e Islâmicos da Universidade Federal de Sergipe (UFS), o governo de Benjamin Netanyahu representa um projeto colonial e de extrema direita, com braços espalhados pelo mundo, como a CONIB. No entanto, ele avalia que a organização “obviamente não representa toda a comunidade judaica.”

“[O governo de Israel] tenta entrar em todas as esferas do poder público e do conhecimento para travar o debate e permitir que Israel construa um soft power [estratégia de influenciar ações de atores internacionais pela via cultural e do debate de ideias], construir um campo para fazer um washing [melhorar a imagem do governo israelense], enquanto você está exterminando uma população”, disse.

Hartmann também chama atenção para a tentativa de classificar qualquer crítica ao Estado de Israel como antissemitismo – o que tem ocorrido em diversos âmbitos, como nas universidades e em tramitação de projetos de lei no Congresso.

Em fevereiro, o deputado federal Eduardo Pazuello (PL-RJ) propôs um projeto de lei para adotar no Brasil a definição de antissemitismo da Aliança Internacional para a Memória do Holocausto (IHRA). Segundo especialistas, a proposta visa à criação de um ambiente de censura prévia a críticas ao governo de Israel.

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Além disso, o pesquisador enxerga uma tentativa de encobrir o contexto histórico do extermínio na Faixa de Gaza. “O conflito não começou em 7 de outubro. Essa crítica da CONIB tenta entregar implicitamente esse dado. Você tem um cerco desde 2007. Em 2012, a ONU já havia publicado um primeiro relatório que dizia que Gaza estava se tornando um lugar inabitável”, afirma.

Para Arturo, a narrativa adotada pela entidade também corrobora com o objetivo do governo de Netanyahu de realizar uma disputa no âmbito do direito internacional. A intenção seria livrar Israel da condenação de crimes de guerra e deixar o campo aberto para o avanço sobre o território palestino.

Lawfare de Israel

Moara Crivelente, doutora em Política Internacional e Resolução de Conflitos pela Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC), o lawfare de Israel é algo antigo e que tem origem em uma tradição dos Estados Unidos – os principais aliados de Netanyahu na guerra contra o povo palestino. “Israel faz isso há muito tempo. Ficou conhecido o termo lawfare que é o uso de direito para o soft power, para compor uma estratégia ofensiva”, disse a pesquisadora.

Um dos braços explícitos dessa estratégia seria o Lawfare Project. Trata-se de uma rede de advogados sionistas, presente em diversos países, cujo objetivo é processar pessoas refratárias ao genocídio em Gaza. Um dos alvos é, inclusive, professores universitários que criticam o Estado de Israel, segundo Crivelente.

Lula criticou Estado de Israel durante coletiva realizada em Moscou – Ricardo Stuckert / Presidência da República

Apesar disso, a especialista em resolução de conflitos acredita que continua sendo importante chamar a atenção da comunidade internacional para o cenário em Gaza. “Temos visto arrefecer o debate sobre o genocídio na Palestina, e declarações como a de Lula ajudam a retomar o assunto nos termos certos e não só nas retóricas vazias. Chamar de genocídio é importante”, defendeu.

Já para Rogério Dutra, integrante da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), essa narrativa israelense “chancela” uma postura de Estado que é “absolutamente contrária às regras do direito internacional”. “Nós temos um protocolo para a realização de conflitos (…) e o extermínio em massa está fora de ser validado pelo direito internacional”, afirmou.

Segundo o jurista, a fala de Lula vai além de um posicionamento público e iria de encontro com princípios basilares dos direitos humanos. “A crítica que Lula faz ao Estado de Israel é absolutamente coerente com o respeito aos direitos humanos. Nós temos um conjunto bastante significativo de provas de que Israel está cometendo um genocídio”.

Outras vozes judaicas

A posição da CONIB não tem sido uma unanimidade na comunidade judaica. Alex Delouya, do Vozes Judaicas por Libertação, também recebeu o conteúdo da entidade sionista com indignação.“A nota da CONIB está errada ao dizer que Lula adota uma postura antissemita. Lula não faz nenhuma afirmação que se refere aos judeus. Há uma única afirmação que ele faz sobre o fato verdadeiro de que Israel é um Estado genocida (…) não há algo direcionado aos judeus, e sim à postura do governo israelense na guerra”, disse.

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O ativista também acredita que a nota faz parte de uma estratégia adotada pelo governo israelense para justificar os seus crimes de guerra. “O expediente usado pela CONIB é bem conhecido. Utiliza o rótulo de antissemitismo de maneira falsa para sufocar as vozes palestinas e todas as vozes que denunciam o que Israel está fazendo”.

Alex disse ainda que a luta contra antissemitismo é prejudicada pelo o que ele entende como uma instrumentalização do conceito por parte de, apenas, alguns setores da comunidade judaica. “Israel não tem o monopólio da comunidade judaica, embora queira falar pelos judeus, não representa todos os judeus. Israel é um Estado e os judeus são uma comunidade diversa espalhada pelo mundo, com diferentes posições. A partir do momento que toda crítica a Israel vira antissemita, a gente perde força para combater de maneira séria o antissemitismo”, defendeu o representante da organização judaica.

As declarações de Lula

A fala de Lula também representa um papel de distribuição dos polos de poder no mundo, com mais protagonismo do Sul Global, segundo Amanda Harumy, doutora em Relações Internacionais pela Universidade de São Paulo (USP). Ela acredita ainda que a declaração se insere em um contexto de construção de um mundo multipolar que não se dará, necessariamente, de modo pacífico.

“Espaços precisam ser construídos, então a liderança de Lula, somado ao histórico da diplomacia brasileira, pacifista e humanista, é muito importante. Nesse sentido, é fundamental dizer o que se passa na Palestina, alertando o mundo sobre a necessidade do fim desse conflito”, afirmou.


Fonte: Opera Mundi

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