No Brasil, quando se fala em reflorestamento, a pergunta é sempre a mesma: quantos hectares foram plantados? Quantos milhões estão previstos no Plano ABC+? Mas e se estivéssemos fazendo a pergunta errada?
E se o verdadeiro motor da remoção de carbono não for apenas a quantidade de terra coberta por árvores, mas a capacidade dessas árvores de crescer mais rápido, acumular mais biomassa e sequestrar mais CO₂ por hectare?
Em outras palavras: não é só plantar mais — é plantar melhor.
A produtividade explica mais que a área
Um estudo recente do Departamento de Produção Sustentável do Ministério da Agricultura, com base em dados da Embrapa, IBGE, IBÁ e IMAFLORA, traz uma conclusão estratégica: a produtividade florestal é mais determinante para a mitigação climática do que a simples expansão da área plantada.
Cenários com menor área, mas maior produtividade, alcançam níveis semelhantes de remoção de carbono — com menor custo fundiário, menos pressão sobre o uso da terra e maior eficiência econômica e ambiental.
O custo de não fazer a conta certa
Hoje, o Brasil tem cerca de 10 milhões de hectares de florestas plantadas, principalmente de eucalipto. Embora essa área tenha crescido nas últimas décadas, a produtividade média nem sempre acompanhou esse ritmo.
Se o país continuar focando apenas em plantar mais, corre o risco de esgotar sua disponibilidade de terras antes mesmo de atingir as metas de sequestro de carbono. Por outro lado, investir em genética, manejo silvicultural e tecnologias de precisão pode multiplicar a produtividade sem expandir a área.
Um dado revelador: cada aumento de uma tonelada por hectare por ano na produtividade florestal pode remover mais de 1,3 milhão de toneladas de CO₂ a mais no total nacional, segundo simulações do estudo.
A silvicultura de alta performance já existe
Não é teoria. Já temos:
- Clones de eucalipto com produtividade acima de 70 m³/ha.ano em áreas otimizadas
- Modelos de gestão que definem o ponto ótimo de corte para maximizar a captura de carbono
- Softwares de simulação que projetam o crescimento individual de árvores com base em solo, clima e genética
O problema não é técnico. É político e regulatório.
Metas desatualizadas no Plano ABC+
As metas do Plano ABC+ ainda são baseadas na lógica tradicional de “meta de área”, ignorando os avanços reais do setor florestal. Isso envia um sinal errado: premia quem ocupa mais terra, não quem produz mais por hectare.
Com isso, desestimula-se a inovação e subutiliza-se o potencial climático das florestas plantadas.
Idade técnica de corte: um fator crítico negligenciado
Outro achado do estudo é que cortar a floresta antes do tempo ideal — prática comum no setor — pode reduzir até 28% da produtividade. Isso compromete não só a rentabilidade, mas também as estimativas oficiais de remoção de carbono.
A idade técnica de corte, entre 6 e 8 anos, deve ser integrada às metas climáticas. Um corte antecipado em apenas 8 meses pode reduzir a eficiência de captura de carbono em 11%.
Carbono como ativo financeiro
Com a implantação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE), os ativos florestais passam a ter valor de mercado além da matéria-prima. A madeira deixa de ser apenas celulose ou carvão e se torna:
- Material de construção sustentável
- Fonte de biocombustíveis
- Crédito de carbono negociável
Cada metro cúbico passa a ser uma moeda climática.
Mas para isso funcionar, é essencial ter sistemas robustos de MRV (Medição, Relato e Verificação). O estudo propõe dois novos indicadores como pilares do planejamento climático:
- Área × Produtividade
- tCO₂/ha.ano
Esses indicadores permitem uma gestão climática mais precisa, baseada em dados reais, não em projeções simplistas.
COP30: uma oportunidade para liderar com inovação
A COP30, em Belém (PA), em 2025, será um momento-chave. O mundo olhará para o Brasil esperando liderança climática.
E se o país apresentasse, já na COP30, uma revisão das metas florestais com foco em produtividade e idade técnica de corte? Isso posicionaria o Brasil na vanguarda da gestão climática baseada em evidência científica.
Além disso, é urgente diversificar as espécies e os usos da madeira. O cimento e o aço são grandes emissores de CO₂. A madeira, por outro lado, sequestra carbono.
Precisamos mudar a polaridade: impulsionar uma revolução sustentável pela demanda de produtos florestais na construção civil e na energia. Já.
Conclusão: ser mais do que metas de papel
O Brasil tem a ciência, a tecnologia e a capacidade produtiva para liderar essa transformação. Basta parar de contar só hectares e começar a medir o que realmente importa: quantas toneladas de carbono estamos removendo por hectare, e com que eficiência.
Afinal, salvar o clima não é só plantar árvores — é plantar inteligência.
Sobre o CCAS
O Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS) é uma organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, fundada em 2011, com o objetivo de promover o debate sobre a sustentabilidade da agricultura brasileira com base em evidência científica. Reúne especialistas de diversas áreas que defendem práticas agrícolas sustentáveis e inovadoras.
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